Carlos Carvalhas na Assembleia do Sector Intelectual da ORL
Um importante contributo para todo o Partido


Realizada no passado sábado, no Fórum Lisboa (antigo cinema Roma), a 3ª Assembleia do Sector Intelectual da ORL reflectiu a intensa actividade dos últimos três anos, definiu as linhas fundamentais de intervenção dos intelectuais comunistas nos planos social, político, ideológico e cultura, com vista ao reforço do PCP.
Durante os trabalhos, em que participaram Carlos Carvalhas, secretário-geral do PCP, e António Andrez, membro da Comissão Política, foi eleita a nova direcção do Sector, composta por 63 camaradas, onde se destacam mais de duas dezenas de jovens com idades entre os 20 e os 30 anos. Os delegados aprovaram ainda uma resolução política cujo conteúdo principal foi tratado no número anterior do nosso jornal.
Em próximas edições contamos publicar algumas das muitas intervenções ali produzidas.

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Intervindo nos trabalhos da 3ª Assembleia do Sector Intelectual de Lisboa do PCP, Carlos Carvalhas considerou que o balanço político do trabalho realizado e o debate sobre as grandes orientações estratégicas «são importantes contributos para a iniciativa e a reflexão de todo o colectivo partidário». No seu discurso, de que a seguir transcrevemos os principais extractos, o secretário-geral do PCP afirmou:


«Penso também que são de grande importância, para se concretizar o "novo impulso" na organização, intervenção e afirmação política do nosso Partido, as orientações que definiram para uma maior participação na luta política das ideias; para o desenvolvimento da luta social e a dinamização de movimentos e organizações intelectuais; para uma intervenção decisiva nas Universidades e para o reforço da organização e a influência do PCP entre os intelectuais.

Mas para que esse reforço se verifique e tal como se afirma na "Declaração" desta Assembleia, "o PCP, cuja identidade histórica, sócio-política e Cultural, passa justamente também pela integração de intelectuais, precisa da elevação do contributo dos seus intelectuais, enquanto intelectuais, para a construção colectiva das suas respostas aos problemas do país, para a configuração do seu projecto de esquerda e de alternativa democrática e revolucionária. O Partido, todos nós, precisamos de elevar e agilizar as nossas formas de trabalho com os intelectuais comunistas e com todos aqueles outros que estão ou podem vir a estar connosco, ou a convergir connosco".

De facto, como vocês afirmam, nós "Não somos um partido de propagandistas ou de pregadores, somos um Partido que organiza e ajuda a organizar, um Partido que trabalha, que luta e projecta uma sociedade mais livre, mais justa e mais fraterna, o socialismo. Um Partido que transporta consigo um inquebrantável e renovado compromisso de luta por grandes causas, que vêm de muito longe na história, que se reconfiguram e confluem com novas aspirações".

E esta luta encontra hoje pela frente uma grande ofensiva ideológica e uma grande ofensiva contra os salários e direitos dos trabalhadores.

Como se afirma no projecto da Resolução Política deste sector " o mercado capitalista, e mais genérica e efectivamente o sistema capitalista, são apresentados como uma fatalidade natural, como o estádio final da evolução social, ou o máximo da racionalidade na organização social do viver humano. Ganha assim uma renovada urgência a reactualização da crítica de Marx aos efeitos de naturalização (e de legitimação política, ideológica e teórica) do capitalismo pela economia política burguesa. A legitimação totalitária do capitalismo pelo neo-liberalismo representa, de facto, uma redução da razão humana e da racionalidade social; busca impedir o questionamento sobre o primado da maximização do lucro; esconde o carácter estrutural da polarização da riqueza e da pobreza; bloqueia a formação das perguntas e a elaboração das respostas sobre os valores projectados e as finalidades da acção humana; procura limitar de forma intolerável a capacidade de os agentes humanos, agindo em determinadas condições históricas, transformarem essas próprias condições e as suas formas sociais de vida".


