CGTP parte para «nova etapa de uma luta secular»
Do 1º de Maio
para as 35 horas

• As manifestações em Lisboa, Porto, Guimarães, Bragança


Em mais de 60 localidades, incluindo as ilhas das regiões autónomas, muitos milhares de pessoas festejaram o Dia Mundial do Trabalhador no nosso país e saudaram a exigência de nova redução progressiva do horário máximo semanal, sem perda de salários nem de direitos. Foi também lançado um forte alerta contra a ofensiva legislativa que o Governo está a preparar.

A exigência das 35 horas semanais foi vigorosamente aplaudida na Alameda da Cidade Universitária, em Lisboa, onde terminou a manifestação do distrito de Lisboa e dos concelhos do Norte do distrito de Setúbal, que desfilaram desde o Campo Pequeno. Ao iniciar a sua intervenção, Carvalho da Silva sublinhou que os trabalhadores e o movimento sindical unitário festejam o Dia do Trabalhador deste ano com a consciência do trabalho feito e dos resultados alcançados, mas também com a confiança em que outros objectivos serão atingidos com a unidade e a luta firme.


Voltados para o futuro

O coordenador da CGTP - num discurso cujas principais linhas foram retomadas nas intervenções de outros dirigentes da central e nas resoluções aprovadas nas iniciativas levadas a cabo pela Inter neste 1º de Maio - defendeu que «o País precisa de um rumo voltado para o futuro, que ponha de lado o velho proteccionismo do Estado aos capitalistas, aos ricos e poderosos e aposte no desenvolvimento qualitativo da nossa estrutura produtiva e da qualidade de vida dos trabalhadores e dos portugueses em geral».
A CGTP reclama «uma aposta séria da formação profissional», com investimento das empresas nesta área. «Não há "empregabilidade" possível, constituída apenas fora das empresas e sob a responsabilidade exclusiva do cidadão-trabalhador», afirmou Carvalho da Silva, realçando que «o desemprego e a má qualidade do emprego não só põem em causa a coesão da sociedade como também são geradores da exclusão social que alimenta a marginalidade e a delinquência».
Em Portugal, insiste a central, os salários continuam a ser os mais baixos da UE e a distribuição do rendimento é das mais injustas, enquanto os trabalhadores portugueses pagam, pelos bens de consumo e de primeira necessidade, praticamente o mesmo que em qualquer outro dos estados-membros.


Reivindicação
justa e realista

Face a tal quadro, a CGTP afirma ser necessária «uma política que assente no crescimento do investimento e da produtividade, uma política que garanta o aumento do poder de compra, do consumo interno». «É assim que se pode criar emprego e uma das formas de o conseguir é reduzir os horários de trabalho», sublinhou.
Carvalho da Silva salientou que, além de justa, a redução do horário de trabalho é possível e é necessária. «É possível, sem redução de salários; é necessária, para assegurar uma melhor distribuição dos ganhos de produtividade, para incentivar a introdução negociada das novas tecnologias e para permitir uma organização do trabalho mais moderna e eficaz, sustentando o aumento da produtividade e da competitividade das empresas.»
Depois de lembrar que a reivindicação das 40 horas semanais foi lançada no 1º. de Maio de 1989 e que, «com muita luta e determinação fomos conseguindo impor esse nosso objectivo», o dirigente da CGTP reafirmou que «temos de continuar a lutar pelo cumprimento efectivo da redução para as 40 horas e temos de travar uma luta sem tréguas para que os horários contratuais sejam efectivamente praticados».
Neste 1º. de Maio de 1998, «partimos para uma nova etapa desta luta secular, que nos une aos restantes trabalhadores europeus, propondo em Portugal a redução progressiva do horário de trabalho para as 35 horas semanais, em cinco dias, sem redução de salário nem de direitos dos trabalhadores», declarou, explicando após a vibrante reacção dos milhares de pessoas presentes na Cidade Universitária, que a CGTP defende «a redução da duração do trabalho através da negociação colectiva nos sectores e nas empresas, tendo em conta os horários praticados a nível de produtividade e outras condições para a sua efectivação».
Dos partidos políticos, da AR e do Governo, a central espera «iniciativas legislativas com vista a generalizar os progressos alcançados, por forma a que todos os trabalhadores venham a ter, a prazo e sem deixar de ter em conta a produtividade, uma semana máxima de 35 horas».

