Encontro-Festa
da JCP
Audácia de conquistar
Muitos foram os jovens que participaram, sábado passado, no Encontro-Festa promovido pela JCP no jardim dos Jerónimos, em Belém. Um encontro de cultura e de luta.
Numa tenda montada para o efeito, realizou-se, da parte da manhã, uma discussão sobre a acção e intervenção da JCP nas diversas frentes de trabalho - nas escolas, nas empresas, nas freguesias, nos concelhos -, valorizando simultaneamente o papel dos jovens na sociedade.
A concluir o debate foi aprovado, por unanimidade, o manifesto "Audácia de conquistar", que coloca as questões fundamentais que preocupam a juventude e as propostas da JCP para uma sociedade mais justa. O Manifesto reafirma ainda que os jovens comunistas continuam a lutar por um ideal, pelo marxismo-leninismo.
Pela tarde desenvolveram-se várias actividades, como futebol e voleibol, subida da parede da escalada, tiro com arco, pintura, graffiti´s, música de diferentes estilos, com grande participação dos jovens presentes.
Antes da festa, com música dos "Navegantes", houve uma primeira intervenção, de Osvaldo Marta da Comissão política da JCP, a que se seguiu a de Carlos Carvalhas, secretário-geral do PCP, de que aqui transcrevemos largos extractos.
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Intervenção
de Carlos Carvalhas
(...) Organizada pela JCP
aqui estiveram hoje jovens de diversos pontos do país, numa
jornada de convívio, de fraternidade, de alegria, de reflexão e
debate sobre os problemas da sociedade portuguesa, mas também
numa jornada de solidariedade com os povos em luta.
E sendo esta a primeira iniciativa nacional depois da grandiosa
manifestação realizada pelos estudantes do ensino superior por
melhor ensino e segurança social escolar, contra as propinas,
permitam-me que daqui saúde todos os jovens que directa ou
indirectamente se associaram àquela realização.
O Primeiro-Ministro e o Ministro da Educação mantêm-se
autistas mas são responsáveis pela degradação do ensino
público e pela actual situação. Hoje já ninguém fala na
"paixão" deste governo pela educação!
A equipa do Ministério da Educação disfarça mal a
inspiração neoliberal da sua filosofia. Aliás as
declarações de Marçal Grilo de que os estudantes estão na
Universidade para estudar... e portanto, não para protestar,
poderiam ter sido proferidas por um qualquer ilustre ministro da
Educação de uma Srª Tatcher ou de um Sr. Major. Taylor
também dizia aos trabalhadores: «trabalhadores, vocês estão
aqui apenas para trabalhar, pois há aqui quem seja pago para
pensar...».
Mas os estudantes pensam pela sua própria cabeça e, por isso
mesmo, interrogam e não se conformam com o actual estado do
ensino, com o seu financiamento e com a falta de saídas
profissionais. Estão fartos de promessas, de marketing político
e de discursos.
Quando hoje se diz por exemplo, que há falta de médicos no
país, de quem é a culpa?
Porque não se acaba com os numerus clausus?
Porque razão é que para se entrar em medicina se exige uma
média elevadíssima?
Como vocês sabem nós
apresentamos na Assembleia da República um projecto de lei com
um conjunto de medidas que se tivessem sido aprovadas já teriam
eliminado os numerus clausus das Universidades
portuguesas. Mas há quem não esteja interessado. A filosofia do
governo é da desresponsabilização crescente das suas funções
sociais.
São inteiramente justas as críticas que a juventude tem feito
sobre o financiamento do ensino superior público e a acção
social escolar, quer porque contraria o princípio constitucional
da progressiva gratuitidade do ensino público, combatendo o
elitismo do acesso ao ensino superior; quer por contrariar o
compromisso assumido pelo Ministro da Educação de que a verba
das propinas seria aditiva em relação ao financiamento
público, o que não se verifica; quer ainda porque mistura o
financiamento com a acção social escolar em esquemas perversos.
