Movimento amplia-se em Sesimbra
Comunistas
exigem
respostas para as pescas
Por Domingos Mealha
Nas últimas semanas,
a organização concelhia do PCP vem promovendo em Sesimbra um
persistente trabalho para conseguir do Governo respostas urgentes
às graves preocupações que sentem os pescadores, armadores e
suas famílias.
Num comunicado em que se denunciava o facto de as pescas serem
«parente pobre do Governo», a Comissão Concelhia traçou o
quadro dos problemas do sector económico mais importante de
Sesimbra e reclamou seis medidas políticas concretas.
Nas ruas foram colocadas faixas e um jornal de parede com as propostas dos comunistas. Na Assembleia de Freguesia de Santiago e na Câmara Municipal, os eleitos do PCP apresentaram moções que foram aprovadas por unanimidade. No boca-a-boca, considerado o principal meio de comunicação na terra, os problemas da pesca passam a andar acompanhados da reclamação de soluções.
Perguntámos aos camaradas João Lopes, membro da direcção regional de Setúbal do Partido, e Joaquim Tavares, responsável na DORS pela organização concelhia de Sesimbra, que motivos justificaram uma iniciativa de tal envergadura neste momento. Ambos fizeram questão de notar que, desde sempre, o PCP tem acompanhado os problemas das pescas e dos pescadores e tem mantido uma intervenção activa nas várias áreas onde está presente.
Marrocos e 1999
João Lopes, pescador e
conhecido dirigente da Mútua da classe, começou por referir
que, também por estes dias, a própria comissária da UE para as
Pescas, Emma Bonino, enviou um questionário às associações de
armadores sobre importantes decisões em preparação no quadro
da Política Comum de Pesca.
Um dos grandes problemas - explica - é que está a aproximar-se
a data em que uma boa parte dos barcos de Sesimbra, tal como dos
outros portos portugueses, deixará de poder operar em Marrocos.
«O governo marroquino impôs que, a partir de 1999, apenas
possam pescar nas suas águas os armadores portugueses que
aceitem constituir empresas mistas», mas «até hoje, não
conhecemos nenhum armador que esteja a acertar uma solução
deste género».
Coloca-se, então, a interrogação sobre «o que será feito, no
futuro, de 15 embarcações de Sesimbra (e de 46 embarcações, a
nível nacional, grande parte das quais são de Olhão e da
Fuzeta), com uma média de 40 a 50 homens cada, que hoje vivem da
pesca em Marrocos».
«A verdade é que não há pesqueiros alternativos», afirma
João Lopes, pois «para parte da frota, e durante os três ou
quatro meses da época balnear, os Açores podem ser alternativa
para esta pesca, não o são para todo o ano nem para todas as
embarcações».
Também não constituem alternativa os bancos de pesca internacionais que os portugueses exploravam antes de Marrocos, pois já estão esgotados.
Segurança
para todos
A negociação dos acordos para concessão de licenças de pesca em Marrocos, tendo forte repercussão em Sesimbra, constitui apenas uma parte do problema, já que 80 por cento da actividade é feita por pescadores da pesca costeira e local, dentro das 12 milhas, e há ainda as embarcações do arrasto, fora das 12 milhas. Mas a fragilidade é de tal modo, que qualquer perturbação numa das artes vai obrigatoriamente implicar com as restantes.
João Lopes sublinha que,
neste quadro, «para todos os pescadores é importante garantir
alguma segurança». E chama a atenção para que, «a partir do
ano 2003, está em causa a nossa jurisdição sobre o chamado mar
territorial, no limite das 12 milhas». No entender dos
comunistas, «o Governo deve ter uma posição muito firme para
que este mar territorial continue a ser exclusivamente explorado
pela frota portuguesa; mais, esse espaço deve ser alargado das
12 para as 24 milhas».
Mas, critica João Lopes, «os nossos governantes mantêm o
comportamento de um aluno bem comportado perante a Comunidade»
e, se «outros países defendem os seus interesses com mais
garra», «o nosso Governo está a ter pouca força na defesa dos
interesses da pesca e dos pescadores».
Refere que «a Espanha, por exemplo, já conseguiu alargar o seu
mar territorial, e creio que está prevista uma reivindicação
para as 50 milhas, o que reflecte uma determinação de não
aceitar as decisões da Comunidade e defender a sua jurisdição
nacional», considerando que «este é um exemplo que não nos
ficaria mal seguir».
O problema da abertura das águas a frotas estrangeiras, aponta
João Lopes, consiste em que «nas nossas 12 milhas está aquilo
que existe de mais importante, em termos de recursos de pesca na
União Europeia», sendo que naquele limite trabalha a esmagadora
maioria dos pescadores portugueses. «Não somos nós que estamos
interessados em que outros países abram as suas águas
territoriais aos nossos pescadores, é precisamente o contrário,
e daí surgem as pressões para que barcos de outros países
possam cá vir pescar, sem contrapartidas», afirma.