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Já basta de sacrifícios!

«Vivemos , hoje, no nosso país, duas realidades de sinal contrário. Uma delas, marcada positivamente pelo crescimento económico e aumentos da produtividade e dos lucros, pela baixa das taxas de juro e da inflação e, também, por um conjunto de acontecimentos e realizações de grande relevo e impacto mediático, com projecção dentro e fora do País, como é o caso da Expo e outros acontecimentos políticos.

«Olhando apenas esta realidade, devíamos concluir que estamos no bom caminho, que todos devíamos estar felizes e contentes.

«Há, porém, uma outra realidade que infelizmente não acompanha esta euforia. É aquela que atinge a grande maioria dos trabalhadores. Continuamos a ter um elevado número de desempregados, à volta do meio milhão. O trabalho precário é muito e continua a crescer. Não melhora significativamente a qualidade do emprego. Mantêm-se os baixos salários e temos os mais elevados horários de trabalho da UE. Muitas reestruturações de empresas estão por fazer, ameaçando o emprego. As reformas estruturais anunciadas e prometidas estão por fazer ou estão mal iniciadas, como a da Segurança Social. Aumentam os desequilíbrios da repartição do rendimento e as desigualdades sociais.

«A CGTP-IN tem denunciado a dualidade destas realidades e afirmado que os trabalhadores têm direito a usufruir da melhoria da situação económica.

«Os trabalhadores têm interiorizado este apelo da CGTP com coragem, confiança e muita determinação, conseguindo resultados pontuais significativos, e comprovando, assim, o sempre renovado ensinamento da acção sindical de que vale a pena lutar

(...)
«Em nome do Tratado de Maastricht e muito por via do excesso de zelo dos governos (do PSD primeiro e do PS agora), na aplicação dos critérios de convergência nominal, a agricultura, as pescas e os sectores tradicionais da indústria estão em crise, um valiosíssimo património do Estado foi vendido ao desbarato, muitos empregos ficaram por criar e são defraudadas muitas expectativas, quando tínhamos direito a melhor protecção social, melhor ensino e melhor saúde.

«Não nos venham agora exigir ainda mais sacrifícios, em nome de "pactos de estabilidade", do abaixamento da dívida pública ou de incógnitos futuros longínquos nunca confirmados.

«É tempo de convergência real. É tempo dos sacrifícios feitos serem recompensados. A riqueza tem de ser melhor distribuída.

«Precisamos de colocar a riqueza do País ao serviço das necessidades do povo, ao serviço da saúde, da segurança social, do ensino, da criação de emprego e da melhor retribuição do trabalho.»

(Da intervenção de Carvalho da Silva em Lisboa)

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Linhas de intervenção
para os próximos meses

Nas comemorações do Dia do Trabalhador, a CGTP voltou a afirmar que «a força do movimento sindical e a perspectiva de resolução dos problemas dos trabalhadores passam, cada vez mais, por uma prática de solidariedade e desenvolvimento da unidade na acção, em cada empresa e serviço, dentro de cada país e no plano internacional».

«Maio tem que ser um mês de muitas reivindicações, lutas e manifestações, que unam os esforços de todos os que nas empresas, sectores e regiões lutam pelos seus direitos e justas reclamações», salientou Carvalho da Silva, ao apresentar as linhas de intervenção do movimento sindical unitário para os próximos tempos.
A CGTP tem pronta para discussão uma proposta sobre a reforma da Segurança Social; no dia 6 de Junho vai realizar uma conferência para sua apreciação final e aprovação.
A central considerou como um escândalo o adiamento da reforma fiscal, anunciado em declarações de governantes, e reafirmou que vai continuar a exigir a redução da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho e o seu aumento sobre a especulação financeira, sobre o luxo e a riqueza.
Outro objectivo de luta sindical vai ser um serviço nacional de saúde de qualidade e mais acessível, com a aplicação do princípio da gratuitidade tendencial do sistema. Opondo-se à privatização, a CGTP reafirma que a assistência e o tratamento da doença não podem ser feitos segundo a lógica do lucro.
No ensino, a Inter exige uma escola de qualidade, serviços sociais dignos e combate à discriminação social gerada pelo conceito de escolas de primeira e escolas de segunda. Reclama medidas urgentes para apoiar o ensino pré-escolar e o ensino básico.
A central vai empenhar-se numa reflexão profunda, em consciência, e uma intervenção forte no referendo sobre o aborto, contribuindo para impedir e anular as concepções retrógradas e para viabilizar as leis que garantem o direito à vida com dignidade.
Não se irá alher, igulamente, do referendo sobre a regionalização, dado o seu impacto nas opções do desenvolvimento regional.