Pela nossa parte, como vocês sabem decidimos propor através da
Comissão de Educação, Ciência e Cultura da Assembleia da
República uma ampla audição sobre os problemas do
financiamento e da acção social escolar, com a contribuição
de estudantes e docentes do ensino superior público e
apresentámos dois projectos de lei sobre estas matérias.
Há meios financeiros e humanos para resolver os problemas do ensino, e muito especialmente do ensino superior. O que está em causa são as opções e a linha política neoliberal que tem sido seguida.
E isto passa-se no ensino
como nas mais diversas áreas de intervenção do Estado,
nomeadamente na economia com a consequente acentuação das
desigualdades, concentração da riqueza e a produção de um
número crescente de excluídos e marginalizados do crescimento
do "produto nacional". E este quadro é fermento de
instabilidade social, de insegurança e também das condições
favoráveis à proliferação da toxicodependência.
A juventude que é particularmente sensível às injustiças
e à hipocrisia tem hoje na generalidade um pensamento
profundamente crítico quanto à política do governo,
nomeadamente em relação à toxicodependência que exige não
acções propagandísticas mas sim um sério e efectivo combate
quer em relação à prevenção; quer em relação ao tráfico;
quer ainda em relação à recuperação e reinserção social de
milhares e milhares de jovens. Do mesmo modo a generalidade da
juventude tem também uma posição crítica à hipocrisia
daqueles que falam do direito à vida dando assim inteira
cobertura ao flagelo do aborto clandestino e daqueles que,
de cedência em cedência, de vacilação em vacilação, de
reviravolta em reviravolta, descaracterizam os projectos de lei
que visavam dar resposta a este problema dramático, nomeadamente
para tantas jovens mulheres. Aliás, quanto às cedências e
reviravoltas vale a pena lembrar as posições do Partido
Socialista e da JS e também as do Eng. Guterres que, quando
deputado votou o projecto de lei do PCP sobre a interrupção
voluntária da gravidez...
Vamos ver se o PS, como Partido, toma ou não posição sobre a
questão, ou se vai ficar pelo «nim» procurando lavar as mãos
como Pilatos.
Nesta iniciativa de hoje não
estiveram em foco apenas os problemas nacionais. Esteve também
presente a solidariedade com os movimentos e povos em luta.
A JCP para além da reflexão sobre os problemas da juventude
portuguesa quis também assinalar e marcar o seu apoio à luta de
muitos povos e movimentos internacionais. Também nós nos
queremos associar à solidariedade aqui prestada pela JCP
nomeadamente, a Timor e à luta do povo Mauber; à luta dos
"Sem terra" no Brasil; à luta de Cuba contra o
bloqueio imposto pelo imperialismo norte americano; à luta do
povo da Palestina contra o fundamentalismo do governo de Israel;
à luta da população de Chiapas pelos seus direitos e pela sua
dignidade...
Podemos reforçar mais
a nossa influência na juventude portuguesa
Não é fácil a vida para muitos jovens de hoje.
A falta de saídas profissionais; o desemprego e o trabalho precário; a exploração a que são sujeitos; a falta de habitações; o contraste entre o desenvolvimento científico e técnico, entre as possibilidades oferecidas na resolução dos problemas pelo desenvolvimento das forças produtivas e as crescentes manchas de pobreza; a acentuação das desigualdades; a hipocrisia dos governos e dos porta-vozes das classes dominantes são factores que não deixam de provocar a indignação, o protesto, o inconformismo e a luta de importantes sectores da juventude. Luta pela dignidade humana, luta pela justiça e pela transformação social.
É certo que os valores com que o grande capital procura inculcar na sociedade: o salve-se quem puder, o egoísmo e o esmagamento dos outros, o arrivismo, a submissão e o culto do dinheiro e da especulação financeira, desviam atenções e induzem comportamentos que entravam a tomada de consciência política e a intervenção organizada das camadas juvenis.
