EDITORIAL
Preços e salários - a mesma questão
Por iniciativa do PCP a Assembleia da República
discute hoje, em debate de urgência, o recente agravamento dos
preços de alguns serviços de primeira necessidade.
Ainda não se completou a primeira quinzena do novo ano e já aí
estão a pesar nos orçamentos familiares os aumentos dos custos
da electricidade, dos telefones, dos correios, das portagens, dos
passes sociais, entre outros. A natureza dos serviços cujo
preço foi agora aumentado vai, com alta probabilidade,
determinar o agravamento dos custos de outros bens e serviços e
é susceptível de incentivar novos surtos especulativos.
A iniciativa dos comunistas reveste, assim, uma grande
oportunidade e é da maior importância não só para desmascarar
e conter os propósitos do Governo em relação a outros
aumentos, mas também para alertar e mobilizar o país contra uma
ainda maior escalada no agravamento do custo de vida.
Este debate de urgência que o PCP desencadeou na Assembleia
da República foi, recorde-se, precedido de uma conferência de
imprensa, na semana passada, dada em nome da Comissão Política
do PCP e conduzida por Francisco Lopes, que apresentou um texto
com importantes revelações que o «Avante!» publica,
praticamente na íntegra, na presente edição.
O texto da Comissão Política do PCP assinala, logo
a começar: « São aumentos injustificáveis quando muitos
destes serviços têm em Portugal os custos mais elevados da
Europa (considerando o poder de compra), constituindo autênticos
impostos e as empresas que os garantem acumulam largos milhões
de contos de lucros anuais, que se elevam de ano para ano.»
Centrando a sua análise no aumento dos preços da electricidade
e dos telefones, os comunistas revelam que se prevê que as
respectivas empresas, a EDP e a Telecom, ambas objecto de
escandalosos processos de privatização, tenham tido muitas
dezenas de milhões de contos de lucros, em 1997: a primeira,
mais de 90 milhões; a segunda, cerca de 70 milhões.
A demagogia e o cinismo propagandístico com que têm sido
apresentados estes aumentos de preços (que estiveram a ser
preparados em surdina para só serem divulgados após as
eleições autárquicas) traduzem a má consciência do Governo.
A verdade é que, nos preços, como nos salários, a questão
é a mesma: o Governo opta, como os factos demonstram, pelo
favorecimento leonino do grande capital, em detrimento dos
trabalhadores e da maioria da população - e não há alegadas
«preocupações sociais» que o disfarcem.
A celeridade e a liberalidade com que o Governo
procedeu em matéria de aumento de preços tem como reverso a
morosidade e a mesquinhez com que tem arrastado as negociações
visando aumentos salariais.
Apesar das «boas condições económicas do país» que não
se cansa de propagandear, o Governo regateou cada meia décima de
aumento no processo negocial da Função Pública e não foi
além dos 2,75 por cento, muito aquém do que era reivindicado
pela Frente Comum, ligada à CGTP-IN.
Por isso mesmo e também por ter visto frustrado o acordado em
1996 em matéria de carreiras, a Frente Comum não assinou o
acordo e anunciou que «vai continuar a lutar pela equiparação
do índice 100 (o salário mais baixo e base do edifício
salarial) ao salário mínimo nacional».
É claro que o ministro Jorge Coelho não hesitou em declarar
que, «pelo terceiro ano consecutivo, a Funça Pública vai ter
aumentos salariais sem haver aumento de impostos».
Esqueceu-se, no entanto, o ministro de dizer que com tais
percentagens de aumento que pouco superam a inflação prevista e
que não acompanham o crescimento da produtividade, os
trabalhadores portugueses nunca mais se aproximaram dos níveis
salariais dos outros trabalhadores da União Europeia, a começar
pelos espanhóis.
Quanto aos impostos, é necessário esclarecer também que a
carga fiscal não tem cessado de aumentar, e que ela recai
fundamentalmente, como hoje toda a gente sabe, sobre os ombros
dos trabalhadores por conta alheia.
Como foi muito bem salientado num recente Plenário de Sindicatos
da CGTP-IN «prossegue-se uma política que não favorece a
valorização do trabalho nem o crescimento sustentado do
emprego, que não combate as desigualdades e injustiças sociais,
mas que, no essencial, satisfaz um patronato que continua a
querer resolver os problemas da competitividade das empresas à
custa da mão-de-obra barata e dos direitos dos trabalhadores».
É essa mesma política de mão-de-obra barata que tem tido
triste ilustração nas negociações em torno do aumento do
salário mínimo nacional, preparando-se o Governo e o patronato
para resistirem o mais possível aos 61 contos mensais
reivindicados pela CGTP-IN, como o «Avante!» destacadamente
salientou, na sua edição da passada semana.
Neste quadro, a contratação colectiva adquire uma grande
importância sendo fundamental a elaboração das
reivindicações e a organização e definição das formas de
luta, essencialmente nas empresas, para que se obtenham bons
resultados.
Já se sabe que há para aí muitos «grilos
falantes» que se incomodam e se exasperam com a permanente
atenção que o PCP dedica aos problemas dos trabalhadores e com
o incentivo e apoio decididos que presta às suas lutas.
Bem se percebe que os trabalhadores portugueses ficariam bastante
mais desprotegidos e isolados se não contassem com esta
constante solidariedade combativa do PCP.
Foi o director do «Expresso», José António Saraiva, que
retomou o grilo falante do Pinóquio para, ele próprio, armado
em grilo pretender dar «umas lições» ao PCP, no número do
aniversário do seu jornal.
Custa a crer em como se pode dar mostras de tanta ignorância
e cair em semelhante ridículo.
É claro que Saraiva insiste nos clichés do «declínio do
PCP», do «partido de protesto», do «partido sindical», do
partido identificado «inteiramente com o modelo soviético».
Tudo para concluir que é muito fácil para o PCP encetar a senda
do sucesso: basta abandonar os trabalhadores à sua sorte,
tornar-se «a voz da consciência» do PS, refundar-se, mudar de
dirigentes, etc.
É de amigo, não restam dúvidas!
Mas por que é que estes «analistas» não estudam um pouco o
que realmente dizemos e fazemos quando nos querem combater?!
Aconselhamos ao «grilo falante» do «Expresso» que faça uma
pausa na verborreia para ler um pouco, por exemplo, o Programa do
PCP. Então perceberá que este partido não segue nenhum modelo
e que há muitos, muitos anos se pronunciou contra os modelos.
É caso para dizer: os grilos falam, mas o PCP passa.