Nada mais que o mercado

Na verdade, os resultados das leis cegas e incontroláveis do mercado e da mundialização estão à vista.

E no entanto sabe-se, por exemplo, que as somas monetárias resultantes da aplicação da conhecida taxa Tobin às transacções de capitais dariam para resolver as principais carências básicas das populações carenciadas do Terceiro Mundo, e que, com apenas 3% dos 800 mil milhões de dólares investidos actualmente em despesas militares, se resolveria o acesso universal aos serviços essenciais de saúde que é de 25 mil de milhões de dólares por ano, segundo as estimativas das Nações Unidas.

Vivemos numa época em que se verificam grandes avanços científicos e técnicos, que não são acompanhados pelo progresso social de milhões e milhões de seres humanos. Pelo contrário, assistimos até a regressões sociais e à ofensiva contra conquistas e direitos que muitos julgavam irreversíveis.

Olhando então para a evolução do mundo, para estas realidades e para a hipocrisia daqueles que criticam estas situações, mas que omitem ou são coniventes com as causas é fácil compreender o porquê de ser-se comunista hoje. O porquê da actualidade e da validade do projecto de construção de uma nova sociedade e da necessidade, mais do que nunca, da existência de Partidos Comunistas que com ou sem esta designação lutem pela libertação do ser humano da exploração, da opressão e da alienação. E tudo isto tendo em conta, por um lado, as graves responsabilidades históricas da social democracia, os seus fracassos e a sua política actual, que no essencial tem adoptado as medidas e as orientações neoliberais, embora com uma retórica diferente. E, por outro lado, os erros, tragédias e derrotas verificadas na construção da sociedade socialista, que a desprestigiou (mesmo no plano ambiental como aqui referiu o Carlos Moura) e lhe retirou poder de atracção ao ideal comunista.

Mas para melhor compreendermos a situação actual creio que devemos prestar uma maior atenção ao percurso da ofensiva ideológica e às suas consequências.


"Duas grandes armadilhas"

Nos ultimos 25 anos, foi tecido no plano ideológico e prático duas grandes armadilhas, embora de natureza diferente: "a armadilha da dívida externa" já muito tratada e que foi inclusivamente, título de um interessante livro e a armadilha da "mundialização" ou globalização, segundo a cultura anglo-saxónica.

A armadilha da dívida externa funcionou pela atracção exercida pela oferta de capitais a juros baixos e a taxas cambiais favoráveis o que levou muitos países a contraírem elevadas dívidas. Mas como são os países credores que determinam e que podem mudar as condições e a sua política monetária e cambial, aquelas evoluíram para taxas de juro elevadas e taxas de câmbio desfavoráveis o que aliado à troca desigual inflacionou monstruosamente a dívida que se traduziu num garrote para muitos países que ficaram dependentes da tutela permanente do FMI e sem saídas e que ainda hoje são constrangimentos pesados a qualquer tentativa de desenvolvimento. De tal maneira, que os pagamentos dos serviços de dívida exigidos pelos credores são de longe superiores à chamada ajuda internacional e aos novos empréstimos.

Como já alguém disse, é o mundo virado ao contrário. As nações mais desmunidas fornecem "ajuda" aos mais ricos através da "transferência líquida de recursos", financiando o investimento e o crescimento do "Norte" em detrimento do "Sul".

Quanto à "globalização" partindo-se de factos reais, do desenvolvimento das tecnologias da informação e de que, nos mais diversos pontos do planeta encontramos os mesmos anúncios, a mesma moda, os mesmos produtos, as mesmas séries de televisão, os mesmos automóveis, bem como a presença de multinacionais mastodontes, com peso económico e financeiro superior ao de muitos países, passou-se à difusão da ideia que o papel dos Estados e das nações na defesa dos povos é praticamente nulo. E daqui passou-se à argumentação de que são necessárias instituições supranacionais de carácter político para regulamentarem as manifestações da economia global. Sem se deixar de ter em conta as limitações hoje impostas aos Estados e sem se menosprezar a importância que estas instâncias podiam e podem vir a ter, a verdade é que na actual correlação de forças e tal como funcionam elas são em geral dominadas pelo grande capital internacional, pelas grandes potências, como acontece na União Europeia. Distantes dos povos, sem controlo democrático efectivo, estas instituições, como é o caso da Comissão e do Conselho da União Europeia, actuam e pressionam não no sentido da cooperação e da coesão económica e social, mas no sentido da desregulamentação e da liberalização.

