EM FOCO


EDP
Carlos Carvalhas contesta a privatização
e alerta para uma previsível manobra eleitoralista


A EDP já devia ter baixado as tarifas


A alienação ao capital privado é uma opção política que, proporcionando elevados lucros aos especuladores bolsistas, prejudica seriamente os interesses dos consumidores,
dos trabalhadores e do País.


A privatização da EDP está colocada no centro das atenções da opinião pública. Sob as orientações do Governo, a administração decidiu gastar cerca de um milhão de contos numa grande campanha publicitária. Os lucros garantidos aos compradores, num negócio à conta do erário público, também são de molde a que a operação dê que falar. Mas, por trás de toda a poeira levantada, falta uma consistente discussão sobre o futuro do sector eléctrico e sobre as consequências desta eufórica alienação de acções.

Os comunistas têm estado entre os mais fortes defensores de uma EDP pública, moderna e em condições de contribuir decisivamente para o desenvolvimento do País e o bem-estar das populações. Ao intervir, sexta-feira passada, no encerramento do encontro nacional de quadros do PCP na EDP, Carlos Carvalhas recordou o valioso serviço que a empresa pública (cindida, desmembrada e transformada em sociedade anónima pelos governos e as administrações do PSD) prestou ao País durante os seus vinte anos; em contrapartida, apontou a experiência da privatização da empresa congénere na Grã-Bretanha, durante a governação conservadora de Margaret Thatcher, que teve por resultados o aumento das tarifas, a degradação da qualidade do serviço e o despedimento de trabalhadores.

No caso português, o secretário-geral do PCP afirmou que «estamos perante uma privatização de uma empresa básica e estratégica, a baixo preço, escancarando-se as portas às multinacionais e ao desemprego». «Uma empresa estratégica e ainda por cima com tal valor de venda, irá ter naturalmente uma grande procura a que o Governo chamará de "um grande êxito"! Mas o que temos pela frente não é um êxito, mas sim uma política criminosa. Uma política levada a efeito por um governo socialista que vai entregar uma empresa estratégica ao grande capital e às multinacionais, gerida pelo máximo lucro, retirando a sua função de interesse público e social» - acusou Carlos Carvalhas.

Notando que, «com a privatização, já se anuncia milhares de desempregos», o dirigente comunista considerou que este caso «é um escândalo e uma vergonha para o Partido Socialista».


O imposto da moeda única

Contestando, com as experiências conhecidas, que a privatização da EDP implique uma diminuição dos preços, Carlos Carvalhas sublinhou que «a EDP não precisa de ser privatizada para que as tarifas baixem».

Mais «as tarifas deviam ter baixado, ao longo destes último anos, para valores que compatibilizassem o desenvolvimento económico da empresa (investimentos, amortizações, etc.), com a qualidade e o preço de um bem essencial, exigidos para um serviço público».

Só que, em vez disso, «a política de direita de Cavaco Silva, prosseguida por António Guterres, transformou o pagamento da energia eléctrica num novo imposto pago por todos os portugueses, para alcançar o seu "desígnio nacional" de entrar na moeda única!»

Para o secretário-geral do PCP, «os lucros de muitas dezenas de milhões de contos que a EDP vem obtendo (190 milhões de contos nos últimos três anos) mostram que a baixa das tarifas não só é possível e economicamente compatível com o desenvolvimento da empresa, como é uma exigência nacional».


A proposta comunista

«Em vez de dirigir, como parece ser o novo objectivo dos gestores da EDP, os resultados da EDP para a especulação financeira (dos 133 milhões de contos de investimento previstos para este ano, 35 milhões destinam-se a aplicações financeiras), ou aumentar esses resultados à custa da destruição de mais uns milhares de postos de trabalho (depois dos 8 mil eliminados nos últimos anos), nós defendemos que, na base de uma EDP, empresa pública, se podia verificar no imediato a baixa das tarifas de alta e baixa tensão, permitindo assim aliviar as despesas das famílias portuguesas e reduzir os custos de produção para milhares de pequenas e médias empresas» - disse Carlos Carvalhas.

O dirigente comunista adiantou alguns cálculos, «a título de exemplo», que «uma baixa de 20% nas tarifas de alta e baixa tensão, levaria o kW/hora, actualmente a 18$38, para cerca de 15$00, continuando a empresa a manter uma elevada capacidade de autofinanciamento (193%), a pagar ao Estado 33 milhões de contos de IRC... e a continuar a dar um lucro líquido de cerca de 36 milhões de contos».

A António Guterres endereçou Carlos Carvalhas dois recados:

- «não venha, depois da privatização, diminuir as tarifas, para atribuir tal medida à privatização, lá para Outubro ou Novembro, em vésperas de eleições autárquicas, gastando mais uns milhares de contos em propaganda, anunciando que tal é o magnífico resultado da privatização...»

- «convidamos o Governo a decidir a baixa já, a vigorar para o segundo semestre de 1997, poupando assim ao País gastos em publicidade, e aliviando, ainda que ligeiramente, a factura energética dos portugueses.»



Sindicatos da CGTP oferecem «acções»


A Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores das Indústrias Eléctricas de Portugal lançou terça-feira uma campanha nacional, dirigida aos consumidores de energia eléctrica, alertando para as consequências que advirão da privatização da EDP.


Esta campanha assentará na distribuição de um folheto que começa por convidar o leitor a imaginar-se detentor de uma acção da empresa...