Mas são também cada vez mais os jovens que intervêm, que criticam esta sociedade onde impera a lei do dinheiro e do mais forte e também os que manifestam o seu acordo com a nossa luta empenhada pelas causas mais generosas, com o nosso projecto e com as propostas e soluções que apresentamos. E são muitos os que vêm a nós, e que vão engrossando as fileiras da JCP e do PCP, com sangue novo e com novas forças. É um magnífico sinal o facto de tantos e tantos jovens nos apoiarem e de tantos se terem inscrito ultimamente quer na JCP quer no PCP. (...)
Mas há ainda os que nos
dando razão em muitas questões têm mais dificuldades em nos
apoiar ou em convergir connosco.
Por preconceitos de vária ordem ou porque só nos conhecem
apenas pelas falsas imagens e ideias difundidas por certa
comunicação social. Muitos desconhecem o que realmente somos, o
que defendemos e como agimos, nem conhecem o nosso património de
luta.
Desconhecem que as principais conquistas sociais e democráticas
e os principais avanços de civilização, muitas das quais são
hoje tão naturais como o ar que se respira, estão ligados à
luta e aos sacrifícios sem conta dos comunistas e dos comunistas
portugueses.
Há também outras razões
para esse distanciamento. Por um lado, as formas como às vezes
nos organizamos nem sempre são adaptáveis ou suficientemente
flexíveis aos múltiplos centros de interesse da juventude e nem
sempre as nossas iniciativas, as nossas reuniões ou o modo como
nos dirigimos aos jovens, como nos posicionamos ou comunicamos
são suficientemente interessantes, motivadoras e atractivas em
relação a estas camadas.
Por outro lado há a derrocada do socialismo a Leste com as suas
perversões, nomeadamente no terreno das liberdades, que pesam,
que animam preconceitos e desconfianças, que fecham perspectivas
e que continuam a ser exploradas e também falseadas,
nomeadamente pelas forças ao serviço do grande capital.
Esta exploração propagandística que é feita com grandes meios
e meios sofisticados e que procura apagar todas as
contribuições que foram dadas por essas experiências à luta
dos trabalhadores e dos povos de todo o mundo, é também
facilitada pelo que foi a nossa postura.
Durante muitos anos o nosso Partido, embora afirmasse que não
havia "modelos de construção do socialismo", a
verdade é que apareceu quase sempre identificado com a URSS,
identificado com uma determinada construção do socialismo (o
socialismo real). A luta clandestina, a luta antifascista, a
solidariedade desses países à nossa luta e à Revolução de
Abril, a violenta confrontação Leste/Oeste e o não se querer
enfraquecer a frente anti-imperialista colocou o Partido muitas
vezes numa posição seguidista e acrítica.
A posição perante a URSS foi considerada a "pedra de toque
do verdadeiro revolucionário...", atitude que se manteve
mesmo quando eram cada vez mais claras as suas deformações e
quando era evidente que o "socialismo real" perdia
crescentemente poder de atracção.
É também por isso, que ainda hoje os preconceitos, as desconfianças e o anticomunismo encontram terreno favorável. De facto, como já se afirmou, não houve um distanciamento, nomeadamente público, em relação à construção do socialismo na URSS. Foi um erro. A solidariedade anti-imperialista não se pode confundir nem significar acordo ou apoio a práticas, soluções, métodos ou «modelos». O PCP fez sobre estas questões uma autocrítica corajosa no seu XIII Congresso. Mas os prejuízos para a luta emancipadora são enormes. A imagem que se procura passar, ainda hoje, é a de que o PCP no "Poder" seguiria aquele «modelo», restringiria as liberdades e estatizaria toda a vida e toda a economia.
