PCP solidário
com povo sarauí


A Frente Polisário, legítima representante do povo sarauí, comemorou no passado dia 20 de Maio o 25º aniversário do início da luta pela independência e soberania do Sara Ocidental, contra a ocupação de Marrocos.
Convidado a participar nas comemorações, o PCP fez-se representar por Valdemar Santos, do Comité Central, que no regresso da visita aos campos de refugiados sarauís falou ao «Avante!» das impressões colhidas durante a sua estada no tragicamente célebre «deserto da morte».

 

— Naquela região do mundo, o que é que continua em causa?

Estivemos dois dias no Hamada, que em árabe significa "o deserto da morte", numa região onde os ventos fortes deslocam grandes massas de areia entre a Argélia e a linha oriental norte da fronteira do Sara Ocidental. Como é sabido, é aí que muitos e muitos milhares de sarauis estão concentrados em acampamentos e é aí também que a Frente Polisário encontra energias para as operações militares e movimentações logísticas que lhe permitiram deter importantes posições no interior do território ocupado por Marrocos.
Neste 25 anos de luta armada, pela força desta e do expressivo apoio do povo sarauí à Frente Polisário, não só foi proclamada a República Árabe Sarauí Democrática, mas esta criou os seus orgãos (Presidência, Parlamento, Governo, Exército e estrutura autárquica), foi reconhecida internacionalmente por setenta e dois de países e tem assento, como membro de pleno direito, na OUA.
Já em 1975, durante uma visita de uma delegação da ONU ao Sara Ocidental, foi inequívoca a manifestação da vontade dos sarauís de terem uma pátria livre e independente, e três anos depois o Conselho de Segurança reconheceu este legítimo direito. Está hoje na ordem do dia – ainda que sujeita a sucessivos adiamentos, o que demonstra os apoios imperialistas de que Marrocos disfruta ainda na cena internacional – a realização de um referendo no Sara Ocidental, sob os auspícios da ONU e na base de acordos directamente estabelecidos entre a Frente e Marrocos, designadamente em Lisboa e Houston.
A grande preocupação dos sarauís é do contingente de marroquinos que Rabat transplantou ao longo de sucessivos anos para o Sara Ocidental, face ao qual os critérios, meios e mecanismos de identificação dos eleitores recenseados e a recensear, caso o referendo não seja "justo, limpo e transparente", segundo o que li e ouvi, podem vir a desvirtuar os resultados. Outros problemas tais como o acantonamento de tropas, repatriamento de refugiados e a libertação e troca de detidos persistem.
Não quero deixar de dizer que para me preparar para esta viagem os materiais editados pelo Avante! foram de uma utilidade insubstituível.


— Que contactos pudeste ter e que testemunhos recolheste?

— As comemorações do 25º Aniversário do início da luta armada em Saguia Hamra e Rio de Oro – precisamente a 20 de Maio de 1973 – tiveram os seus pontos altos nos desfiles militares (com apresentação de material de guerra ligeiro e pesado) e populares, que envolveram muitos milhares de sarauís, nos acampamentos de Smara. Para além dos dirigentes da RASD e da Frente Polisário, contava-se mais de uma centena e meia de convidados e jornalistas.
A grande maioria era constituída por espanhóis de todas as regiões de Espanha em representação de associações de amizade com a luta do povo sarauí, assim como deputados e autarcas de várias forças políticas, numa convergência de esforços pela qual se canaliza um inestimável envio de diversificados materiais e produtos de que o povo sarauí é carente.
No plano mais oficial estavam representantes do governo argelino, de Cuba e Moçambique, entre outros. Foi criticada, pelos espanhóis, a ausência duma representação do seu governo.
Participaram ainda um membro do Comité Nacional do Partido Comunista Francês e do Partido da Esquerda da Suécia, um autarca francês, assim como italianos.
Pude aperceber-me que o número considerável de jornalistas estrangeiros presentes – entre os quais dois da LUSA – testemunhava grande simpatia pela causa sarauí.
Foi-me dado a saber que todos os partidos portugueses com representação parlamentar tinham sido convidados para as comemorações. Só o nosso lá esteve!
A hospitalidade do povo sarauí e dos militantes da Frente sensibilizou-me extraordinariamente. Nas difíceis condições em que se encontram acampados em pleno deserto da morte, não é exagerado dizer que para além das relações entre seres humanos animados por uma luta e pela solidariedade, pouco mais têm de que uma indefectível noção de pátria e o sangue derramado no território que libertaram.


— E de Portugal, que deixaste?

— Nos breves encontros que pude ter com o Presidente da República Árabe Sarauí Democrática, Mohamed Abdelaziz, e o Presidente da Assembleia Nacional (Parlamento), Abdelkadar Taleb Oumar, informei que também nós, portugueses, comemoraríamos para o ano o 25º Aniversário do 25 de Abril, e não deixamos de salientar o contributo da luta libertadora dos povos africanos de Angola, Moçambique, Guiné e Cabo Verde, não contra o nosso povo mas contra o exército colonial português, para o êxito da nossa Revolução.
Deste ponto de vista histórico, valorizámos o exemplo da luta da Frente Polisário num mundo em que parece ser (e será mais difícil, em muitos casos) lutar.
Ou seja, quisemos acentuar o carácter recíproco da solidariedade, com a noção de que a solidariedade não se pede, dá-se.
Por isso, muito ainda nos falta fazer em relação ao Sara Ocidental, com a consciência de que se não o fizermos, ninguém mais o fará. Em particular junto da opinião pública, e para que o governo português não seja titubeante no conjunto de países que, pela via da ONU, tem de assegurar que Marrocos não desvirtuará os acordos estabelecidos, antes e depois do referendo.
Apoiar a campanha em curso levada a cabo pelo CPPC (Conselho Português para a Paz e a Cooperação) de recolha de géneros e antes de tudo medicamentos para o Sara Ocidental é outra tarefa a desenvolver!


«Avante!» Nº 1279 - 4.Junho.98