As grandes potências e o grande capital internacional fizeram uma grande pressão para a liberdade de circulação de capitais, para a liberdade do comércio, tudo em nome do desenvolvimento e da criação de empregos, para depois virem mostrar que o papel dos Estados numa economia global é cada vez menor porque não controlam os fluxos de dinheiro, da informação e das mercadorias. E partindo desta constatação, defendem muitas vezes com ardilosa argumentação, na prática, ainda mais desregulamentação e menores poderes dos Estados como é o caso do famoso Acordo Multilateral de Investimentos (AMI), para depois através de instâncias supranacionais imporem aos trabalhadores e aos povos, mais submissão e exploração. É o ciclo da dominação. (...)

(...) A concentração da riqueza acentuou-se fortemente. A desregulamentação em grande escala permite aos fluxos de capitais deslocarem-se à velocidade da luz permitindo fantásticos ganhos especulativos, à custa dos povos. Foi a aceleração da chamada economia de casino. Depois da ofensiva neoliberal destes últimos dezoito anos, é já hoje mais claro para muitos a quem tem servido e a quem serve o neoliberalismo.

Confrontados com as crises e com os colapsos bolsistas muitos são os que hoje se interrogam sobre os prometidos efeitos positivos desta política de adaptação à "economia global", quer nos países mais frágeis economicamente, quer nos países mais desenvolvidos. (...)


FMI - instrumento do imperialismo

O FMI, guardião dos interesses dos credores continua a oferecer o "bastão e a cenoura" e a teorizar sobre a excelência das medidas que preconiza.

Mas não se conhece um único caso em que os ditos programas de "ajuntamento estrutural" do FMI tenham tido algum sucesso brilhante. No entanto estes programas denominados pudicamente por "ajustamentos" continuam a ser apresentados como a melhor maneira de melhorar o nível de vida das populações. Os dogmas monetaristas, a ortodoxia neoliberal e a propaganda continuam a esconder os mecanismos que engendram a pobreza e a miséria. Servindo os grandes interesses, o alto clero da religião liberal, solidamente ancorado nos seus dogmas, apesar de contrariado pela dura realidade continua a proclamar que não há alternativa, que não há outra política. Mas há. O pensamento dominante é o das classes dominantes, aquilo a que se denomina de "pensamento único". As "Bíblias" e as fórmulas neoliberais são retomadas pelos mais variados escribas, universidades e grande imprensa, como se estivéssemos perante uma verdade indiscutível e cristalina, enquanto a acumulação se processa e os povos se afundam na miséria.

E apesar do "modelo" liberal estar desacreditado não quer dizer que a ofensiva ideológica tenha diminuído e que os grandes senhores do dinheiro desistam da sua sede de "mais lucro e mais poder".

Mas também por toda a parte surge a resistência e a luta dos povos! De Chiapas a Timor, os povos e os trabalhadores organizam-se e lutam e obtém recuos e vitórias. Greves, greves gerais, levantamentos em armas, manifestações, protestos e protestos mundiais como o ilustra a marcha mundial contra o trabalho infantil. (...)

A liberalização em todos os pontos do globo é acompanhada de uma fantástica concentração e centralização de capitais com as múltiplas reestruturações e os múltiplos escândalos e a corrupção a partir do aparelho de Estado deixou de ser um fenómeno que era atribuído displicentemente ao Terceiro Mundo.