Nada mais falso. O PCP não recebe lições de luta pela liberdade, de humanismo, de solidariedade ou democracia e muito menos daqueles que quotidianamente a mutilam e empobrecem.
Mas é necessário desenvolver um grande esforço pedagógico e de convencimento e travar um grande combate para vencer preconceitos e para que a juventude e a generalidade do povo português nos conheça com verdade. Isto é, que conheça os nossos Programas Eleitorais, os projectos de lei que apresentámos na Assembleia da República, o que defendemos nas instituições e fora delas, que conheça o nosso projecto de "Democracia Avançada", que conheça aquilo por que lutamos e por que nos batemos. A democracia, o pluralismo, a democracia política que só por si tem um valor intrínseco, são para nós valores não de ordem táctica, mas valores fundamentais, valores estratégicos. Do mesmo modo o são a democracia económica, com a coexistência de diversas formas de propriedade, a democracia social e a democracia cultural.
Rejeitando "modelos", nós comunistas portugueses temos por horizonte o socialismo assente no aprofundamento da democracia nas suas diversas componentes, na experiência de Abril e num projecto renovado que acolha o que de mais positivo a prática, a experiência e o que o futuro trouxer à marcha da humanidade. E é continuando a luta, virados para o futuro, confiantes na necessidade e na possibilidade da construção de uma nova sociedade que prestamos o melhor tributo à actualidade que não é uma actualidade de museu, nem de fé, ao "Manifesto Comunista", obra ímpar de Marx e Engels, cuja força e vitalidade do seu estilo, valores e ideais ainda hoje são fonte de inspiração para a juventude.
Há muitas razões para que a juventude estudantil e trabalhadora se junte a nós na luta pela transformação social, na luta contra a exploração e um sistema iníquo que polariza cada vez mais a riqueza e o poder de um lado e, do outro, a miséria, a dependência e a incerteza no dia de amanhã. Mas é necessário também que a JCP e o Partido estejam cada vez mais voltados para fora, que tenham em atenção nos seus debates e na sua organização a maneira de ser e de estar dos jovens de hoje, avessos a formalismos, ou a arrastamentos de reuniões e a paternalismos. E é necessário que os jovens sintam e vejam no concreto que a sua opinião conta e que a sua voz é ouvida.
Há muitas e boas razões para aumentar ainda mais a nossa influência nas camadas juvenis.
Há muitas e boas razões porque nós somos a força que com coerência e com firmeza defende os justos anseios e aspirações da juventude.
Há muitas e boas razões porque somos o grande Partido da esquerda que levanta sem hesitações os valores da esquerda, que põe os actos de acordo com as palavras e que não vira costas às dificuldades, que luta contra a hipocrisia e o reaccionarismo, que luta pela transformação social tendo por horizonte o socialismo.
Há muitas e boas razões porque a juventude não aceita a hipocrisia de um governo que com o nome de socialista não se distingue do PSD em muitas medidas e nas questões fundamentais e mais estruturantes. Não se pode de facto, recolher as felicitações dos grandes senhores do dinheiro por se conduzir uma política neoliberal exemplar e os aplausos da juventude e do povo porque simultaneamente se denuncia e se lamenta as injustiças que são as consequências dessa mesma política.
É aliás neste caldo de cultura onde prolifera o racismo e a xenofobia que a direita e a extrema direita se vão alimentando; nos problemas deixados sem solução, nas promessas não cumpridas, nas voltas e reviravoltas politiqueiras, isto é, no cemitério das ilusões perdidas e de muitas esperanças traídas.
Nós temos uma grande confiança na juventude, no seu inconformismo e na sua intervenção política, social e cultural. A JCP é uma grande força política da juventude portuguesa. O PCP conta com a JCP, a JCP conta com o PCP e a juventude pode contar sempre com o PCP e a JCP na luta pela concretização dos seus anseios e na abertura de novos caminhos de realização e de esperança.
«Avante!» Nº 1271 - 9.Abril.98