Regionalização
Mais participação,
mais transparência, mais democracia


As organizações do PCP entraram em força na batalha pela criação das Regiões Administrativas.
Designadamente as Organizações Regionais de Lisboa e Setúbal, em conferência de imprensa realizada na sexta-feira passada, no Café
Martinho da Arcada, manifestaram o seu empenhamento na criação de um grande movimento de opinião em torno da criação da Região Administrativa de Lisboa e Península de Setúbal.

Na mesa, José Manuel Maia, presidente da Assembleia Municipal da Área Metropolitana de Lisboa, Euclides Pereira, da Direcção da Organização Regional de Lisboa do PCP, António Andrez e Jorge Pires da Comissão Política, apontaram a criação desta Região como «uma necessidade» e mostraram-se decididos não só a apoiar todos os movimentos unitários que vierem a surgir com esse objectivo, mas também a desenvolver uma campanha própria, «autónoma e forte.»
E depois de Jorge Pires ter proferido uma declaração sobre a matéria, que a seguir se transcreve, responderam a várias questões suscitadas pelos jornalistas, aproveitando para precisar e esclarecer algumas dúvidas que parecem subsistir na opinião pública, designadamente no que se refere à possibilidade do «aumento do clientelismo político», de um eventual «esvaziamento das competências dos municípios», ou de os novos órgãos, por obstrução do poder central, poderem «não adquirir toda a força e dinâmica previstas».

«As Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto foram criadas pela lei nº 44/91. A Assembleia da República deliberou a criação destas "pessoas colectivas de direito público de âmbito territorial" no fim da primeira legislatura de maioria absoluta do PSD, o que, por si só, é elucidativo das suas ambiguidades e limitações. Com efeito, a aprovação da lei verificou-se por unanimidade, mas em simultâneo com a Lei Quadro das Regiões, o que apontava para não transformar em definitivo o modelo que se afirmava como tímido e transitório, sem meios nem atribuições e competências e com órgãos compostos por Presidentes de Câmara, já sobrecarregados com problemas e com uma perspectiva municipal e não metropolitana dos problemas. A tudo isto soma-se a proliferação de diferentes divisões do país segundo os ministérios, institutos, empresas públicas, criando uma administração "regional" descoordenada, cara e caótica, facto que também atingiu a Área Metropolitana de Lisboa e Península de Setúbal.

Da experiência de trabalho desenvolvida nos órgãos da AML resultou a constatação de que a mesma se esgota num quadro legal limitadíssímo, que não permitiu potenciar os recursos disponíveis, para responder às aspirações de melhoria da qualidade de vida das populações.

As limitadas competências e operacionalidade da AML, em termos institucionais e de meios disponibilizados, não têm permitido uma acção suficientemente coordenada dos diversos e vultuosos investimentos realizados, e não permitiam a sua máxima rentabilização no sentido de um desenvolvimento regional harmonioso.

Sentiu-se, aqui, claramente, e numa altura em que se têm realizado investimentos vultuosíssimos, designadamente na concretização da EXPO 98, na melhoria da rede viária e do sistema de transportes, na renovação urbana de várias zonas e na construção de importantes equipamentos para tratamento de lixos e esgotos, que a Adminístração Central, mesmo por intermédio dos seus serviços periféricos, se encontra demasiado longe e por cima dos problemas específicos e concretos do desenvolvimento regional e que, ao contrário, os Municípios quer isolados, quer associados ou mesmo integrados em estruturas como são as actuais Áreas Metropolitanas, se encontram longe e por baixo daqueles mesmos problemas.

De facto, sendo as associações de municípios relevantes na resolução de carências e dificuldades que cada município, por si só, não teria capacidade de vencer, a verdade é que o associativismo não pode deixar de se mover no âmbito das competências municipais, estando incapacitado de intervir, eficazmente, ao nível das acções de coordenação e compatibilização dos meios que ultrapassem essas competências.

As políticas de desenvolvimento para a Área Metropolitana de Lisboa têm assim resultado de múltiplas e descoordenadas intervenções de grande número de organismos desconcentrados dos ministérios, de institutos, de empresas públicas e de investidores privados. Intervenções descoordenadas que, como é óbvio, não poderiam conduzir à máxima eficácia e coerência dos investimentos.

Pese embora constarem das competências das Comissões de Coordenação Regionais dezenas de áreas de intervenção fulcrais para o desenvolvimento, o que concede enorme poder às CCR'S, as mesmas já demonstraram a sua incapacidade no desempenho de uma eficaz acção integradora junto de numerosas, complexas e não raras vezes estranhas divisões regionais de Ministérios, Secretarias de Estado e até Direcções Gerais.

