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Os reféns


O interessantíssimo artigo que o economista François Chesnais publicou no número de Abril do Le Monde Diplomatique sobre os fundos de pensões por capitalização constitui um material de referência indispensável para quantos acompanham com preocupada atenção os planos privatizadores da Segurança Social.

Sugestivamente intitulado "amanhã, os reformados à mercê dos mercados - os assalariados reféns do capital financeiro", esse trabalho aprofunda a análise do mecanismo através do qual actuam os fundos de pensões por capitalização e os riscos que correm os trabalhadores que para eles descontam e os reformados que deles dependem.

"Quando há capitalização da poupança individual entregue pelos assalariados numa caixa de reforma de empresa ou de ramo de indústria (um fundo de pensões), o montante da reforma não depende das últimas folhas de salários; também não está indexado aos salários ou aos preços; ele é função, por um lado, do que o assalariado tenha podido acumular pessoalmente (...) e por outro lado do "sucesso" com que tenha sido feito "frutificar" a sua poupança". (...) "Com os fundos de pensões por capitalização existe uma ligação directa, material, entre o nível dos seus reformados e os rendimentos das obrigações e das acções ". (...) "Nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha, o capital financeiro conseguiu fazer de maneira a que os antigos assalariados dependam, para o nível das suas reformas, da ferocidade com a qual sejam explorados os seus camaradas em actividade".

Outro tópico de referência obrigatória diz respeito aos efeitos devastadores de uma queda brusca das cotações bolsistas. "Um crash mesmo pouco importante terá por efeito privar, em alguns dias, milhões - ver dezenas de milhões - de reformados do essencial, senão da totalidade dos seus rendimentos de velhice (segundo os exactos termos do sistema privado de pensões ao qual eles pertencem) e de os lançar na pobreza; as repercussões sobre o consumo privado e portanto sobre a produção e o emprego, serão imediatas; um tal crash terá efeitos não reversíveis durante a vida de um grande número de membros da classe média; a dez ou a quinze anos da sua cessação de actividade (a supor que eles conservem o seu emprego), os subscritores dos fundos não estarão mais em condições de reconstituir uma poupança suficiente para assegurar as suas reformas".

Não é a altura de começar a confrontar os papagaios, que por aí pululam, das seguradoras e das empresas gestoras dos fundos de pensões, com o conhecimento rigoroso de problemas que têm implicações tão profundas em relação ao futuro de toda a sociedade?

Edgar Correia