Sem aspas


Não surpreende o método utilizado pela generalidade da comunicação social na apreciação à forma como o PCP - a partir de uma profunda reflexão colectiva e de um sério esforço de aplicação de medidas concretas - procura caminhos capazes de conduzir à superação das reais dificuldades e obstáculos que se lhe deparam e ao reforço da sua expressão social, eleitoral e política.

Sem aspas, eis algumas das sensacionais revelações difundidas por essa comunicação social: está lançado, no interior do PCP, um amplo debate no qual milhares de militantes comunistas, fugindo ao controlo do aparelho partidário, concluem que é necessário organizarem-se de forma mais adequada à situação existente; que o discurso de infalibilidade perdeu sentido e que, por isso, é necessário corrigir erros e deficiências de organização e de intervenção; que é necessário renovar e rejuvenescer o Partido eliminando de vez princípios obsoletos como o centralismo democrático, afastando impiedosamente a geração da clandestinidade e substituindo-a pela nova geração; que é necessário uma maior abertura à sociedade e uma atitude de favorecimento de entendimentos como o PS — e que tudo isto , e muito mais que aqui não é transcrito, foi desencadeado por efeito da derrota eleitoral nas autárquicas de Dezembro passado.
Estas revelações, temperadas regra geral com muito mais molho de intriga, são intencionalmente enviadas para o interior do Partido com objectivos óbvios: procurar semear a divisão entre comunistas e tentar impedir que o esforço colectivo visando o reforço do Partido atinja os objectivos pretendidos.

 

Frustrar estes intentos constitui, assim, mais uma tarefa que hoje se coloca a todos os militantes do partido. E a melhor forma de a concretizar com êxito é continuarmos a assumir plenamente a nossa condição de comunistas;
— é ter em conta que o reforço do PCP implica um persistente e audacioso trabalho na sua ligação cada vez mais profunda com as massas populares, na sua organização, iniciativa e acção políticas, na sua intervenção institucional, na dinamização de um amplo movimento de debate, reflexão, diálogo e acção comum com correntes e sectores democráticos, com organizações e movimentos sociais, com todos os cidadãos que reconhecem ser indispensável a construção na sociedade portuguesa de uma alternativa à política de direita que o PSD e o PS, alternadamente, têm vindo a praticar;
— é ter em conta igualmente, que esse esforço do Partido passa por uma persistente, ampla e qualificada comunicação do PCP com a sociedade e pela constante e confiante afirmação, em todos os planos da intervenção do partido, das suas organizações e militantes , do valor próprio das medidas propostas e do valioso projecto do PCP;
— é ter em conta, também, a necessidade de desenvolver a democracia interna do Partido, ou seja, a necessidade de desenvolver e aprofundar criativamente o centralismo democrático; é ter em conta, ainda, a necessidade de continuar a renovação e rejuvenescimento das organizações e estruturas partidárias, avançando para uma presença mais numerosa, mais responsabilizada e responsável, mais interveniente de quadros jovens no colectivo partidário a todos os níveis - sem conflitos de gerações e, pelo contrário, tendo em conta que a história, a vida e a luta do nosso Partido, integrando naturalmente grandes ideias, valores e experiências em que todos nos reconhecemos, não podem deixar de integrar esse mundo dificilmente reproduzível dos sentimentos, da sensibilidade, do olhar e do imaginário próprios de cada homem e de cada mulher que ajudou, ajuda e ajudará a construir essa história, essa vida e essa luta e que viveu, vive e viverá este grande e apaixonante empreendimento humano que é o PCP;
— é ter em conta, também, a necessidade de elevar a militância e valorizar o papel do militante, como fundamento essencial para o reforço orgânico do Partido, a necessidade de desenvolver o trabalho de reforço e constituição de organizações de base, a necessidade de continuar a agir com confiança, perseverança e organizadamente no recrutamento de novos militantes, a necessidade de corrigir erros, deficiências e insuficiências por todos reconhecidas.

Aqui chegado, comentará o leitor: afinal parte do que alguma comunicação social e alguns comentadores dizem que o Partido está a fazer é de facto o que o Partido está e quer continuar a fazer.
E assim é, se retirarmos às chamadas revelações sobre o Partido o tal molho de intriga já referido (e que constitui, diga-se, a parte mais importante dessa intervenção).
Aliás, e curiosamente, todas as considerações, análises, autocríticas e linhas de trabalho apontadas — e que, para a comunicação social constituem novidades sensacionais nascidas por efeito dos resultados eleitorais de Dezembro passado — são simplesmente transcrições, também sem aspas, de intervenções e conclusões contidas na Resolução Política do XV Congresso do PCP, realizado em 6, 7 e 8 de Dezembro de 1996, Congresso sobre o qual vários dos referidos órgãos de informação disseram na altura que não trazia nada de novo pelo que, no PCP, tudo continuava na mesma …
O que quer dizer que essa comunicação social e esses comentadores estão a ver novidades onde não as há. Pelo facto, óbvio, de não as terem visto quando as houve.


«Avante!» Nº 1271 - 9.Abril.98