Para um
trabalho com esperança
O trabalho é um muito antigo irmão nosso. As longas gerações de trabalhadores que continuam connosco as épocas e a história, podem testemunhá-lo. Com o trabalho crescemos e com ele tomámos a consciência de ser homens. Ensinou-nos o sentido da necessidade, mas também o da igualdade de esforços e deveres. Na sua longa evolução foi fonte de progresso no despertar de verdades, que marcaram a História da humanidade. De livre e amigo passou a escravo e triste; foi capturado depois por formas de tempo assalariado impostas pelos que dele se apoderaram.
Valorizar o trabalho - é tema da campanha
oportunamente lançada na passada semana pelo PCP, em defesa dos
direitos dos trabalhadores.
Oportunamente - porque o Governo está a preparar nova ofensiva
integrada na campanha de longo fôlego que, em Portugal como em
todo o mundo, o grande capital tem vindo a intensificar contra o
mundo do trabalho.
A desvalorização do trabalho tem sido, nessa campanha do grande
capital, uma cobertura ideológica metodicamente seguida. E uma
das facetas dessa desvalorização é a insidiosa apresentação
do «fim do trabalho» como uma característica da sociedade
moderna. Dizia recentemente o Ministro da Agricultura que, em
breve, 5% da população activa bastará ou sobrará para a
produção agrícola. E Deus Pinheiro, do alto do seu cargo de
Comissário Europeu, sentenciou há tempos que menos de 15% da
população activa bastariam, nos inícios do próximo milénio,
para assegurar a produção industrial. Desta forma quer o
capital usurpar perversamente em seu proveito exclusivo os
imensos ganhos de produtividade possibilitados pelo
desenvolvimento técnico-científico para o bem estar geral e o
progresso de toda a humanidade. Segundo tais planos do grande
capital, 80% dos potenciais trabalhadores ver-se-iam assim
despojados do próprio valor da sua capacidade de trabalho,
escravizados pela concorrência feroz de um mercado de trabalho
que a desregulamentação entregaria às mais selvagens
condições de exploração.
Tais são as perspectivas quando «concorrência» e
«competitividade» são as palavras chave e quando quem toma as
decisões são capitalistas para quem a redução dos custos de
mão d'obra é um dogma e os direitos dos trabalhadores são
pretensão subversiva.
No mundo de hoje, a distribuição e
retribuição do trabalho torna-se cada vez mais desigual. Não
é por acaso que o grande capital se exporta, apátrida, para
países onde melhor e mais rapidamente pode explorar.
«Mundialização» e «globalização da economia» tornam-se
assim processos de nivelamento por baixo do valor do trabalho.
Mas o que se impõe não é entregar os mais desfavorecidos aos
apetites da exploração, mas sim defender as garantias sociais
obtidas ao preço de duras lutas, e alargá-las a todos os
habitantes da Terra.
Então sim, os produtos do trabalho jorrarão num caudal de bens
e serviços que encontrarão consumidores desejosos e aptos a
deles justamente beneficiarem.
Uma célebre escritora indiana afirmou que «trabalho sem esperança é como néctar numa peneira». Não vamos permitir que o néctar, que é nosso, escorra na peneira, deixando-nos sem esperança e de mãos vazias. Aurélio Santos