O projecto de lei do PP para a Segurança Social

Por Eugénio Rosa



O PP de Paulo Portas apresentou um Projecto de Lei, denominado " Bases do Sistema Nacional de Segurança", a que os órgãos de informação deram uma grande cobertura mediática.

No entanto, como sucede muitas vezes, limitaram-se a repetir, ampliando, aquilo que os autores do projecto estavam interessados que fosse dito, no lugar de prestarem um informação completa à opinião pública, o que obrigaria a um estudo sério do projecto lei, e a divulgação dos seus pontos mais importantes, bem como das consequências da sua aprovação para os beneficiários actuais ou futuros da Segurança Social.
Como provaremos, por ignorância ou intencionalmente, a esmagadora maioria dos órgãos de informação omitiram aspectos importantes e graves desse projecto, e mesmo aquilo que divulgaram fizeram-no manipulando o que consta do projecto de lei.

Contrariamente ao que divulgaram os órgãos só uma pequena percentagem de reformados é que, de acordo com o projecto do PP, beneficiariam da aproximação da pensão que recebem em relação ao salário mínimo nacional até ao ano 2005.

Efectivamente, segundo o nº 4 do artº 28º do projecto de lei, "a bonificação social necessária para a convergência ... não se aplica às situações de carreira contributiva inferior a 15 anos" . E como se sabe, a maioria dos reformados que recebem a pensão mínima descontaram para a Segurança Social menos de 15 anos, sendo essa mesma a razão principal de receberem uma pensão de tal valor.

Por outro lado, de acordo com o nº2 do mesmo artigo tal aproximação ao salário mínimo nacional não se aplica ao chamado subsistema de solidariedade, que inclui os reformados que recebem a pensão social assim como os reformados pertencentes ao regime especial da segurança social dos trabalhadores agrícolas, cujo número, neste momento, deverá rondar os 700.000, e cujas pensões ficariam ligada apenas ao valor da pensão mínima do Regime Geral da seguinte forma: - não poder ser inferior a 70%, que é já pràticamente a situação actual.

Em conclusão, e de acordo com estimativas feitas os número de reformados cujas pensões covergeriam, até ao ano 2005, para o montante do salário mínimo nacional deve representar cerca de 20% (apenas 20 em cada 100) do total de reformados que actualmente recebem uma pensão inferior ao salário mínimo nacional. Portanto, um número muito inferior àquele que os órgãos de informação fizeram crer.

E mesmo aquela reduzida percentagem de reformados (20 em cada 100) não viria a sua pensão coincidir com o valor do salário mínimo nacional, pois o valor a considerar não é aquele, mas sim o valor do salário mínimo deduzido da Taxa Social Única, ou seja, reduzido em 11%., o correspondia actualmente a pouco menos 7000$00 que o salário mínimo.


A destruição do sistema de Segurança Social

Como mostraremos seguidamente, a aproximação da pensão mínima ao salário mínimo nacional constituiu fundamentalmente uma forma de iludir a opinião pública, desviando a atenção desta de partes extremamente graves do projecto de lei do PP, cujos dirigentes nunca falaram, e que a maior parte dos órgãos de informação também omitiram, ou por ignorância ou intencionalmente.

Assim, de acordo com o nº2 do artº 18º do projecto de lei do PP, "a determinação dos montantes das prestações "que inclui também as pensões de reforma" pode obedecer, igualmente ao principio da diferencialidade social … tendo em conta, enter outros factores, o período contributivo, a duração da prestação, as despesas familiares, o grau de incapacidade e a idade do beneficiário". Portanto, a pensão deixaria de ser um direito, cujo valor é calculado multiplicando o número de anos de desconto vezes 2% vezes o chamado salário pensionável (a média aritmética dos salários revalorizados dos melhores 10 anos dos últimos 15 anos de desconto), portanto um valor facilmente calculado por cada trabalhador, resultante do número de anos de desconto e do valor dos salários sobre os quais o desconto foi feito nos últimos 15 anos de actividade; repetindo, a pensão deixaria de ser um direito, cujo valor é calculado da forma anteriormente referido, e o seu montante passaria a ficar dependente de uma série de factores que poderiam determinar que dois trabalhadores que tivessem descontado o mesmo número de anos sobre valores de salários iguais, recebessem ao fim de 40 anos de trabalho, pensões muito diferentes. Tudo dependeria do peso dos outros factores constantes do projecto da lei do PP.