Por vida melhor

Reafirmando o direito e a possibilidade real de os trabalhadores viverem melhor, o coordenador da CGTP reclamou que a riqueza, criada com o crescimento económico e o aumento da produtividade, reverta para o aumento dos salários e das pensões, para o apoio aos desempregados e para a criação de emprego.
Assim, a CGTP vai bater-se por aumentos salariais que aproximem progressivamente os salários dos trabalhadores portugueses da média dos salários europeus; pela concretização imediata da reivindicação de 61 mil escudos para o salário mínimo nacional; por um aumento intercalar das pensões mínimas de reforma, no valor de 2 mil escudos; pelo prolongamento do subsídio de desemprego para os desempregados de longa duração com mais de 50 anos.
Vai ainda exigir o respeito pelos direitos dos trabalhadores e pela negociação colectiva nas empresas e aos outros níveis, como «condições-chave para que a economia portuguesa possa fazer face com êxito aos desafios do presente e do futuro e contribuir para valorizar e dignificar o trabalho».


Que não passem
de ante-projectos

Para a CGTP, «não são inevitáveis as opções económicas geradoras do desemprego, da precariedade e desregulamentação do trabalho», como as contidas nas propostas mais recentes do Governo para a área laboral, as quais Carvalho da Silva desejou «que não passem de ante-projectos», afirmando a determinação de mobilizar os trabalhadores para que as modificações pretendidas não ganhem força de lei.
A alteração pretendida do regime de trabalho a tempo parcial, tal como está apresentada, «é inaceitável, porque assenta na filosofia da chamada partilha do emprego com redução do salário», correspondendo à «reclamação, pura e simples, de dirigentes da CIP e do patronato mais retrógrado».
Tal proposta, considerou o coordenador da Inter no comício de Lisboa, visa pôr em causa o que há de essencial no emprego e «pretende instituir uma panóplia de benesses e incentivos financeiros aos empresários que admitam trabalhadores a tempo parcial, nomeadamente isenção de descontos para a Segurança Social, descapitalizando-a», e pretende ainda, «promover a passagem de trabalhadores efectivos a tempo completo para tempo parcial, criando uma precarização generalizada».
Antes de mais, a CGTP exige que seja combatido o falso trabalho a tempo parcial, extremamente mal pago, que abrange «dezenas e dezenas de milhar de jovens» nas grandes cadeias de supermercados, na banca, nos seguros e noutras empresas e serviços, e «regulamentar, através da contratação colectiva, este tipo de trabalho, garantindo o seu carácter voluntário e reversível para os trabalhadores que por ele optarem».
Quanto à retribuição do trabalho, o Governo pretende «alterar o seu conceito, subtraindo do seu âmbito determinadas prestações, tais como os prémios de produtividade e de assiduidade, o que se traduziria, na prática, numa diminuição salarial e numa retirada de direitos», com redução da base de cálculo para os subsídios de natal, de férias, de pagamento de feriados, folgas e para as prestações sociais.
A CGTP previne Governo e patrões que «não se iludam», pois «terão os trabalhadores mobilizados contra estas pretensões e outras já anunciadas, como as relativas ao regime de férias, alargamento do período dos contratos a prazo, trabalho nocturno, contrato de trabalho individualizado na Administração Pública».
Carvalho da Silva alertou para o facto de o Governo se preparar para servir as propostas de alteração da legislação laboral «em fatias, entremeadas de doce/amargo, e, se nos distrairmos, o que nos é servido é um pacote de veneno». Em contrapartida, o dirigente da Intersindical Nacional exigiu «que as leis existentes e os contratos colectivos sejam cumpridos, completando-se com regulamentação áreas que estejam desprotegidas, a fim de que não exista qualquer forma de prestação de trabalho que se situe à margem da necessária protecção legal».

