PCP interpela Governo
Por mais e melhor Segurança Social


O Grupo Parlamentar do PCP apresentará muito em breve o seu próprio projecto de Lei de Bases da Segurança Social. Anunciada ontem no decorrer da interpelação do PCP ao Governo sobre a situação da Segurança Social, esta iniciativa dos deputados comunistas insere-se na perspectiva por si defendida de uma reforma do sistema que o prepare para o futuro.

Tais alterações, do seu ponto de vista, não podem visar a desresponsabilização do Estado nem ser feitas a pensar nos mercados financeiros, mas, pelo contrário, a pensar num sistema público mais solidário, financeiramente sustentado e que assegure o bem estar dos portugueses.
Do que se trata, como salientou ao "Avante!" o deputado Lino de Carvalho em declarações proferidas terça-feira, na véspera da interpelação, é de assegurar um sistema público, "tanto aos jovens que hoje entram no mercado de trabalho, como à população activa, aos pensionistas e reformados", que garanta "melhores prestações sociais e mais dignas pensões de reforma aos trabalhadores portugueses".


Questão crucial

Estas foram, de resto, questões que estiveram em primeiro plano na interpelação ao Governo ontem realizada na Assembleia da República. A justificá-la, como observou Lino de Carvalho, estão preocupações antigas do PCP quanto à Segurança Social. Preocupações que não são de hoje, bastando recordar as conclusões do Encontro Nacional por si promovido em 1996 em que se declarou a necessidade de uma reforma democrática da Segurança Social. Foi então dito que esta era uma questão que estava no centro do debate político e ideológico e que assumia uma crucial importância para o futuro da nossa sociedade.
O tema tem hoje acrescida importância devido ao facto de o Governo ter apresentado um documento com os princípios orientadores da reforma da Segurança Social, no qual, como faz notar o parlamentar comunista, se inscreve "uma clara opção por um caminho de fragilização e enfraquecimento do sistema público da Segurança Social, que é um património erguido pelos trabalhadores portugueses ao longo de sucessivas gerações".


Cenário da ruptura

Para Lino de Carvalho resulta assim claro que o Governo vem "juntar a sua voz à voz dos mercados financeiros e das seguradoras com vista a abrir caminho à privatização de parte do sistema, visando a generalização dos sistemas privados de segurança social, privilegiando as sociedades gestoras de fundos de pensões".
É isso que, no essencial, sustenta a principal tese do Governo - tese do plafonamento -, invocando para o efeito cenários de longo prazo de ruptura financeira do sistema.
"Ora, até há pouco tempo, tanto os mercados financeiros como o Governo diziam que o sistema estava na falência. O PCP, pelo contrário, nunca acompanhou essa tese catrastofista que visava criar um falso alarmismo que justificasse a opção por abrir caminho para as sociedades gestoras de fundos de pensões", lembra Lino de Carvalho.

Com efeito, todos os estudos mais recentemente realizados, incluíndo os estudos realizados no âmbito da Comissão do Livro Branco, demonstram que o sistema está longe de estar em ruptura. Bem pelo contrário. Os saldos do regime geral contributivo - aquele que é suportado pelos contribuintes com base nos salários - tem vindo a apresentar uma tendência crescentemente positiva.

Lino de Carvalho recorda a este propósito que o volume global acumulado de saldos positivos gerados pelo regime geral entre 1987 e 1997 é de cerca de dois mil milhõess de contos. "O que significa - salienta - que o sistema não está em falência nem em ruptura. O que tem acontecido é que o regime geral tem vindo a ser chamado a outros encargos que não lhe competiam, que deveriam ser financiados pelo Orçamento do Estado e nos termos da Lei de Bases da Segurança Social. Calcula-se que hoje o valor acumulado da dívida do Estado à Segurança Social ascenda também a cerca de dois mil milhões de contos".


Lógica do mercado

Assim sendo, desmentida a tese da ruptura no imediato ou a curto prazo, vem o Governo dizer que a longo prazo - daqui a 40 anos - então, sim, o sistema entrará em ruptura, havendo, por isso, diz, que prever futuro. É alias aqui que entra a tese do plafonamento.

