Revisão Constitucional
Má na forma e no conteúdo


O PCP promoveu na manhã de terça-feira, na Rua Soeiro Pereira Gomes, uma conferência de imprensa com a participação do seu Secretário-geral, Carlos Carvalhas, de Luís Sá, membro da Comissão Política, apresentados por Rui Fernandes. Carlos Carvalhas leu uma declaração, com a posição do PCP sobre o processo de revisão constitucional - que nesse dia subiu a plenário -, e o acordo PS/PSD.

Depois de colocar os membros da mesa à disposição dos jornalistas para responder a questões que eventualmente suscitassem dúvidas, Carlos Carvalhas considerou particularmente revelador o facto de o PS aproveitar o período de férias e a ausência dos trabalhadores para, a «mata-cavalos», discutir o processo de revisão constitucional. «O que o PS e o PSD pretendem, de facto, é fazer passar a revisão sem grandes sobressaltos».

Luís Sá considerou as propostas do PS e do PSD, para alteração das Câmaras Municipais, «aberrantes» e violadoras da vontade popular. A serem aprovadas, disse, isso significa que um presidente de Câmara que apresente uma proposta de Câmara integralmente do seu partido pode ver aprovada essa composição com os votos de apenas um terço dos mandatos.Uma forma de pôr fim às Câmaras plurais e de impedir a fiscalização e a intervenção construtiva e enriquecedora das minorias, concluiu.

Entretanto, instado a revelar o sentido de voto dos comunistas, Carlos Carvalhas respondeu que, se o PCP considera esta revisão má «na forma e no seu conteúdo global», o voto dos seus deputados iria ser naturalmente negativo.

 

Uma declaração e um apelo

Transcrevemos a seguir o texto da declaração lida pelo Secretário-geral do PCP.

«A revisão constitucional que hoje sobe a Plenário é má na forma e má no seu conteúdo global.

Testemunha o profundo entendimento do PS com o PSD e o deslizar constante do PS para a direita, satisfazendo as suas reivindicações imediatas fundamentais no plano da Constituição.

Mostrando uma praticamente total surdez em relação às críticas e protestos dos mais diferentes sectores, o PS e o PSD querem avançar a "mata-cavalos" o acordo que estabeleceram à margem da Assembleia da República e da Comissão Eventual de Revisão Constitucional.

Em vez de um debate sereno, rigoroso e aprofundado, o PS e o PSD, com o PP, optaram por um ritmo de trabalho acelerado, sem disponibilidade para o devido debate e ponderação das soluções.

Este facto é tanto mais grave quanto estamos perante a maior revisão constitucional de sempre em extensão. Está prevista, com efeito, a revisão de mais de metade dos artigos da Constituição. Mas não é só na extensão.

O que o PSD e o PS querem é com a revisão constitucional poderem vir com novas leis eleitorais fabricar maiorias com menos votos.

A revisão constitucional é de facto marcada pela adulteração das regras da democraticidade da eleição do Presidente da República, da Assembleia da República e das Câmaras Municipais, remetendo aspectos fundamentais para entendimentos futuros do PS e PSD a expressar em Lei ordinária; enfraquece direitos dos trabalhadores (como o direito à greve); elimina a obrigatoriedade do sector público da economia; consagra algumas soluções desequilibradas e inaceitáveis em relação às Regiões Autónomas.

A revisão inviabiliza o referendo sobre a moeda única e de Tratados (apenas admite referendos sobre questões seleccionadas pelo poder político e que para este sejam convenientes); dificulta e pode mesmo impossibilitar, a regionalização, que em relação ao processo fica nas mãos do PSD.

Por outro lado, a revisão elimina marcas democráticas e do 25 de Abril (como a referência a "povo" num dos artigos; aos trabalhadores em diversos artigos; à apropriação colectiva de meios de produção e solos). O PCP alerta, por outro lado, para o facto de se ter verificado a recusa da consagração expressa do princípio de que a lei do orçamento de Estado tem que respeitar a Lei de Finanças Locais, ao mesmo tempo que abriu caminho a novos encargos das autarquias em matéria de habitação e de segurança e tranquilidade pública (o que pode significar mais encargos com menos verbas).

Apesar de todas as dificuldades, o PCP não deixará de intervir firme e activamente nesta revisão na nova fase que se abre hoje. Da mesma forma, intervirá em todo o período ulterior na eventual elaboração das leis de execução que se venham a elaborar.

O PCP apela para a intervenção e a luta de todos os trabalhadores, dos diferentes sectores democráticos, incluindo militantes do próprio PS, no sentido de travar as medidas em curso ou a que esta revisão visa abrir caminho.

É certo que o PS e o PSD procuram fazer passar a revisão sem grandes sobressaltos, com um ritmo alucinante, e com tentativa da sua concretização em pleno Verão e em clima pré-eleitoral, desviar as atenções e desarmar a luta dos trabalhadores e do povo.

A gravidade do assunto justifica, porém, o nosso alerta e o nosso apelo.