Partindo-se de factos objectivos, procura-se fazer crer que a única saída está na desregulamentação e na idolatria da competição.

Diminuir os "custos do trabalho", "desregulamentar", "flexibilizar" e melhorar a "excelência de produtos" e a "competição" são pois as frases chave para o êxito e a modernidade.

Como competir na economia global? Esta é uma questão central que é colocada aos governos, aos empresários, aos sindicatos, aos trabalhadores. E colocado assim o problema, na sua forma esquemática, a resposta vem depois: é necessário desregulamentar, flexibilizar, diminuir os salários, num mundo cada vez mais aberto e competitivo. Se o não fizermos dizem, teremos o encerramento de empresas e com elas o desemprego, pelo que o dilema é: assalariados, ou aceitam trabalhar mais e ganhar menos e com menos direitos ou então teremos ainda mais desemprego. A desregulamentação, a flexibilização e a diminuição dos salários reais vai-se processando Mas em vez de emprego temos é aumento de desemprego e de emprego precário e sem direitos, como aqui foi relatado também, entre outros pelo Agostinho Santos Silva, o Rui Pereira, a Marta de Sousa.

A competitividade é assim difundida como a lei da selva, como estratégia militar, como ideologia de guerra, como a necessidade de aniquilar o outro, antes que ele nos aniquile e sem qualquer respeito pelo ambiente.

Mas tudo isto que se vai arquitectando nos gabinetes, pelos tecnocratas e burocratas bem pagos, tem encontrado e estamos convictos que vai continuar a encontrar a resistência dos trabalhadores e dos povos e vai mostrando a falência das soluções e a quem servem. É uma mundialização contra o desenvolvimento humano, contra o ser humano, contra os direitos do homem, contra a democracia, como aqui salientaram entre outros o Francisco Silva e o André Barata. As novas tecnologias que poderiam favorecer o desenvolvimento humano servem de instrumento para a especulação, ao armamentismo, e servem de vectores à guerra financeira entre as multinacionais dos três grandes pólos mundiais.


As crises

E é neste quadro que se produzem as crises e as crises financeiras que têm uma repercussão no aparelho produtivo mais distanciado temporalmente do que no passado devido às somas brutais que estão ligadas puramente às actividades especulativas.

Lembremos o caso do México, que é paradigmático, agora que se vive a "crise asiática" e que o é também pelos acontecimentos de Chiapas e sua evolução.

Em 1982, Ronald Reagan interrompia as suas férias porque o México tinha entrado em cessação de pagamentos e, como o Banco Continental Illionois, estava ameaçado de falência, o Presidente dos EUA, campeão do liberalismo, nacionalizava o sétimo banco do país...

Era mais uma prova das tretas do chamado "Estado mínimo". O "Estado mínimo" quando se trata de deixar áreas rentáveis ao negocismo (como aqui referiu em relação ao ensino, o Rui Namorado Rosa e o Paulo Sucena) ou quando se trata de os grandes senhores do dinheiro esmagarem o mais fraco e o Estado máximo e intervencionista quando é necessário a "ajuda em seu favor" em todos os sectores, mesmo no cultural. Como nos exemplificou aqui em relação ao património entre outros o Vítor Serrão e o Pessoa; em relação à Expo 98, o Mário Moreira, o António Abreu, o Modesto Navarro e a Helena Serôdio sobre o teatro e outros.

Com grande pompa e circunstância anos depois a Assembleia Geral do FMI reunia em Madrid em Setembro de 1994 e apresentou o México como um "modelo" para o Terceiro Mundo graças à aplicação das receitas liberais: privatizações, despedimento de funcionários públicos, abertura do seu mercado interno, liquidação de uma parte da sua dívida contra o património mineiro do País. Só o Chile de Pinochet, aplicando o programa dos "boys" de Chicago de Milton Friedman, tinha ido tão longe.

