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Octávio Teixeira acusa
Governo confunde-se com os neo-liberais


"O Governo indiferencia-se insuficientemente e confunde-se excessivamente, por vontade própria, com os neo-liberais, os livre-cambistas, os monetaristas, quer os domésticos quer os da União Europeia".
Quem o afirma é Octávio Teixeira que alicerça a sua constatação em testemunhos do seu ponto de vista reveladores das verdadeiras motivações que presidem ao rumo do Governo PS. Aí reside, concluiu, "o busílis da questão". Foi, pois, um retrato fiel da governação actual, de onde sobressai esse indisfarçável amor pelo grande capital, aquele que o presidente do Grupo parlamentar do PCP levou ao plenário, em declaração política proferida numa das sessões da semana transacta.

O recente almoço entre António Guterres e representantes dos grandes grupos económicos deu o mote à análise de Octávio Teixeira. E o primeiro aspecto para o qual chamou a atenção foi precisamente para o significado que não pode deixar de encerrar uma tal iniciativa. "Para um Governo que se reclama de socialista - observou - é politicamente significativo que, ao mesmo tempo que no Conselho Económico e Social apresenta vários projectos de propostas de lei visando reduzir, ainda mais, os direitos dos trabalhadores, o seu Primeiro-Ministro se reuna com os grupos económicos".
Do que lá se passou só os próprios o saberão. Agora o que se sabe, isso sim, seguramente, como fez notar o líder parlamentar comunista, é que o almoço não serviu para "o Governo instar os patrões dos grupos económicos a conterem o cresceimento acelerado dos lucros e a distribuírem de forma mais justa e equitativa o produtos da riqueza criada pelos trabalhadores portugueses".
Octávio Teixeira não resistiu, aliás, a comentar as declarações do chefe do Governo à saída do almoço, quando este afirmou que «garantido o Euro, temos agora que criar as condições para que a nossa sociedade ...seja mais produtiva, tenha mais justiça e mais equidade».
Atribuindo-lhes igualmente um relevante significado político, considerou que tais afirmações vêm confirmar que o Governo, nestes dois anos e meio, "apenas se preocupou com o Euro, com os critérios nominais da união monetária" e que só agora, passado mais de metada do mandato, "promete vir a preocupar-se com a «criação de condições» para que a economia portuguesa produza mais, para que haja mais equidade na distribuição do rendimento nacional".
"Isto é - acrescentou - , só agora o Governo, pela voz do seu principal responsável, promete vir a preocupar-se com a convergência real. Desmentindo, categoricamente, o que até há pouco apregoava: que a convergência nominal estava a ser acompanhada da convergência real".

Mas não foi apenas neste plano que Octávio Teixeira apanhou o Governo em contra-mão. Para além das múltiplas promessas eleitorais por si não cumpridas, lembrado foi, por exemplo, como o «plano nacional de emprego» afinal não passa de um exercício fundamentalmente retórico, como conclui a própria Comissão Europeia. Salientada foi ainda a exigência desta mesma Comissão para que já no Orçamento de 1999 haja maior compressão nas despesas orçamentais e mais drástica redução, ou mesmo eliminação do défice orçamental. Ou seja, como sublinhou o deputado comunista, "aí temos a Comissão Europeia a querer impor, agora sem substerfúgios, que a política salarial portuguesa seja comandada pelo Banco Central Europeu e não pelo Governo português".
E qual é a atitude do Governo perante estas questões ? "Quanto a isto, que é o concreto, que é o essencial, o Governo assobia para o ar", salienta Octávio Teixeira, para quem o Primeiro-Ministro está mais atarefado em promover almoços empresariais e proceder a inaugurações, "fingindo desconhecer o que se está a passar".
Citado foi, por exemplo, o caso do ministro da Economia, que "apenas vê, ouve e se preocupa com os grupos económicos", ou o do ministro dos Negócios Estrangeiros, mais "ocupado em impedir que se saiba, cá dentro, que, lá fora, não se opõe à participação da Indonésia nas reuniões da OCDE".
Ou ainda o caso exemplar do ministro das Finanças que, embora não se saiba "por onde anda nem o que faz - só aparece quando há privatizações - , sabe-se bem o que não faz".
"Não faz publicar a legislação prometida para que o Tribunal de Contas possa cumprir eficazmente e em tempo útil os seus deveres de fiscalização da gestão dos dinheiros públicos", exemplificou Octávio Teixeira, como "não faz esclarecimento público sobre o Euro", "nem faz qualquer reforma do sistema fiscal".


«Avante!» Nº 1278 - 28.Maio.98