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Jornadas Parlamentares do PCP

Revisão assim, não!


"Qualquer tentativa de impor a aprovação até 31 de Julho
só pode ser feita com votações a mata-cavalos,
sem debate ponderado,
e com sacríficio dos direitos de intervenção dos deputados"



Não é possível concluir o processo de revisão constitucional até 31 de Julho num contexto de trabalho sério que reúna o mínimo de condições para debate das propostas, concluíram os deputados comunistas nas suas Jornadas Parlamentares, realizadas no final da semana transacta, no Porto. Os parlamentares do PCP, que reiteraram a sua oposição ao conteúdo do acordo PS/PSD sobre a revisão constitucional e à forma como ele foi consumado, com marginalização da Assembleia da República, vão mesmo mais longe e entendem que "qualquer tentativa de impor a aprovação até 31 de Julho só pode ser feita com votações a mata cavalos, sem debate ponderado, e com sacrifício dos direitos de intervenção dos deputados".

Esta uma das principais conclusões saídas das Jornadas Parlamentares do PCP no ponto da sua ordem de trabalhos dedicado à agenda do calendário parlamentar até final da sessão legislativa. No centro do debate estiveram ainda a regionalização, bem como algumas iniciativas legislativas da autoria dos parlamentares comunistas, em relação às quais, pela sua importância, atribuem um carácter prioritário.

Na apresentação das conclusões das Jornadas, em conferência de imprensa, o líder parlamentar do PCP, Octávio Teixeira, aludindo ao processo de revisão constitucional e à forma como ele tem decorrido na Comissão, voltou a enfatizar o "carácter prejudicial do acordo" celebrado entre o PS e o PSD, criticando o facto de estes partidos manterem a intenção de "limitar o direito à greve, sacrificar o sector público da economia e de enfraquecer as responsabilidades do Estado na concretização dos direitos sociais, económicos e culturais".

Octávio Teixeira não deixou de fazer notar, porém, que têm surgido na CERC "sinais das dificuldades para o PS e PSD resultantes da oposição ao acordo firmado", exemplificando a este respeito com o facto de a apreciação das alterações ao regime de extradição estarem suspensas.

Depois de lembrar que a revisão constitucional vai entrar no capítulo do poder político - "onde o acordo PS/PSD é particularmante negativo", frisou -, o presidente da formação comunista chamou a atenção para a natureza "surrealista" do calendário que o PS quer impor, pondo em relevo a circunstância de ainda estarem praticamente dois terços das alterações à Constituição por apreciar na CERC.

Analisado no decorrer das Jornadas foi igualmente o comportamento do Governo em relação à Assembleia, nomeadamente o significado a reter da apresentação em Abril de um pacote de 32 propostas de lei e, mais recentemente, de um novo pacote de 21 propostas. Comentando este frenesim demagógico, revelador de uma "tentação governamentalizadora da Assembleia que lembra a dos Governos PSD", Octávio Teixeira interpretou-o ainda como uma tentativa do Governo para «mostrar serviço», escondendo simultaneamente que "não está a resolver os problemas fundamentais do País".

Alvo de apreciação por parte dos deputados comunistas foi ainda a questão das finanças locais, sobretudo à luz de algumas imprecisões fomentadas pela propaganda governamental quanto à posição do PCP nesta matéria. Clarificando a posição da sua bancada, Octávio Teixeira assinalou que as votações na generalidade "destinam-se somente a viabilizar o necessário debate aprofundado na especialidade", pelo que, esclareceu, não existe "nenhum vínculo" relativamente às soluções concretas avançadas quer pelas outras forças políticas quer pelo Governo.

No concreto, porém, face ao que se conhece das propostas governamentais no plano das finanças locais e de transferência de competências, o líder parlamentar entendeu deixar desde já clara a firme e frontal oposição da sua bancada a tais soluções, as quais, precisou, "se fossem lei, seriam estranguladoras da capacidade financeira dos municípios e os esmagariam com encargos, tudo em prejuízo das populações".

Quanto à proposta de lei de alterações ao Código Penal - outro dos temas abordados durante as Jornadas - foram igualmente esclarecidas na conferência de imprensa as razões que presidiram ao voto contra do Grupo comunista. A principal, foi dito, prende-se com a proposta de criação do crime de «corte de estrada», o que é entendido pelo PCP como uma medida destinada a "combater uma das formas de indignação que as políticas governamentais vêm suscitando", isto é, o Executivo mais não visa do que "contrariar e punir a luta social que as suas medidas provocam".