Mas umas semanas mais tarde o exemplo citado em Madrid, caía no ridículo. O México declarava de novo, que não podia pagar os compromissos da dívida, o peso era desvalorizado em cerca de 60%, a Banca dos EUA entrava em pânico e o país devedor era submetido à vigilância económica e a severas e humilhantes condições para receber uma nova "ajuda", uma nova intervenção em contrapartida dos seus rendimentos petrolíferos..

O sistema com todas as fragilidades e a própria fragilidade do sistema financeiro internacional, como se viu agora com a crise asiática, continua com as suas contradições a produzir os seus resultados - polarização da riqueza e da pobreza - pese embora, as palavras pias que aqui e ali, em tal ou tal instituição internacional, ou cimeira mundial, vão ficando para alimentar uma esperança rapidamente contrariada pelos factos. Ainda em Março de 1995 os 184 países reunidos em Copenhaga sob a égide da ONU, na Cimeira Mundial para o desenvolvimento social tomava "o cumprimento solene" de trabalhar pelo "desenvolvimento social no mundo inteiro". É o que se tem visto.

A crise asiática é outro exemplo claro de um crescimento económico assente em pés de barro. Os tigres asiáticos que nos eram apresentados como modelos, afinal não passam de gatinhos de estimação das transnacionais. E qual foi o remédio para a crise? Os serviços financeiros serão liberalizados em setenta países a partir de 1999, em virtude de um acordo designado por histórico no quadro da OMC. Os países asiáticos que recusavam abrir totalmente o seu mercado interior, acabaram por ceder às pressões americanas. Paradoxalmente a sua crise financeira ligada em boa parte a uma liberalização financeira muito rápida, constrangiu-os a aceitar ainda mais abertura... E isto apesar do economista chefe do banco mundial, Joseph Stiglitz ter declarado recentemente em Manila que "a crise não se teria dado se não tivesse havido uma liberalização das operações de capital nas suas economias ".

Mas é uma evidência que com a crise importantes e rentáveis empresas desta zona do globo estão agora à mercê do apetite do grande capital nomeadamente americano e alemão.

A "armadilha" da mundialização assentando em factos objectivos visa assim incutir aos povos duas grandes ideias: a primeira é que os Estados só podem resistir ao capital transnacional e à mundialização ou globalização através da submissão a instituições internacionais que com se sabe na fase actual da correlação de forças são elas próprias dominadas pelo grande capital e pelas grandes potências, acelerando assim a dominação global.

A segunda é que num mundo global, numa concorrência mundial só ganha quem mais desmantelar, flexibilizar, desregulamentar, ou seja, quem diminuir os custos do trabalho, os direitos, quem reduza e continue a reduzir os salários reais relativos, quem mais introduza a "lei da selva", a nova escravatura do trabalho para que no Planeta reine o reino do capital... Como sublinhou entre outros o Eduardo Chitas na sua análise sobre o Manifesto do Partido Comunista e o Sérgio Ribeiro sobre a liberdade entendida pelas classes dominantes.

Mas camaradas, a caminho do século XXI está o homem condenado a tal regressão? Será este caminho uma fatalidade? Será esta a modernidade? Será um avanço da humanidade o entrar-se no século XXI com uma desigualdade de rendimentos sem precedentes, com a maior miséria ao lado do luxo mais esplendoroso. Será um avanço da humanidade entrar no século XXI com novas maravilhas da técnica e da ciência e ao mesmo tempo com as mesmas chagas sociais do princípio do século?

Também no nosso país se pretende fazer crer que não há outras opções, que só com uma política neoliberal se consegue eficácia na economia, que só os grupos económicos privados podem produzir riqueza e criar emprego, que não há outro caminho para a chamada construção europeia, que como nos revela o Terceiro Relatório da Comissão sobre Protecção Social agora publicado conta com 57 milhões de europeus vivendo abaixo do limiar da pobreza!

Uma vergonha. Mas também na União Europeia cresce a luta por melhores condições de vida, pela redução do horário de trabalho, pelas 35 horas, por mais democracia e participação e aumenta a cooperação e a conjugação de esforços das forças progressistas a nível institucional e não institucional.