Sucede, porém, que nenhuma das projecções apresentadas pelo Governo e pela Comissão do Livro Branco diz ser este o único cenário possível. A verdade é que há outros cenários mais favoráveis ao sistema que levam em conta a ponderação de variáveis como, por exemplo, o crescimento do produto, do emprego ou o crescimento demográfico.
"Ora o Governo optou pela hipótese mais pessimista, que lhe dava mais geito para a defesa da sua teses, escondendo outros cenários", acusa o parlamentar do PCP, para quem o cenário escolhido - o quadro dentro de 40 anos - tem como única função instrumental justificar a opção do Governo.
Trata-se, no fundo, de "abrir caminho para que o sistema público se limite a ter um carácter assistencialista, destinado aos mais pobres, orientado-se o sistema privado para os mais ricos", sustenta Lino de Carvalho, que considera estar posta em causa "a universalidade do sistema e o princípio da solidariedade que é inerente aos sistemas de segurança social".
Em resumo, o que tudo isto significa é que prevalece a lógica dos mercados financeiros em vez da lógica da solidariedade. O que é "tanto mais chocante", como observa Lino de Carvalho, quanto é certo que o Governo não apresenta nenhuma solução para acabar num período razoável com o nível baixíssimo das prestações sociais, sem dúvida a questão central da Segurança Social.
"Tanto mais chocante quanto é certo que 70 por cento dos pensionistas de invalidez e velhice recebem pensões iguais ou inferiores a 31.300 escudos ou ainda que 550 mil pensionistas do regime especial agrícola só recebem 21.300 escudos. Ou ainda o facto de 150 mil do regime não contributivo só terem 22.199 escudos de pensão", diz Lino de Carvalho, que acusa ainda o Governo de "não abordar de maneira séria a questão do financiamento da Segurança Social".
O Governo, por outro lado, não apresentou nenhuma proposta no sentido do reforço das despesas do Estado com a protecção social, quando se sabe que o Estado português é actualmente o segundo Estado da União Europeia que menos gasta com a protecção social dos seus cidadãos.

No debate de ontem, sob o fogo das críticas da bancada comunista, terá igualmente estado, de acordo com as informações prestadas por Lino de Carvalho ao nosso jornal, a ausência de qualquer perspectiva de solução para o pagamento das dívidas do Estado à Segurança Social, para o combate à evasão contributiva, bem como para o alargamento da base contributiva. A bancada do PCP não aceita que o Governo nada faça nestes domínios e, simultaneamente, em sede de concertação, apresente um comjunto de projectos de lei de alteração das leis laborais em que o traço mais evidente é o do aumento dos encargos e a diminuição das receitas do sistema público da Segurança Social.

Foram estas orientações fundamentais do Governo que mereceram ontem a rejeição do Grupo Parlamentar do PCP, demonstrando com a crítica o seu desacordo, mas também apresentando propostas para a reforma democrática da Segurança Social.

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PCP propõe
Aumento das reformas em 3000 escudos

O Grupo Parlamentar do PCP propõs um aumento extraordinário das pensões mínimas de reforma em 3.000$00. Materializada em projecto de lei entregue na Assembleia da República, na sequência de uma decisão nesse sentido recentemente aprovada nas suas Jornadas Parlamentares, esta iniciativa da bancada comunista visa contribuir para uma aproximação dos valores das pensões mínimas ao salário mínimo nacional.

Trata-se, no fundamental, com esta medida, de procurar atenuar minimamente a situação dramática com que se confrontam mais de dois milhões de pensionistas, cujas prestações sociais não chegam a atingir o salário mínimo nacional.
Pôr cobro a esta situação que classifica de "degradante" constitui, pois, um imperativo de justiça, no entender do Grupo comunista, tanto mais que, recorda, Portugal é na União Europeia o segundo país que menos gasta, em temos de PIB, com a protecção social.


«Avante!» Nº 1278 - 28.Maio.98