A mesma falta de capacidade integradora de políticas e de objectivos de desenvolvimento verifica-se, também nas estruturas responsáveis pela gestão do Quadro Comunitário de Apoio, embora tenha sido possível contratualizar entre o Governo e a Área Metropolitana de Lisboa a parte correspondente à gestão de todo o subprograma de investimentos com apoios comunitários que estão a cargo dos municípios.

Com maior incidência se poderá vir a pôr esta questão no futuro, se se confirmar a eventual saída da AML do objectivo l dos apoios comunitários por ultrapassar os 75% da média do PIB per capita comunitário.

Trata-se de uma grave redução de apoios para o futuro da AML que exige, em primeiro lugar, uma forte e incisiva negociação por parte do Governo por forma a que os interesses da região não sejam lesados, e, em segundo lugar uma gestão mais racional e mais participada de todos os interesses em presença que só a criação da região administrativa poderá permitir.

A actual situação conduz a que se esteja a impedir o desenvolvimento harmonioso da região correspondente à AML, a impedir a sua correcta e harmoniosa integração no contexto do desenvolvimento nacional e a desprezar oportunidades de afirmação no contexto europeu.

Urge alterar este quadro, não apenas por questões estruturais, mas

também e sobretudo por uma lógica e dever democráticos.

A criação e concretização das regiões administrativas no Continente, e, desde logo, da Região Metropolitana de Lisboa e Península de Setúbal, irão possibilitar não apenas uma participação nas políticas europeias, com expressão em Portugal, como ainda e fundamentalmente, completar o edifício constitucional no que se refere ao poder local democrático.

A institucionalização das regiões administrativas eleitas democraticamente irá permitir um novo equilíbrio de intervenção entre eleitos locais, e regionais e a Administração Central, garantindo mais órgãos eleitos e maior participação das populações na gestão pública favorecendo assim a democracia participativa, uma menor sobrecarga da Administração Central com o consequente aligeirar da máquina burocrática central, uma política de cooperação com os municípios garantindo a assunção, a nível regional, de atribuições que só podem ser levadas a cabo a nível supramunicipal e uma melhor localização do poder de decisão através de uma aproximação às populações.

As regiões não devem ser concebidas na base de novos desequilíbrios. Os distritos, em muitos casos, foram esvaziados, as assimetrias somaram-se, foram muitas as situações em que se criaram assimetrias e rivalidades. Por isto, e para a unidade do País e para melhor enfrentar os problemas, impõe-se optar por modelos de região polinucleada, com várias centralidades e serviços e órgãos próprios próximos das populações.

A institucionalização das regiões administrativas, eleitas democraticamente, irá permitir maior transparência e abrir à participação, um nível intermédio de poder, hoje burocratizado, e sem controlo popular. E irá, até por imperativo constitucional, empenhar-se em tarefas de coordenação e de apoio à acção dos municípios no respeito da sua autonomia e sem limitação dos respectivos poderes.

E isto é tanto mais importante quanto está indiscutivelmente demonstrada a superior capacidade do nível da Administração Local na rentabilização dos recursos públicos do Estado. Em 1996, por exemplo, o investimento à responsabilidade da administração local, ainda sem regiões administrativas, correspondeu a 29,7% do total do investimento realizado pela Administração Central, tendo usufruído apenas de 6,5% de participação nas receitas do Estado.»

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PCP esclarece

O Gabinete de Imprensa do PCP, respondendo a declarações que, segundo um despacho da Lusa citado pela imprensa escrita, terão sido proferidas António José Seguro na semana passada - que o PS «não vai fazer quaisquer acordos com partidos políticos, nomeadamente com o PCP, para patrocinar movimentos cívicos» no referendo sobre a regionalização -, entende esclarecer:

1. que o PCP também não vai fazer quaisquer acordos com partidos políticos, nomeadamente com o PS, para patrocinar movimentos cívicos, e nunca teve propósitos nem fez propostas que pudessem ser apresentados nos termos usados por A. J. Seguro;

2. que não é correcto que se apresente como rejeição de alegadas propostas do PCP o que, em boa verdade, teria então de ser considerado a rejeição de hipóteses que responsáveis do PS, sem propostas de ninguém, chegaram a formular ou encarar com simpatia.»


«Avante!» Nº 1286 - 23.Julho.1998