A TALHE DE FOICE


Marte ataca



A tradição já não é o que era. Ainda não há muito tempo o mês de Agosto era uma pasmaceira que só visto, e agora... agora é o que se vê. Já os políticos e governantes não podem ir de férias descansados, que logo são obrigados a voltar a toque de caixa, seja porque uns insistem numa greve, seja porque outros deixam vir abaixo uma obra com urgências de inauguração, seja porque outros dão em desbocar num diz que não disse, seja porque o populismo - maquievélica invenção - não dispensa a confraternização de massas com sardinha assada e cervejinha em copo de plástico. Uma desgraça.

Como se isto fora pouco, acresce que os tempos vão mal para os banhos de multidão. Ou é a multidão que vai a banhos, borrifando-se nos políticos, ou são estes que levam autênticas banhadas quando se aventuram - autárquicas obrigam! - nos caminhos da populaça.

Que o diga o presidente da Câmara de Setúbal, Mata Cáceres, brindado há dias com uma vaia monumental na praça de touros da capital sadina, no descerrar de uma lápide a perpetuar sabe-se lá o quê, numa corrida em que até os animais alinharam no protesto, escapulindo-se da arena na primeira oportunidade ou assentando o toutiço em plena praça em total recusa de faena. Uma autêntica tourada.

Que o diga também Marcelo Rebelo de Sousa, que nas suas deambulações algarvias deu à costa num Pontal cada vez mais transformado em pontinha, onde nem as elucubrações canoras de Mendes Bota conseguem já animar as massas.

Que o diga Fernando Gomes, a prima-dona do norte, que em visita pré-eleitoral a um bairro de barracas de estimação, ouviu o bom e o bonito de moradores ainda bem lembrados das promessas de outras campanhas eleitorais, já lá vão uns anitos.

Que o diga Manuel Monteiro, tão desesperado com a possibilidade da regionalização lhe arredar os caciques locais que deu o seu 'amém' a um cartaz com a bandeira nacional estraçalhada. O que por acaso é punível pela lei. O que talvez não seja fruto do acaso é que os rasgões estejam feitos de forma a fazer lembar a cruz suástica.

Que o diga enfim o ministro João Cravinho, obrigado a regressar das terras do samba por causa de um fórró de se lhe tirar o chapéu, e que à falta de soluções de cartola tirou da manga uma receita mágica para atirar os pilotos ao ar - se a lei não serve o Governo, mude-se a lei.

E isto para não falar do imenso rol de trabalhadores que, ao invés de estarem entretidos nas bichas para a Fonte da Telha, não dão tréguas em lutas, protestos e reivindicações, convencidos de que se o orçamento do Estado chega para chorudas gratificações a gestores da Expo, mesmo demitidos, para a compra de autódromos ou negócios com Mellos e Belmiros de Azevedo, então também deve dar para comezinhos direitos de quem trabalha.

É por estas e por outras que Agosto já não é o que era. Até o anticiclone dos Açores saiu do sítio.

A culpa, diriam as nossas avós, foi dessa invenção das idas à Lua. Nos tempos que correm, com Clinton na Casa Branca - e também ele a braços com uma greve de 200 mil motoristas que está a deixar de pantanas o mercado da entrega de encomendas, incluindo mercadorias - deve ser da exploração de Marte. Porque, como diria o outro, ninguém acredita em marcianos, mas lá que eles existem, existem.