O nosso Partido orgulha-se de estar também na primeira fila desta cooperação e por isso, no seguimento das grandes iniciativas de Paris, de Lisboa, de Madrid estará em Berlim na próxima semana, conjuntamente com outras forças comunistas, ecologistas, de esquerda e progressistas

De facto a União Europeia, a primeira potência mundial com os seus 18 milhões de desempregados e 57 milhões de pobres e meia dúzia de monopólios é um exemplo magnífico de uma sociedade solidária, fraterna, justa, respeitadora dos direitos humanos!


A santificação dos mercados

O direito ao trabalho e os direitos dos trabalhadores reconhecidos nas Constituições de muitos países tornaram-se para muitos jovens e para muitos trabalhadores um privilégio inacessível. E esta é a sociedade que nos querem oferecer à beira do século XXI, sempre em nome dos mercados, essa identidade dita abstracta acima do ser humano, que não tem cartão de eleitor mas que nas sociedades actuais nos querem fazer crer, que a eles se devem subordinar as escolhas e as decisões. Os mercados responderam positivamente. Os mercados responderam negativamente... Os mercados! dirá qualquer Yuppie ou aparentado quando fala da economia ou de um qualquer resultado eleitoral ou de um despedimento colectivo. Tudo se deve e tudo tem que se subordinar aos mercados. Mas os mercados não são entidades abstractas, têm nome, têm rosto e têm dono - são o capital financeiro, são a banca, são as actividades especulativas e financeiras - capital financeiro que tem poder, que domina ou tem participação e portanto influência nos grandes meios de informação.

Como já alguém se interrogou e respondeu, somos nós manipulados, condicionados, vigiados, num Estado de direito e numa sociedade dita de plena democracia?

O cidadão pode pensar que escolhe sempre pela sua própria cabeça. Pura ilusão! Outras máquinas "discretas e subtis... condicionam os espíritos: os media, a publicidade, as sondagens..." o que se diz em nome dos mercados..., como aqui sublinharam entre outros, o Urbano e o Fernando Correia. (...)


Uma intervenção exigente e empenhada

Vamos ter nos próximos tempos a necessidade de uma intervenção ainda mais exigente e empenhada, como aliás aqui vários camaradas também sublinharam: Filipe Diniz, Ana Pessoa, António Filipe, Rego Antunes, Bernardino Aranda.

Por um lado no plano da organização estamos a desenvolver um grande esforço para levar à prática as resoluções do Comité Central de 14 e 15 de Fevereiro; avançamos com a campanha pela melhoria e reforço da Segurança Social; com a campanha sobre direitos dos trabalhadores; com os debates sobre Portugal 2000 e simultaneamente com uma intensa intervenção na Assembleia da República, no movimento de massas e agora também na campanha pelo "Sim" à despenalização da interrupção voluntária da gravidez... É um grande esforço só possível com a generosidade, a abnegação e a dedicação dos militantes comunistas! (...)

Neste novo impulso importa reafirmar que nós estamos profundamente vinculados à nossa identidade e ao nosso património político e ideológico, mas, por isso mesmo, queremos estar também cada vez mais despertos e atentos para os novos fenómenos e para o rejuvenescimento e a renovação que o curso da vida e da realidade constantemente exigem.

Estamos firmes nas nossas convicções e no nosso ideário mas, por isso mesmo, abertos para a reflexão crítica e para o estímulo que podemos encontrar no diálogo e no debate com concepções e pontos de vista diferentes. E como sublinharam aqui vários camaradas e o camarada Gusmão: "no preciso momento em que procuramos promover o debate e as convergências à esquerda, o reconhecimento da pluralidade não só actual mas histórica da esquerda é também o reconhecimento da nossa própria identidade sempre em construção". (...)»


«Avante!» Nº 1279 - 4.Junho.98