"Seria como, no caso da pesca, o Governo mandar prender os armadores por três anos, por bloquearem portos, em vez de se sentar à mesa a negociar com eles", exemplificou Octávio Teixeira.

A atenção dos parlamentares comunistas, noutro plano, não escapou também a Conferência Inter-Governamental (CIG) e o debate parlamentar de hoje sobre esta matéria. Reafirmada a este propósito foi a ideia de que a questão central que continua a estar na ordem do dia é a da "construção de uma Europa onde o desenvolvimento e o emprego com direitos estejam no centro das decisões políticas".

Nesse sentido, para Octávio Teixeira, "não bastam operações de cosmética ou frases piedosas em torno da dimensão social da Europa". Mais, advertiu, a "solução da questão do desemprego e a construção de uma Europa com dimensão social exige pôr em causa a própria arquitectura, a política monetarista de Maastricht e o caminho para a moeda única, o que é recusado pelo PS e por toda a direita portuguesa".


"Damos ao PS 30 dias"

A criação das regiões administrativas assume, no caso do Porto - que ocupa o último lugar do País em matéria de saneamento básico -, uma extraordinária importância não apenas enquanto instrumento corrector dos actuais desequilíbrios mas também como factor capaz de garantir o desenvolvimento regional. A esta conclusão chegaram os deputados comunistas após cumprirem um programa de contactos e reuniões com entidades da região no decorrer dos quais foi consensualmente reconhecida a necessidade de concretizar a regionalização administrativa.

Nos encontros com a Comissão de Coordenação da Região Norte (CCRN), Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas do Norte, União dos Sindicatos do Porto e Assembleia Metropolitana do Porto os parlamentares do PCP puderam igualmente constatar ser comum a preocupação quanto aos atrasos do processo e quanto a uma eventual inviabilização da criação das regiões administrativas.

Foram estes atrasos, note-se, que levaram o Secretário-Geral do PCP, Carlos Carvalhas, na sua intervenção, a lançar o repto ao PS para que este responda até 4 de Julho se quer ou não avançar com o processo de regionalização.

"Se o PS quiser demonstrar que efectivamente não quer pôr a regionalização na gaveta - declarou o dirigente comunista -, então daqui o desafiamos a debater e a deixar aprovar, na Assembleia da República, como prioridade, o mapa das regiões administrativas, isto é, que regiões em concreto devem devem ser criadas e qual deverá ser a área de cada uma delas".

Traço igualmente significativo a reter das visitas efectuadas pelos deputados comunistas foi, por outro lado, a constatação por si efectuada sobre a "manutenção e agravamento da situação do desemprego", a par da "precaridade e degradação das relações laborais". A testemunhar esta realidade, como assinalou Octávio Teixeira na conferência de imprensa para apresentação das conclusões das Jornadas, está a elevada taxa oficial de desemprego no Grande Porto (11,4 por cento), bem como o clima de crescente descontentamento e protesto social, de que é exemplo o processo de luta pelas 40 horas de trabalho semanal sem diminuição de retribuição.


Proibir despedimentos ilícitos

A proibição de despedimentos colectivos ilícitos, atribuindo ao Ministério da Qualificação Profissional e Emprego competências para actuar neste plano, constitui uma das medidas preconizadas em projecto de lei da autoria dos deputados comunistas entregue esta semana no Parlamento. Anunciada publicamente nas suas Jornadas Parlamentares, esta iniciativa parlamentar do PCP vem assim alterar o regime do despedimento colectivo em termos que visam impedir que no futuro se repitam situações como a dos trabalhadores da Grundig, alvo de um processo que lhes roubou o posto de trabalho, sem fundamento, com gravíssimas consequências sociais.

Um outro projecto de lei, este relativo às uniões de facto, foi igualmente entregue na Mesa da Assembleia da República. Trata-se de um diploma que, na sequência de dois outros também da iniciativa do PCP, tendo em atenção a situação das famílias em união de facto, visa aprofundar o respeito pela livre opção dos que optaram por "constituir família sem a sujeição às normas que regulam a família baseada no casamento", dando cumprimento aos preceitos constitucionais que protegem as famílias.

No quadro das iniciativas parlamentares a desenvolver até final da sessão legislativa foi ainda decido que a interpelação ao Governo, já agendada para o dia 10 de Julho, será centrada na "política geral do Governo PS".