Perante os jornalistas convidados para junto das instalações da empresa no Marquês de Pombal, em Lisboa, o coordenador da FSTIEP reconheceu que as estruturas sindicais não dispõem de meios para contrariar a campanha publicitária da empresa, cujos custos são calculados em um milhão de contos. Mas tal desproporção não fez com que os sindicalistas desistissem de marcar a sua posição. «É um bom negócio para quem quer ganhar dinheiro, mas gostaríamos que as pessoas reflectissem sobre o modo como está a ser feita a privatização da EDP» - disse José Machado.

A intervenção da FSTIEP e dos sindicatos, cujas posições são compartilhadas pela Comissão de Trabalhadores, tem ainda outra vertente, dirigida aos trabalhadores e à sua mobilização para defesa dos postos de trabalho e dos direitos ameaçados. Para hoje, está marcada uma «acção nacional» que, segundo o coordenador da federação, implicará a realização de uma centena de plenários de trabalhadores para aprovação de uma carta-aberta ao primeiro-ministro.

Solicitado a comentar a posição de um sindicato que anunciou estar disposto a comprar um lote de acções da EDP para poder intervir na administração, José Machado considerou que «estão a criar a ilusão de que vão ter poder, mas quem vai realmente ter poder são os grandes grupos económicos».


É nossa!

O folheto-acção oferecido à população e aos consumidores - reproduzido em papel amarelo impresso a azul - começa por lançar um alerta, reportando ao próprio lema da campanha oficial: «Vão privatizar a nossa energia!»

A FSTIEP/CGTP refere depois «o enorme valor» da EDP, que, «como empresa pública e única, trabalhou para garantir o fornecimento de energia eléctrica a todos os cidadãos, empresas e instituições, em condições de igualdade e com bons padrões de qualidade de serviço».

Na «acção» que vai continuar a ser distribuída aos consumidores até ao dia da privatização, refere-se ainda que nos últimos 3 anos, os lucros líquidos da EDP somaram 190 milhões de contos e que a empresa pagou ao Estado 115 milhões de contos de IRC. Além disso, os seus índices de produtividade são muito superiores à média nacional e têm subido constantemente.

Para a federação, cujos sindicatos representam a maioria dos trabalhadores das empresas do Grupo EDP, «não faz qualquer sentido argumentar que a privatização vai proporcionar um encaixe de 350 milhões de contos para os cofres públicos». «Na mira da diminuição do défice exigida pela corrida cega para a moeda única, o Governo age como o conhecido ganancioso que, sem visão de futuro, matou a galinha dos ovos de ouro», comenta-se no documento.

Perante o valor da empresa, «compreende-se que haja interesses privados a cobiçar a EDP», mas «não se justifica a opção política do Governo, que também aqui não se distingue do Governo anterior».


E quando for deles?

Prevendo o que será a EDP privatizada, a partir das experiências conhecidas, a federação afirma que os postos de trabalho serão reduzidos, os direitos dos trabalhadores serão atacados, e a qualidade de serviço vai degradar-se. No folheto é denunciado o facto de estarem já em desenvolvimento medidas para proceder à redução dos centros de distribuição e postos de atendimento aos consumidores, particularmente nas zonas do interior, mais afastadas dos pólos de desenvolvimento, o que leva a FSTIEP a prevenir: «Uma EDP privatizada deixará de prestar um serviço público de qualidade, ficará mais afastada das populações e eliminará milhares de postos de trabalho».


Declarações
de... guerra

 

Acabar os fundos de pensão
e complementos de reforma

«"O social é a sanidade da empresa", defendeu o Secretário de Estado, que considerou como "inevitável" o fim dos fundos de pensão e complementos de reforma como direitos adquiridos.

"Vão começar a coexistir dentro das empresas pessoas com diferentes estatutos: aqueles que, quando entraram, ainda estavam abrangidos por esses direitos adquiridos, e os mais novos, que terão de assegurar os seus complementos de reforma de outro modo", frisou José Penedos.

O governante considera que "este processo é inevitável. A privatização é um bom momento para realizar estas mudanças".

"As empresas ou os empregados isoladamente vão ter que procurar novas formas de substituir algumas vantagens sociais, nomeadamente negociando com empresas seguradoras", afirmou José Penedos, declarando que "já existem empresas a fazê-lo.»

(José Penedos, secretário de Estado da Indústria e Energia, no «Diário de Coimbra», 21 de Abril)


Racionalizar, dispensar... despedir

«O trabalho que tem de ser feito mais tarde - não se pode sobrepor a privatização com um trabalho de re-reestruturação, porque poderia ter efeitos perversos - é mais penoso que o primeiro.» (...)

«É necessário concentrar contabilidades, áreas financeiras, de comunicação e racionalizar alguma cobertura geográfica.» (...)

«Haverá uma racionalização dos efectivos. Se não for feita agora, de forma consistente, dialogada, acabará por ser feita mais tarde, por alguém, num processo que certamente não será controlado.» (...)

«Quantos trabalhadores vão dispensar?

Prefiro não quantificar, para não criar convulsões desnecessárias.»

(António de Almeida, Presidente do Conselho de Administração da EDP, em entrevista ao «Diário Económico» de 11 de Abril)


Os vampiros...

«Quatro dos maiores grupos financeiros portugueses, todos privados, decidiram unir esforços e avançar com uma estratégia concertada que lhes permita assegurar o controlo da EDP e da Portugal Telecom (PT) com a sua passagem para fora do sector público. O plano conta com a participação dos grupos BCP, BPI, Espírito Santo e Mello e começou a ser desenhado em finais do ano passado, altura em que os responsáveis destes grupos se reuniram para encontrarem a melhor forma de alcançar este objectivo comum».

(«Semanário Económico», 24 de Abril)