Os parentes na lama?


É uma evidência que, desde o início da semana passada, se vêm alterando, progressiva e fortemente, as ideias circulantes sobre as novas tarifas telefónicas, como se atesta pelo facto notório de muitos órgãos de comunicação social que, na primeira semana deste mês, tinham acolhido bastante reverentemente as "verdades" da Portugal Telecom, terem evoluído para uma avaliação muito crítica do novo tarifário e veiculado numerosos comentários (e também saborosos "cartoons") arrasando as falácias e truques da PT e do Governo.
Assim em boa hora desrespeitando e mandando passear o conselho que, com manifesto excesso de zelo, um jornalista do «DN» (em 8/1) havia aviado no sentido de que «por enquanto, os consumidores não terão outra alternativa senão confiar nas contas da PT».

E, dizendo isto, dizemos também que não nos passa pela cabeça retirar mérito a quem quer que o tenha nesta justa batalha de opinião contra uma das mais sofisticadas operações de intoxicação e um dos mais desavergonhados assaltos aos bolsos dos cidadãos de que há memória nos últimos anos.
Mas, dizendo tudo isto, é preciso acrescentar que só uma imensa distracção ou um impenitente preconceito é que pode levar alguns a, nesta matéria, pretenderem apagar o papel desempenhado e o lugar ocupado pelo PCP, a exemplo de que muitos outros estão sistematicamente fazendo a respeito da lei sobre o aborto.

Por todos, valha o exemplo de Nuno Rogeiro que, no «Independente» (de 16/1), apenas dava os «parabéns à DECO» porque «baseada em pressentimentos, percebeu, antes de qualquer detective privado, que os telefones, indo ser mais baratos, vão ser mais caros (como o «Independente» revelava há uns meses, no meio da indiferença quase geral».
Ora, a verdade é que a DECO (cuja intervenção digna e corajosa só pode merecer apreço) tomou posição no dia 14/1, e o PCP já tinha tomado posição concreta e fundamentada em conferência de imprensa realizada em 7/1, posição que, por sinal, foi enviada ao «Independente» que a recebeu com a sua habitual «indiferença geral», o que não é admirar pois, na sua edição de 9/1, aquele semanário ainda estava entretido a colocar Murteira Nabo no "top" da sua rubrica "Em alta/Em baixa", escrevendo que «esta semana baixaram as tarifas dos telefones», e que «para já, os consumidores estão a ganhar».

E, já agora, para proveito geral de quem não tem obrigação de saber e proveito particular dos muitos Rogeiros que nem querem saber, lembre-se que já em 16 de Setembro de 1997, na sequência de notícias então divulgadas, o PCP havia denunciado, em conferência de imprensa, os gravosos planos da PF, que em Outubro e Novembro o PCP editou e distribuiu dois folhetos sobre este assunto e que, durante a última campanha eleitoral, o Secretário-geral do PCP, várias vezes advertiu que o Governo e a PT reservavam para depois das autárquicas um escandaloso aumento das tarifas telefónicas.
Será que a alguns lhes cairiam os parentes na lama se, ao menos uma vez por outra, fossem capazes de reconhecer que o PCP tinha razão, disse a verdade e agiu a tempo? — Vítor Dias


«Avante!» Nº 1260 - 22.Janeiro.98