PCP

Novo regime de prestações familiares:

Expectativas criadas são «um logro»



Face ao anúncio do novo regime de prestações familiares, feito pelo Governo no passado dia 30 de Abril, a Comissão Política do PCP promoveu uma conferência de imprensa no dia 2 de Maio, onde tornou pública a sua posição sobre este «novo e desconhecido regime». Na declaração aos órgãos de comunicação social - a seguir transcrita -, Edgar Correia, membro da Comissão Política, denunciou os métodos do Governo «de sonegação de informações à opinião pública, a par da prevalência de propósitos puramente demagógicos».


«O Governo anunciou há dois dias, na sequência da reunião do Conselho de Ministros, o desenvolvimento de um novo regime de prestações familiares no âmbito da Segurança Social.

Um comentário definitivo por parte do PCP nesta matéria carece do conhecimento preciso da legislação agora aprovada e, em particular, dos montantes do novo subsídio familiar a crianças e jovens que entrarão em vigor no próximo dia 1 de Julho.

Como esse elementos não são ainda do domínio público as observações que adiante se sublinham deverão ser entendidas no contexto dos elementos muito insuficientes divulgados no comunicado do Conselho de Ministros e na nota do Ministério da Solidariedade e Segurança Social, e do conhecimento da 3ª versão do projecto de Decreto Lei visando a reformulação do regime jurídico das prestações familiares.


Uma orientação demagógica e populista

A primeira observação é, pois, dirigida ao facto do Governo ter anunciado com grande

aparato propagandístico «uma importante reforma no domínio da solidariedade social» sem ter simultaneamente fornecido importantes informações sobre as alterações introduzidas e sobre os montantes das prestações que passam a ser praticados a partir de 1 de Julho, assim inviabilizando um juízo rigoroso sobre o quadro dos efectivos benefícios ou prejuízos que terão os beneficiários deste ou daquele escalão.

O PCP discorda em absoluto destes métodos do Governo de sonegação de informações à opinião pública, a par da prevalência de propósitos puramente demagógicos. Denuncia o duvidoso carácter democrático e o populismo das declarações do primeiro ministro ao destacar que a política do Governo privilegiava «as crianças mais pequenas das famílias pobres», «os que não podem nem reivindicar, nem organizar manifestações». E reclama a urgente divulgação pública do conjunto da legislação ora aprovada e dos montantes das prestações não divulgados.


Expectativas logradas

Apesar da adjectivação muito positiva com que os comunicados do Conselho de Ministros e do Ministério da Solidariedade e Segurança Social se referem à nova prestação social - o subsídio familiar a crianças e jovens - importa salientar que ele representa a substituição das prestações de abono de família, subsídio de aleitação e de nascimento e que é acompanhada pela eliminação do subsídio de casamento.

Várias informações concorrem para enraizar a convicção do profundo logro que representam as expectativas criadas em torno da nova prestação social, uma vez que ela resulta tão só da fusão e praticamente da soma aritmética das dotações actualmente atribuídas às prestações do abono de família, nascimento, aleitação e abono complementar às crianças deficientes.

Além disso há aspectos em que a nova prestação social significa perda de direitos e um efectivo retrocesso em relação ao regime actualmente vigente.

Estão neste caso, em particular, a exigência do cumprimento de prazos de garantia ou de vinculação profissional e a introdução de princípios de selectividade característicos dos regimes não contributivos.

Observe-se que na legislação que vigorou até agora (decreto-lei nº 170/80 de 29 de Maio) a atribuição de prestações familiares é independente da verificação de prazos de garantia ou de períodos mínimos de prestação de trabalho, o que inteiramente se coaduna com o facto das prestações familiares, nomeadamente do abono de família, ser considerado basicamente uma prestação de infância e juventude de que são titulares nomeadamente os descendentes de toda a população trabalhadora e que por isso não está dependente das vicissitudes da relação de trabalho dos progenitores.

A instituição de prazos de garantia ou de vinculação profissional que terá sido operada agora no novo regime legal, significa o regresso a um princípio de não universalidade da protecção social, o que naturalmente tem um significado negativo.

Quanto à introdução de regras de selectividade, cuja análise concreta só pode ser feita desde que conhecidos os montantes das prestações atribuídas a cada um dos escalões de

rendimentos, é uma medida que só pode ser avaliada a partir de elementos concretos.

Observe-se que o PCP, desde que rigorosamente respeitados os direitos adquiridos ou em formação por parte dos contribuintes da Segurança Social e assegurado um patamar de natureza universal, não discorda da orientação do subsídio familiar às crianças e jovens poder ser tanto maior quanto menores forem os rendimentos das famílias.

O que é preocupante - e há muitos indícios nesse sentido - é que o Governo pretende fazer uma aplicação perversa dessa orientação. E que a pretexto de beneficiar as famílias com menores rendimentos, o que é aceitável, pretende retirar direitos a quem os adquiriu ou vem formando com base nos descontos que fez para a Segurança Social, situação que é de todo em todo inaceitável.

Além disso a maneira como o Governo pretende aplicar a ideia de diferenciação é geradora da maior perplexidade. Observe-se que se incluem no 1º escalão apenas os agregados familiares com rendimentos mensais inferiores a 85 contos o que significa que abrange exclusivamente camadas completamente desmunidas. E que o 2º escalão de rendimentos, abrangente daquilo que para o Ministério da Solidariedade constituiria a chamada «classe média» portuguesa (Diário Económico de 19/12/96), envolve o conjunto das famílias cujos rendimentos mensais se situam entre valores tão distintos como os 85 contos e os 454 contos. Para esta estranha «classe média» em que uma família pode ter, por exemplo, um rendimento de apenas dois salários mínimos por mês, seria escandaloso que se confirmassem as notícias saídas na comunicação social de que o novo Subsídio Social de Família não ultrapassaria os 2.800 escudos por filho com mais de um ano e por mês - exactamente o valor do actual abono de família.

Acresce que o estabelecimento de escalões com base nos rendimentos familiares relança a questão da determinação rigorosa desses rendimentos, o que verdadeiramente só é possível em relação aos trabalhadores por conta de outrem e com base no IRS. A metodologia aprovada pelo Governo da declaração de rendimentos ser feita sob compromisso de honra pelas próprias famílias, é susceptível de introduzir as maiores desigualdades e injustiças num sistema que simultaneamente é apresentado como sendo mais justo.


Melhores prestações

O PCP tem repetidamente sublinhado entre os problemas maiores do sistema de Segurança Social o muito baixo nível das respectivas prestações. Sendo isso particularmente sensível no que respeita às prestações sociais familiares - de que depende a possibilidade de muitas famílias verem elevadas as suas condições de vida e melhorados aspectos essenciais da vida de muitas crianças - o PCP considera indispensável proceder à elevação significativa dos montantes que o sistema disponibiliza para a sua concretização.»