Recenseamento da Função Pública revela grandes distorções
Equidade e justiça
exigem outro caminho



O recenseamento dos trabalhadores da Função Pública, divulgado na semana passada pelo Governo, levou a FNSFP/CGTP a reiterar as suas críticas à política seguida no sector.

Nos números divulgados dia 22 de Junho, a Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública viu a expressão de «acentuadas distorções salariais entre os diversos ministérios ou entidades públicas, se se considerar a média salarial revelada para cada um deles». Este retrato vem provar que «o sistema retributivo vigente não cumpriu os objectivos para que foi criado, ou seja, eliminar as graves disparidades nos vencimentos da Administração Pública», afirma-se numa nota de imprensa divulgada pela federação no dia em que foi dado a conhecer o resultado do recenseamento.


Quem ganha 195 contos?

A remuneração média mensal calculada pelo Governo situa-se, para toda a Administração Pública, na ordem dos 195 contos. Mas esta média estatística «só é possível de alcançar graças às médias de vencimentos significativamente elevadas de algumas entidades, como o Tribunal Constitucional, o Conselho Superior de Magistratura, a Procuradoria-Geral da República, a Provedoria de Justiça, os ministérios das Finanças e da Justiça», refere a FNSFP, contrapondo que, «na generalidade dos ministérios, a remuneração média mensal é inferior aos 195 mil escudos, e é aqui que se concentra grande parte dos trabalhadores da Função Pública, cujos vencimentos mensais, mesmo com subsídio de refeição ou suplementos, não se aproximam dos valores apontados pelo Governo».
A federação considera, por isso, «importante que o Governo saiba tirar as necessárias ilações dos números que ele próprio revelou, tomando medidas para que, em termos de futuro, a equidade nas remunerações dos trabalhadores da Função Pública não seja palavra vã».
Tomando em conta as declarações que acompanharam a divulgação dos resultados do recenseamento - designadamente afirmações do secretário de Estado da Administração Pública, defendendo que o aumento salarial de 2,75 por cento, verificado este ano, anexado à «revisão» do regime de carreiras, constituiria um factor de aproximação aos níveis de vencimentos da Europa Comunitária -, a FNSFP considera que «não se está no bom caminho».
É que, «com tais valores percentuais de aumento salarial e com as ridículas alterações no regime de carreiras, não se alcança a equidade e justiça social interna, nem nos aproximamos dos níveis europeus», denuncia a federação, que acusa o Governo de, «ao manifestar profundo silêncio sobre a necessidade de rever o sistema retributivo, para alcançar maior justiça remuneratória», estar a contribuir «não para a reforma da Administração Pública, mas sim para uma evolução na continuidade, a todos os títulos indesejável».


Nem quantidade
nem estabilidade

A propósito do realce dado pelo Governo ao facto de 77,5 por cento dos efectivos da Administração Central se encontrarem nos quadros e terem, assim, aquilo a que o primeiro-ministro chamou de estabilidade de emprego, a federação entende ser conveniente «referir, já que tal foi omitido pelo chefe do Governo, que o mesmo tem em curso uma vasta ofensiva contra esta estabilidade, ao transformar parte significativa dos organismos do Estado em institutos públicos de direito privado e ao impor aos trabalhadores as regras do contrato individual de trabalho, nomeadamente para os que de futuro neles vierem a ingressar».
O número de efectivos apurado «vem comprovar o que há muito a FNSFP tem afirmado: Portugal é o país da União Europeia com a mais baixa percentagem de trabalhadores da Função Pública em relação, quer à população em geral, quer à população activa».
A elevada média etária (superior a 48 anos, se for excluída a carreira docente) «confirma os efeitos negativos da cega política orçamentista de congelamento de admissão, principal factor gerador de múltiplas formas de trabalho precário, pelo que da mesma devem ser tiradas as devidas ilações: é necessário rejuvenescer a Função Pública promovendo-se a criação de mais emprego público com direitos».
Para a federação, é «positiva a existência de um recenseamento de efectivos da Administração Pública, que aliás, surge com mais de um ano de atraso relativamente ao acordado com os sindicatos (30 de Março de 1997)». Na nota previne-se que «é, agora, da responsabilidade do Governo manter tal recenseamento actualizado».


«Avante!» Nº 1283 - 2.Julho.98