Interpelação ao Governo sobre Segurança Social
Defender
o sistema público
dos apetites privados
Foi um debate vivo e interessante o realizado na passada semana em torno da problemática da Segurança Social. Promovido pelo Grupo Parlamentar do PCP, sob a forma de interpelação ao Governo, constituiu-se num momento de reflexão no decorrer da qual foi possível aprofundar o conhecimento sobre as posições e propostas que os diferentes quadrantes políticos têm sobre esta matéria.
E a primeira nota de
relevo, desde logo, vai para a forma como a bancada comunista
conduziu o debate, assumindo, como habitualmente, uma postura
construtiva, contribuindo assim para a sua elevação e
dignidade. Isso ficou patente na argumentação sólida
desenvolvida pelos seus deputados e na credibilidade das suas
propostas.
De tal modo que, no final, o próprio Ministro Ferro Rodrigues,
não obstante as divergências, foi levado a reconhecer que a
interpelação do PCP foi um "passo positivo", um
"passo em frente" na discussão sobre as questões da
Segurança Social.
Mas se o debate representou um avanço neste domínio, ele serviu
também para confirmar algumas das principais preocupações do
PCP, nomeadamente, quanto à proposta do Governo de
fragilização do sistema público de segurança social visando a
sua privatização parcial em benefício dos mercados financeiros
e das sociedades gestoras de fundos de pensões.
E esta é que foi a questão nodal que atravessou todo o debate e
para a qual não foi dada uma resposta convincente por parte do
Governo susceptível de atenuar ou contrariar os receios
suscitados. Ferro Rodrigues limitou-se a anunciar um conjunto de
generalidades, sem avançar com propostas concretas para a
reforma da Segurança Social. Registo merece, porém, a sua
afirmação de que está aberto ao diálogo, bem como as
garantias por si dadas de que o Governo não porá em causa o
sistema público de Segurança Social.
O debate permitiu,
entretanto, confirmar a afirmação desde sempre feita pelo PCP
de que é falsa a propaganda lançada por alguns sectores e pela
direita dizendo que o sistema de Segurança Social estava em
ruptura e à beira da falência. Esta afirmação do PCP não só
não foi contestada, como foi acompanhada pela Câmara,
remetendo-se a um prudente silêncio todos aqueles que
anteriormente defendiam a tese catrastofista. A própria deputada
do CDS/PP e sua ex-responsável pela bancada parlamentar, Maria
José Nogueira Pinto, disse não acompanhar o discurso do seu
líder.
Ora este reconhecimento é muito importante porquanto, como
sublinhou Lino de Carvalho em declarações ao
"Avante!" no final do debate, enfraquece o argumento de
todos aqueles que propagam a ideia de não sustentabilidade do
sistema face ao futuro, com a qual se alimentam as teses que
visam criar esquemas que apontam para a privatização, pelos
menos parcial, do sistema de Segurança Social, que abra as
portas aos fundos de pensões privados e às suas sociedades
gestoras.
Nota de realce merece ainda o facto de o Governo ao longo do
debate não ter conseguido explicar - apesar de instado a
fazê-lo pela bancada comunista - as razões pelas quais foi
escolhido no Livro Branco o cenário mais pessimista (daqui a 40
anos), escamoteando-se qualquer outro cenário alternativo. Como
foi demonstrado, este cenário não tem qualquer sustentação
técnica e serviu apenas para o Governo tentar suportar as suas
opções.
A circunstância de todos os quadrantes políticos reconhecerem,
pelo menos em palavras, que é preciso salvaguardar o sistema
público de Segurança Social - um património erigido pelos
trabalhadores ao longo de gerações - como o PCP sempre
defendeu, constituiu outra nota positiva do debate.
Mas onde as
críticas do PCP ao Governo sobiram de tom e as opiniões
divergiram de modo insanável - e esta era no fundo a questão
estratégica que estava em debate - é no que diz respeito ao
modo como o Executivo se mostra sensível a abrir caminho à
privatização de parte do sistema, visando a sua generalização
e privilegiando as sociedades gestoras de fundo de pensões.
Como salientou Lino de Carvalho, o PCP não contesta a
existência de esquemas complementares de reforma, desde que,
precisou, obedeçam, por um lado, ao princípio da subscrição
voluntária, e, por outro, à não imposição de qualquer tecto
à Segurança Social pública. Agora o que os deputados
comunistas não aceitam é que o caminho seja o da
desresponsabilização do Estado, da evolução do sistema
público para um carácter assistencialista, privilegiando as
sociedades gestoras de fundos de pensões.
Daí a sua defesa de uma reforma da Segurança Social, mas uma "reforma democrática que assegure mais e melhor Segurança Social", como aliás ficará plasmado em projecto de Lei de Bases que o PCP em breve entregará no Parlamento.