Pausas integram tempo de trabalho
Parlamento reconhece
vitória dos trabalhadores


Foi finalmente materializado em lei o reconhecimento de que as pausas se integram no tempo de trabalho.
Depois da persistente luta que durante mais de quinze meses mobilizou os trabalhadores, o Parlamento aprovou um diploma que vem clarificar a questão das 40 horas, estabelecendo que são considerados tempo efectivo de trabalho todos os períodos em que o trabalhador se encontra à disposição da entidade empregadora.

Com esta clarificação, derrotado fica o entendimento do conceito de trabalho efectivo comungado pelo Governo e confederações patronais. Reconhecida, simultaneamente, é a vitória dos trabalhadores, que, não vergando a pressões de toda a ordem, como exemplarmente demonstraram os do sector têxtil, souberam com firmeza resistir e levar por diante uma luta que só terminou com a conquista efectiva das 40 horas de trabalho.

Na proposta de lei debatida e votada faz hoje oito dias, resultante de uma directiva comunitária de 23 de Novembro de 1993, referente a prescrições mínimas de segurança e saúde em matéria de organização do tempo de trabalho, o Governo vem reconhecer que tempo de trabalho corresponde a "qualquer período durante o qual o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade empregadora e no exercício da sua actividade".

Nessa medida, considera tempo de trabalho "as interrupções ocasionais inerentes à satisfação de necessidades pessoais inádiaveis do trabalhador", bem como "as interrupções ditadas por razões técnicas", as que digam respeito "ao intervalo para refeição em que o trabalhador tenha que permanecer no espaço habitual de trabalho" e ainda as pausas referentes a "prescrições de segurança, higiene e saúde no trabalho".

Com este desfecho, demonstrado ficou, ao mesmo tempo, como assinalou a deputada comunista Odete Santos, que "a organização do horário de trabalho e a sua redução se inscrevem entre os principais objectivos dos trabalhadores" e que, não obstante os "retrocessos sempre tentados pelas grandes confederações patronais com o apoio dos governantes, a caminhada pela conquista de tempos livres é irreversível".

"Porque - acrescentou - a dignidade dos trabalhadores exige a protecção da sua saúde. Melhor Saúde. Menos fadiga. Tempo livre. Lazeres. Tempo libertado dos donos do tempo".

Mas se a apresentação do diploma, embora claramente tardia, constitui um inegável avanço e representa uma vitória dos trabalhadores, a verdade é que nele permanecem dispositivos considerados fortemente negativos. Qualquer deles, associado à transposição tardia da directiva comunitária, revela, aliás, na opinião da bancada do PCP, que o "Governo agiu de má fé em todo este processo".

É o que decorre, por exemplo, do facto de o Governo querer manter o conceito de trabalho efectivo, "alongando o tempo de presença na empresa para além das 40 horas semanais, a muitos trabalhadores com pausas conquistadas nas empresas, através dos usos ou na contratação colectiva de trabalho".

Com efeito, a directiva ao definir tempo de trabalho ressalva da definição a legislação nacional e/ou os usos das empresas. Ora, como explicou Odete Santos, se o Governo tivesse transposto a directiva antes de ter apresentado a Lei 21/96, "deveria, em obediência à mesma, ressalvar da definição de tempo de trabalho, incluindo-o no mesmo, aquilo que já constava da contratação colectiva quanto às pausas e intervalos de descanso incluídas no horário de trabalho e as pausas adquiridas nas empresas através dos usos e costumes".

Só que não foi esse o procedimento adoptado pelo Governo do PS. "Primeiro - sublinhou Odete Santos -, pretendeu fazer tábua rasa das conquistas dos trabalhadores relativamente a tempo livre introduzido no seu horário de trabalho destinado a minorar as consequências dos ritmos brutais de trabalho. Para depois, com a transposição da directiva, não ter de respeitar essas conquistas".

Duramente criticada por Odete Santos foi ainda a decisão do Governo de manter na proposta de lei o conceito de flexibilidade - ao permitir que o horário de trabalho de 40 horas seja obtido em relação a um período de referência de 12 meses - , bem como o não respeito que revela o seu articulado por algumas disposição da directiva comunitária, como sejam, por exemplo, a não aplicação da exigência de intervalo de descanso após seis horas de trabalho nas actividades de guarda e vigilância, a não aplicação do período mínimo de descanso de 12 horas entre jornadas de trabalho, ou a pura e simples omissão no que se refere às férias.


«Avante!» Nº 1271 - 9.Abril.98