Petróleo
O pico de Hubbert
e o esgotamento anunciado

Por Jorge Figueiredo


A teoria é simples. O petróleo existente no planeta é um recurso finito, como é aceite por toda a gente. O processo que leva ao esgotamento de um recurso finito, qualquer que seja ele, é constituído por três etapas: 1) A produção principia no zero; 2) A produção, a seguir, ascende a um pico — um máximo que já não pode ser ultrapassado. 3) Após o pico, a produção declina até que o recurso esteja esgotado.

Estas idéias elementares permitem construir um gráfico. Se a produção de petróleo (em milhões de barris/dia) for posta no eixo das ordenadas e o tempo (em anos) no das abcissas, obtem-se um retrato claro da situação. A curva obtida mostrará as variações da produção, ano a ano. E a área por baixo dessa curva corresponderá à produção acumulada.

É evidente que este gráfico simples tanto pode ser construído ao nível de um país, de uma província petroleira ou ao nível mundial. O seu "inventor" foi o Dr. M. King Hubbert, um conhecido cientista americano no campo dos estudos petroleiros. Mas, como é evidente, um esquema teórico como este será tão bom quanto o forem os dados utilizados para construir a curva. É aqui que entram os méritos analíticos de Hubbert, um especialista em estatísticas petroleiras. Ele já foi responsável por importantes descobertas. Em 1956, por exemplo, conseguiu prever (correctamente) que a produção de petróleo dos EUA atingiria o seu pico por volta de 1970.

A metodologia de Hubbert exige uma análise exaustiva das estatísticas petroleiras existentes, a saber: 1) A produção acumulada (conhecida); 2) As reservas (conhecível); 3) O petróleo ainda não descoberto (previsível a partir de tendências passadas); 4) O máximo definitivo.

Dessa forma, vem: máximo definitivo = produção acumulada + reservas + petróleo ainda não descoberto. É claro que para chegar a resultados fiáveis é preciso construir gigantescas bases de dados e efectuar um enorme trabalho de análise das estatísticos oficiais de todo o mundo, expurgando-se dados espúrios. Este trabalho, seguindo a metodologia de Hubbert, foi feito pelo Dr. Colin J. Campbell, da firma de consultoria suíça Petroconsultants.

Os resultados que acabam de ser anunciados são espantosos e, se verdadeiros, têm implicações profundas na vida mundial. Eles estão disponíveis na Internet em  http://www.hubbertpeak.com/summary.htm . Afirmam os autores que o máximo definitivo mundial é de 1750 Gb (giga-barris, ou seja, mil milhões de barris), o que é inferior à maioria das previsões correntes. Além disso, afirmam que o ponto médio de esgotamento ocorrerá por volta de 1999-2001, conforme o quadro seguinte:

Produção mundial de petróleo


Neste gráfico a produção mundial de petróleo é indicada em milhões de barris por dia (Mb/d). Ele apresenta quatro possíveis cenários a partir de 1996. Entretanto, o resultado final (seja qual for o cenário que realmente venha a ocorrer) é aproximadamente constante. Isto se verifica porque o Máximo definitivo é considerado como um valor constante. Assim, produzir mais petróleo agora significaria apenas produzir menos no futuro — ou seja, é possivel alterar o perfil da curva mas não a área que está por baixo da mesma. Dessa forma, como a curva declina assintóticamente, restarim pouco mais de 50 anos de extracção de petróleo!

Mas este estudo global não fica por aqui. Desagregando-se por países verifica-se que estes estão em diferentes fases de produção. Alguns (como os EUA) já atingiram o pico há muito tempo e agora estão na fase do declínio. Outros (como a Grã-Bretanha) vão atingir o pico muito em breve (1999). E alguns (como o Iraque, a Arábia Saudita, o Abu Dhabi e o Kuwait) ainda tem petróleo para mais de 20 anos. O número de anos que faltam para o esgotamento é indicado no quadro:

Tempo para atingir o ponto médio de esgotamento


Como se observa, os únicos países do mundo que ainda têm pela frente um período de tempo considerável (20 anos ou mais) para atingirem o seu Ponto Médio são todos do Médio Oriente: Abu Dhabi, Kuwait, Iraque e Arábia Saudita. Assim, se se excluir a eventual descoberta de novas e importantes províncias petroleiras, é natural que a participação relativa destes quatro na produção mundial venha a ser cada vez maior: dentro em breve eles estarão a fornecer mais de 30% das necessidades planetárias.

Se a análise acima esboçada (e, obviamente, os dados em que se baseou) forem verdadeiros, isto tem implicações profundas na política mundial. Dizer que o petróleo (barato) existente no planeta acabará dentro de 50 anos não é dizer coisa de pouca monta. As implicações são vastas e a longo prazo, difíceis mesmo de imaginar na sua totalidade, complexidade e consequências (económicas, tecnológicas, políticas, etc). Se houvesse alguma racionalidade no modo de produção capitalista esta perspectiva deveria conduzir a humanidade, desde já, à adopção de novas alternativas energéticas.

Por outro lado, se nos próximos anos a produção mundial de petróleo concentrar-se cada vez mais em quatro países do Médio Oriente, as implicações a curto e médio prazo são enormes: O domínio dessa região tornar-se-á cada vez mais crucial. A agressão sofrida pelo povo do Iraque há sete anos atrás (seguida por uma guerra económica que já custou a vida a mais de um milhão de crianças) tem tudo a ver com o petróleo. A bárbara guerra de extermínio que agora os EUA ameaçam desencadear novamente contra o Iraque nada tem, portanto, a ver com as malfeitorias (supostas ou verdadeiras) do Sr. Sadam Hussein. Para defender os seus interesses o império é capaz de qualquer crime.

«Avante!» Nº 1267 - 12.Março.1998