PCP

Encontro de Lisboa denuncia


Saúde pública é «parente pobre»



No Encontro Distrital promovido pela DORL do PCP, no sábado passado, no Espaço Vitória, com a participação de Edgar Correia, da Comissão Política, utentes e profissionais da saúde, uns militantes outros convidados, discutiram a situação da Saúde no nosso País.

«Não há dinheiro para a saúde» porque Portugal é o país da CE que menos gasta com a Saúde e os portugueses - «euróticos» à força - são, na opinião de um orador, vítimas dos critérios de convergência, sendo que o Governo se está completamente «borrifando» para a função social do Estado.

«A saúde pública é a parente pobre» ou «a saúde é hoje um negócio» (o terceiro a nível mundial, logo a seguir ao da droga), foram outros desabafos ouvidos, traduzindo a necessidade de procura urgente de soluções e da «criação pelo PCP de uma estrutura de composição ágil, ligada ao sector».


Edgar Correia sobre o SNS:
«O que conta é a opinião dos utentes»


Na intervenção que proferiu (de que se trancrevem extractos), Edgar Correia referiu a «aproximação ao concreto dos problemas» que o Encontro havia permitido e afirmou que alguns desses problemas residiam no facto de o País estar a ser governado por um Partido que, tendo-se comprometido a alterar a política do Governo anterior, acabou por lhe dar continuidade. Razão por que os mais graves problemas não só não foram resolvidos como, em muitos casos, se agravaram.

(...) Na avaliação da situação na área da saúde, para além dos propósitos políticos e das declarações mais ou menos bem intencionadas, o que conta e vale é a opinião dos utentes do Serviço Nacional de Saúde, o grau de maior ou menor insatisfação em relação à resposta que os serviços proporcionam para os problemas e para as necessidades com que cada um os demanda.

Aproximando-se o Governo de metade do seu mandato e quando já seria legítimo observar alterações positivas na área da saúde, quer na linha dos compromissos e promessas eleitorais, quer dos objectivos fixados para a acção do executivo neste sector, a situação que se observa no terreno desmente progressos. E o balanço global surge claramente como decepcionante.

É certo que a equipa dirigente do Ministério da Saúde tem sido pródiga na apresentação de orientações gerais e perspectivas com as quais não é difícil estar de acordo, tais como o papel fundamental e a necessidade de regeneração do Serviço Nacional de Saúde, a estratégia de saúde regional (ARS de Lisboa e Vale do Tejo) e a estratégia nacional de saúde para 1997, a renovação de metodologias e a inovação ao nível dos instrumentos de gestão (funções apoio e agência). E que fez intervir em várias situações a Inspecção Geral de Saúde, com divulgação pública dos principais apuramentos - o que é naturalmente positivo.

Esta actuação sem dúvida que gerou expectativas positivas na opinião pública e entre profissionais do sector.

Mas essas expectativas têm vindo a ser crescentemente contraditadas pelas principais orientações e decisões adoptadas na prática.

(...)
O Ministério da Saúde tem claudicado inteiramente perante os principais interesses que repartem entre si o grosso dos meios financeiros disponibilizados para o sector por parte do Estado.

É o caso da política do medicamento em que ressalta as vultuosíssimas concessões feitas pelo Governo aos interesses que dominam o sector, de que é exemplo o ruinoso acordo celebrado com a APIFARMA, onde prevalecem os interesses das multinacionais farmacêuticas. Acompanhado pelo abandono de políticas que permitiriam efectivamente racionalizar os gastos neste sector, nomeadamente o fomento dos genéricos, a elaboração de um formulário nacional para o ambulatório e o desenvolvimento de funções farmácia nas unidades do SNS.

São os acordos mantidos com o sector da medicina convencionada, salvaguardando os ilegítimos privilégios privados construídos à sombra da sub-utilização dos recursos e das potencialidades do Serviço Nacional de Saúde.

É a política das restrições financeiras e funcionais em relação às unidades do Serviço Nacional de Saúde - nomeadamente dos cuidados de saúde primários - em flagrante contraste com as concessões feitas aos sectores privados que repartem entre si o fundamental dos recursos do sector.

É a política de nomeações, em que depois de uma primeira fase em que terão prevalecido critérios de competência técnica e profissional, se vem assistindo a um crescente avolumar de pressões por parte do aparelho do PS e à nomeação de boys para pontos sensíveis.

É a linha de desresponsabilização do Estado na área da saúde que vai emergindo novamente na política do Ministério: planos com vista à alteração do estatuto jurídico dos hospitais, de modo a possibilitar o estabelecimento de formas de propriedade mista dos hospitais públicos (Estado - privados ou Estado - misericórdias e outras instituições sociais); transferência de responsabilidades para misericórdias; retorno a concepções de um SNS mínimo e assistencialista.

(...)
A par do deslizamento das posições do Ministério da Saúde para uma linha cada vez mais extensa de compromissos com os grandes interesses instalados no sector - multinacionais dos medicamentos e dos equipamentos, construtores de infraestruturas, sector convencionado crescentemente dominado por monopólios na hemodiálise e nas análises clínicas - é detectável o recrudescimento da pressão dos sectores neo-liberais, com vista à recuperação de influência e de capacidade de decisão política ao nível das principais orientações da saúde no nosso país. O sentido das principais propostas apresentadas no documento do CRES, nomeadamente em relação ao financiamento, corresponde sem dúvida ao regresso em força das teses neo-liberais à política de saúde.

É no quadro desta avaliação global que o PCP considera indispensável exprimir a sua opinião e que a política que está a ser globalmente levada a cabo pelo Governo na área da saúde é insusceptível de dar boa resposta aos problemas existentes, nomeadamente no que respeita aos obstáculos de natureza económica e social, aos inadmissíveis problemas do acesso aos prestação de cuidados de saúde prestados no SNS, e à sua qualidade.

A não ser rápida e drasticamente corrigida a política do Ministério da Saúde, no sentido da prevalência dos interesses da saúde pública e da reforma democrática do SNS, as iniciativas mais inovadoras ver-se-ão crescentemente isoladas e com esta ou com outra equipa ministerial o sector neo-liberal retomará o comando das operações.

O PCP sustenta a necessidade de adopção de uma nova política, de uma política de esquerda na área da saúde. E sublinha a imperativa necessidade, através de uma mais dinâmica intervenção na esfera social e política, de dar mais activo combate à situação existente e de elevar o movimento reivindicativo em torno de objectivos concretos em correspondência com os interesses dos portugueses num sector de importância tão vital. (...)