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Interjovem exige
legalidade e salários justos

A organização de juventude da CGTP exige a melhoria dos salários reais, de acordo com as qualificações profissionais e as habilitações escolares. Na intervenção feita no 1º de Maio em Lisboa, Rui Silva reclamou ainda a inscrição na Segurança Social de todos os jovens que ingressam no mercado de trabalho e a intervenção eficaz da Inspecção do Trabalho na reposição da legalidade laboral nas empresas.
O dirigente da Interjovem - que falou antes de Adébora Silva, participante brasileira da Marcha Global contra o trabalho infantil (ver págs. 21 e 21), e do coordenador da CGTP - começou por saudar os estudantes e a sua luta pela acção social escolar, contra as propinas, pela dignificação do ensino e por medidas que permitam a inserção no mercado de trabalho. Afirmando que «não é rasca uma geração que luta assim», Rui Silva dirigiu também uma saudação aos jovens trabalhadores e ao seu importante contributo para as lutas em várias empresas e sectores.

A Interjovem declarou-se disponível para continuar a intervir nas movimentações laborais, designadamente contra a precariedade, os baixos salários e os horários excessivos, e contra a anunciada ofensiva do Governo tendente a alterar a legislação do trabalho.

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Manifestação no Porto

Uma grande manifestação, com participação combativa de trabalhadores de muitas empresas, designadamente dos sectores de serviços, comércio, Administração Pública, ensino e banca, bem como dos jovens da Interjovem, assinalou o 1º de Maio no Porto.
Foi recebida com especial calor a mensagem de uma criança brasileira, participante na Marcha Global contra o trabalho infantil.
Na intervenção de fundo do coordenador da União dos Sindicatos do Porto foram particularmente criticadas as medidas políticas que o Governo inclui nas grandes reformas e que consubstanciam os compromissos com o patronato (como a entrega, ao capital privado, de empresas e da gestão de património e serviços públicos rentáveis; a redução de impostos e a concessão de outros benfícios às emrpesas, sem contrapartida de real criação de emprego; a revogação ou enfraquecimento de direitos dos trabalhadores consagrados nos contratos colectivos de trabalho).
João Torres repudiou as propostas legislativas que o Governo se propõe aprovar até Junho, acusando o executivo de António Guterres de ceder às pretensões da CIP. Contra tais objectivos, «uma resposta combativa e crescente dos trabalhadores tem inevitavelmente que ser ouvida e tida em conta pelo patronato e pelo Governo», exigiu, e «o Governo PS terá de abandonar os compromissos de retrocesso que estabeleceu com o patronato e procurar compromissos de progresso com os trabalhadores».
Na resolução aprovada refere-se a realização de uma sessão pública, no dia 28 de Maio, e uma concentração, no dia 20 de Junho, como medidas de esclarecimento, mobilização e luta contra as propostas governamentais que se prendem com a Segurança Social.

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Festa em Bragança

As comemorações do Dia do Trabalhador em Bragança decorreram na Praça 1º de Maio/Cavaleiro Ferreira, onde de manhã houve música de intervenção e onde actuou, de tarde, o grupo de música popular portuguesa «Sete Mares».

No decorrer do espectáculo, refere uma nota da União dos Sindicatos de Bragança, David Garrido realçou as «raízes profundas do 1º de Maio na luta por um mundo melhor, isento de exploração e opressão». O dirigente da USB e do Sindicato Nacional de Telecomunicações e Audiovisual criticou o Governo do PS «pelos seus compromissos pelo patronato» e repudiou «também energicamente a demagogia populista de Marcelo e Portas».

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Desfile em Guimarães

«Milhares de operários, intelectuais, empregados, desempregados, reformados, mulheres e jovens desfilaram pelas ruas da cidade de Guimarães» no dia 1 de Maio, informou a União dos Sindicatos do Distrito de Braga. O desfile partiu do Jardim da Alameda, onde actuaram «Os Boémios» e interveio o coordenador da USB, Adão Mendes.
No final do desfile, que regressou ao Jardim da Alameda depois de percorrer as ruas de Santo António, de Gil Vicente e de Paio Galvão, foi aprovada por unanimidade e aclamação uma moção expressando «total solidariedade e disponibilidade» para futuras formas de luta contra as tentativas do Governo de alterar a legislação laboral e em defesa dos interesses e direitos dos trabalhadores. Ainda em Maio, terá lugar um plenário distrital «para debater toda a ofensiva contra a Segurança Social e decidir formas de luta», refere a nota divulgada pela USB.


«Avante!» Nº 1275 - 7.Maio.98