Falta de tudo
no Ensino Básico


Em Portugal e na Grécia, apenas 24 por cento dos alunos frequentam escolas com índices de estabilidade do pessoal docente aceitáveis , segundo um relatório nacional para a OCDE. Situação ímpar na Europa, a que se contrapõem valores bem diversos, em países como a Bélgica (80%), Irlanda (77%) ou Espanha (68%).

É um dado particularmente significativo, não apenas da qualidade do ensino no nosso país, como das condições em que se exerce a profissão de professor. O que, naturalmente, corresponde a dois lados da mesma moeda.

Foi em torno deste e de muitos outros problemas que a Federação Nacional dos Professores - FENPROF, lançou agora uma campanha de sensibilização da opinião pública pela dignificação do 1º Ciclo do Ensino Básico.
Em causa está uma política educativa que - porque assente nas teses do funcionamento livre dos mercados, na abertura à iniciativa privada e na desresponsabilização do Estado - levou a uma progressiva degradação do ensino nas suas diversas vertentes.
Degradação que se faz sentir mais ainda nas escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico, como ressalta do documento do Secretariado Nacional da FENPROF, agora divulgado, e em que são analisadas as várias carências e respostas possíveis neste nível de ensino.


Consequências

O primeiro reflexo desta política afere-se pelo parque escolar, claramente marcado pelo "desinteresse e o abandono a que este importante sector do ensino foi votado por todos os governos". Ao nível dos equipamentos, constata-se que "os anos 30 e 40 são a referência para este nível de ensino".
A falta de pessoal auxiliar é outro dos reflexos da política educativa ainda em curso. Num sem número de escolas do nosso país não existe, pura e simplesmente, pessoal auxiliar, apesar da sua importância em tarefas diversas "de vigilância, de acompanhamento, de colaboração com os professores, de manutenção de condições de higiene e limpeza em todos os espaços".
A todo este quadro acresce a falta de um corpo docente estável, com elevado número de professores contratados, numa clara aposta numa política de mão-de-obra barata.
Um problema particularmente premente pois este é "o único sector do sistema de ensino que cobre a totalidade do país, abrangendo regiões onde os fenómenos de interioridade mais se fazem sentir". Pelo que se impunha "a atribuição de incentivos de vária ordem à fixação de professores ali colocados".
Uma realidade que evidencia a necessidade de uma mudança profunda e medidas urgentes, nomeadamente - uma definição clara de competências quanto às áreas de intervenção de governo e autarquias; a dotação de um orçamento próprio das escolas do 1º Ciclo; a criação de infraestruturas básicas que permitam dar resposta a necessidades básicas, como refeitórios, ocupação de tempos livres e actividades de complemento curricular; estabilização do corpo docente e incentivos em zonas desfavorecidas; reestruturação e renovação do parque escolar; calendarização do processo negocial.


Alterações que se impõem

A gestão e autonomia das escolas é uma das áreas em que se impõem alterações. Um domínio em que FENPROF defende a necessidade da implementação de estruturas e organismos assentes no princípio da democraticidade e dotados de meios e recursos adequados e concretamente a constituição, num quadro de descentralização da administração educativa, de Conselhos Locais de Educação.
No que respeita aos recursos humanos, tudo passa por "uma reestruturação urgente da rede escolar e dos quadros das escolas, dotando estas do número de professores necessários ao seu correcto funcionamento", em função de uma nova relação professor/aluno e das novas tarefas que se exigem à escola "em termos curriculares, de apoio nas áreas das expressões e outras".
A integração no quadro de todos os professores com pelo menos dois anos de serviço e medidas de fundo que alterem o actual sistema de formação inicial, são algumas das reivindicações fundamentais da FENPROF nesta área.
O abandono e desprezo em relação ao parque escolar do 1º Ciclo, uma política de equipamentos escolares que os reduziu a "um quadro, uma caixa métrica, algumas réguas e esquadros, os mapas geográficos e, em algumas, pequenas bibliotecas", a desresponsabilização do Estado na área da alimentação escolar - exige a elaboração de um plano nacional de recuperação do parque escolar.
Recuperação que deverá incluir - de par da construção de novas escolas e recuperação das escolas degradadas - o debate em torno de toda a problemática da Acção Social Escolar, "com destaque para as questões dos transportes, refeitórios, ocupação de tempos livres e outras".


«Avante!» Nº 1249 - 6.Novembro.97