Política
de inércia
«Há uma falha de
investimento dos empresários do sector», admite também João
Lopes, apontando o exemplo de uma multinacional japonesa, que
montou no Algarve uma armação para a pesca do atum, actividade
que estava praticamente extinta, depois de durante anos ter sido
desenvolvida normalmente por pescadores portugueses. Perante as
dificuldades, as pescas necessitam «iniciativa empresarial e
incentivo do Governo».
«O que se passa é que não há uma política de pescas e há
uma grande inércia do Governo relativamente a este sector»,
acrescenta Joaquim Tavares. E refere que, «em Sesimbra, isto
traduz-se objectivamente numa falta de perspectiva para a
resolução dos problemas com Marrocos, sem se vislumbrar uma
posição sobre as novas exigências do governo marroquino;
traduz-se nas questões relacionadas com o porto de pesca de
Sesimbra e com a falta de condições para os trabalhadores da
pesca, com o arrastar de obras intermináveis por parte de uma
administração totalmente desligada do porto; e é ainda o
conjunto das 30 medidas do Governo, anunciadas no Dia do Mar,
onde muito pouco de concreto se vislumbra para os pescadores».
Joaquim Tavares recorda que «somos o país europeu com maior
consumo de peixe, e passámos de país exportador a país
importador de pescado, quando temos condições - do ponto de
vista da força de trabalho e do valor dos nossos pescadores -
para dar resposta ao mercado nacional». Para tanto, «é preciso
que o Governo avance com as medidas necessárias» e «quando
reivindicamos as 12 milhas com exclusividade para Portugal, e as
24 milhas como reserva preferencial, estamos a apontar medidas
concretas que visam esse objetivo».
Joaquim Tavares refere ainda que «o esforço de pesca é hoje
muito maior e a vida dos pescadores mais difícil», uma vez que
«as viagens são mais morosas, os mares são de maior perigo...
e o valor do pescado não compensa este maior esforço, o que
implica que os homens voltem ao mar mais cedo, não descansem o
suficiente, vão pescar mesmo debaixo de temporal». Ora, «a
falta de uma solução para a questão de Marrocos só virá
agravar esta situação».
Por isso, os comunistas reclamam do Governo que defina as pescas
como sector prioritário e adopte as necessárias medidas, que
defenda o sector em Estrasburgo e em Bruxelas. «Não se pode
colocar toda a responsabilidade na União Europeia, tem que se
exigir também que o Governo defenda os interesses dos
portugueses e, neste caso, dos pescadores portugueses», salienta
Joaquim Tavares.
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Autonomia administrativa
para o porto mais valioso
A Comissão Concelhia do PCP exige que o porto de Sesimbra passe a ter uma administração própria e que seja também criada uma capitania. João Lopes realça que «não é justo que o primeiro porto do País, em termos de valor do pescado - e dos primeiros pelo volume do pescado - esteja dependente».
Há várias questões cuja resolução, no
entender do PCP, não deveriam estar dependentes da capitania em
Setúbal. João Lopes refere que as vistorias às embarcações,
por exemplo, poderiam ser marcadas e feitas em um ou dois dias.
Mas, «mais grave e mais lógico, é uma eventual operação
urgente de socorro a uma embarcação em perigo no mar, que hoje
tem que ser desencadeada a partir de Setúbal».
Joaquim Tavares aponta outros problemas que deveriam ter uma
solução diferente, o que seria mais fácil com uma
administração do porto de Sesimbra: «Os armazéns de
apetrechos estão a ser construídos com sucessivos acrescentos
ao projecto. As obras no porto prolongam-se há anos com
alterações e mais alterações. A via alternativa, que ia
retirar de Sesimbra o trânsito do porto de pesca, tem as obras
paradas. Na zona dos velhos armazéns de apetrechos - uma
situação provisória de barracas instaladas dentro do porto há
vários anos - abunda o lixo, os caminhos não são limpos...».
João Lopes confirma que «existe um descontentamento de
instituições que não são ouvidas sobre as infraestruturas em
construção». E deixa claro o seu protesto: «Não é justo que
se mantenham situações destas. As obras arrastam-se, fazem
projectos e alterações sem ouvir as pessoas que vão usar
aquelas instalações e, ainda mais grave, depois de feitas as
obras pela Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra,
esta vai delegar na Docapesca a distribuição das instalações
pelos pescadores. Não parece correcto que, quando surgirem os
inevitáveis conflitos, gerados pela forma como os trabalhos
foram conduzidos, a APS fique de fora.»
Seis medidas
Para defesa da pesca e dos pescadores, a Concelhia de Sesimbra exige, para além de uma administração e de uma capitania próprias para o porto, mais quatro medidas políticas:
que o limite das 12 milhas seja reservado para o exercício exclusivo da frota portuguesa;
que seja alargada, das 12 às 24 milhas, uma zona adjacente, como reserva preferencial da frota portuguesa;
que sejam atribuídos subsídios a pescadores e armadores, quando ocorrerem paragens motivadas por intempéries ou por medidas administrativas;
e que sejam definidos apoios financeiros, dirigidos sobretudo à modernização da frota, com vista ao aumento da produtividade e à melhoria das condições de vida e de trabalho a bordo.