Em causa recenseamento eleitoral
PCP quer explicações sobre "operação de limpeza"


O Governo vai ter hoje de explicar no Parlamento de modo rigoroso e objectivo a forma como decorreu o processo de actualização extraordinária do recenseamento eleitoral. Essa pelo menos a intenção do Grupo Parlamentar, de quem partiu a iniciativa de propor o debate de urgência que hoje terá lugar com esse objectivo. Com a sua realização, aprovada nas suas últmas Jornadas parlamentares, os deputados comunistas querem ver esclarecidas todas as insuficiências e erros que eventualmente terão ocorrido na operação de limpeza dos cadernos eleitorais, de acordo com relatos nesse sentido vindos a público nos órgãos de comunicação social.

Para a bancada do PCP, como adiantou ao "Avante!" terça-feira o deputado comunista Luís Sá, esta é ainda uma oportunidade para o Governo prestar contas no lugar próprio "sobre um problema que diz respeito a todos e é do interesse de todos", informando sobre o que efectivamente se passou e vai passar neste importante domínio.
"Não se pode dizer que eliminar 430 mil eleitores é melhor do que os ter a mais sem avaliar a situação com rigor e em todas as suas incidências", adiantou Luís Sá, acrescentando ser igualmente necessário "avaliar quantos terão permanecido e porquê, e o que se vai fazer no futuro".
Adiantando ao nosso jornal algumas das principais questões que preocupam a bancada do PCP nesta matéria e que justificaram esta sua iniciativa, Luís Sá começou por destacar a elevada dimensão que atingiu no nosso País o fenómeno da abstenção técnica. Sendo comum a muitos outros países, esta realidade, referiu, assume uma particularidade em Portugal, a qual tem a ver com o facto de o "poder político ter optado sistematicamente, ao longo dos anos, por tomar o número de eleitores e não o número de habitantes como sendo o fidedigno".
Ora sucede que é no número de eleitores que se baseia o número de deputados de cada círculo eleitoral, do mesmo modo que se baseia o número de membros dos órgãos autárquicos, ou o número de membros a tempo inteiro das câmaras e juntas de freguesia, ou ainda que se baseiam em parte as verbas a afectar cada município ou freguesia.
Donde se compreende a importância de uma adequada correcção dos cadernos eleitorais, a que acresce, assinalou, o facto de existir uma "norma introduzida na última revisão constitucional que faz depender o carácter vinculativo do referendo da participação de 50 por cento dos eleitores".
Neste quadro não se pode considerar com ligeireza a avaliação dos resultados da actualização extraordinária do recenseamento", observa Luís Sá, para quem quaisquer incorrecções podem significar "injustiças nas eleições legislativas e autárquicas, nas verbas dos municípios e freguesias" e, bem assim, "fazer-se tábua rasa de referendos como se não houvesse uma participação que até pode ter havido".

Confrontar o Governo com as forma como decorreu todo o processo de actualização, designadamente com a celeridade que o marcou e as condições de trabalho impostas pelas empresas contratadas aos seus funcionários, constitui outro dos aspectos que estará presente no debate de hoje, segundo revelou Luís Sá, que considera que o "desespero de desempregados jovens ou menos jovens não pode permitir que se imponham quaisquer condições e ritmos de trabalho".


«Avante!» Nº 1279 - 4.Junho.98