E de acordo com o artº 15º do mesmo projecto de lei, as contribuições, ou, para utilizar uma palavra mais familiar aos trabalhadores, os descontos para a Segurança Social passariam a ser "determinadas por incidência dos valores percentuais fixados na lei sobre as remunerações ou equiparadas até a um limite superior o qual seria indexado a um factor múltiplo do salário mínimo nacional" (nº 2 e 3 deste artigo), ou seja, estamos perante o chamado plafonamento horizontal, que consiste no seguinte: - Passar-se-ia a descontar para a Segurança Social, incluindo as empresas, apenas até a um determinado valor do salário, que, segundo a Comissão do Livro Branco e o ministro Ferro Rodrigues, devia ser igual a cinco salários mínimos nacionais.

Para além disso, o PP defende no seu projecto (nº4 do artº 15º) que o plafond referido anteriormente evolua para um plafond vertical, o que significa que todos os trabalhadores, seja qual fosse a sua remuneração, deixassem de descontar para a Segurança Social sobre uma parcela da sua remuneração (por exemplo, 25% do salario de todos os trabalhadores).

E como tudo isto já não fosse suficiente, o nº6 do artº 15º do projecto de lei apresentado pelo PP diz expressamente que " o limite superior contributivo, ou seja, o chamado plafond , deve ser estabelecido tendo em conta o total de remunerações dos conjugues". Estamos perante um insólito plafond conjugal, que determinaria que o desconto para a Segurança Social de cada trabalhador, e, consequentemente, também de cada empresas, dependeria do rendimento do agregado familiar a que o trabalhador pertencesse.

Interessa ainda referir que de acordo com o artº 16 do mesmo projecto de lei a idade de reforma poderia ser alterada aquando da discussão do Orçamento do Estado, ou seja, todos os anos, e naturalmente ficaria dependente de critérios orçamentais.


Um projecto de lei
à medida das seguradoras e das SGFP

É evidente que se as propostas constantes do projecto de lei apresentado pelo PP fossem aprovadas, verificar-se inevitavelmente três consequências a curto prazo: - (1) Uma redução muito acentuada das receitas da Segurança Social, pondo imediatamente em perigo a sua sustentabilidade financeira; (2) Os valores das pensões de reforma desceriam acentuadamente, pois os descontos para a Segurança Social seriam feitos sobre uma parte do salário de cada trabalhadores, e, consequentemente, o valor do salário com base no qual se calcula a pensão de reforma seria muito mais baixo; (3) Finalmente, as propostas do PP representariam para as empresas o aumento dos seus lucros, pois passariam a não ter de entregar à Segurança Social uma parte dos descontos que actualmente são obrigadas.

Em resumo, juntando estes três tipos de plafonamentos ás restantes medidas que constam da proposta do PP, que já se referiu anteriormente, o que verdadeiramente se procura é destruir o sistema actual de Segurança Social e abrir, deste forma, o caminho fácil aos fundos de pensões, ou seja, às Seguradoras e às Sociedades Gestoras de Fundos de Pensões (SGFP), a esmagadora maioria ligadas a bancos.

Para terminar interessa recordar o afirmado pelo presidente da Associação das Sociedades Gestoras de Fundos de Pensões, num debate organizado pelo Forum Social, do dr. Medina Carreira, em 1997: - "O sistema público de Segurança Social ao permitir ao trabalhador a obtenção de um beneficio potencial demasiadamente generoso, não tem deixado espaço para o crescimento sustentado dos fundos de pensões". Portanto, o que pretende o PP com seu projecto de lei é destruir o sistema público de segurança social para abrir "espaço para o crescimento sustentado dos fundos de pensões". O projecto de lei do PP vem assim responder a uma reivindicação do capital financeiro, apresentada também com força na reunião que o governo realizou recentemente no Estoril com os representantes dos grandes grupos económicos portugueses. É preciso não esquecer, que o dr. Bagão Feliz, autor do projecto de lei do PP, apesar de se apresentar normalmente como especialista das questões da segurança social, é o responsável pelas áreas de seguros e fundos de pensões do grupo BCP/BPA, portanto um dos homens de confiança de Jardim Gonçalves.


«Avante!» Nº 1281 - 18.Junho.98