Defesa Nacional e Forças Armadas


No passado dia 9 de Julho o CEMGFA, General Espírito Santo, foi entrevistado na RTP1 pela jornalista Judite de Sousa. Tratou-se de uma entrevista a diversos títulos interessante.

Desde logo, pelo facto do CEMGFA ter aceite fazê-la, quebrando e bem uma regra dos seus antecessores. Depois, porque não fugiu às respostas.
O General admitiu que houve sururu entre os Ramos quando da sua nomeação para o cargo (lembremos que em virtude disso o General Aleixo Corbal pediu a demissão); admitiu que os vencimentos dos militares têm vindo a ser depreciados, etc.

Em matéria de política externa e mais concretamente no que diz respeito à situação na Guiné, a intervenção do CEMGFA foi comedida, com a reafirmação constante de que o direito internacional foi e continuará a ser cumprido, não deixando contudo de fazer sentir a existência de dificuldades com o Senegal.

Em matéria de reequipamento, a referida entrevista foi preciosa. É que o CEMGFA esclareceu em alguns segundos aquilo que o Governo, especialmente o Ministro da Defesa Veiga Simão, não esclareceu em largos minutos. Referimo-nos à aquisição de mais aviões F16. Há compromissos de Portugal no quadro das organizações de que faz parte (neste caso a NATO e a UEO) e a aquisição dos referidos F16 visa satisfazer esses compromissos. Claro, preciso e conciso!

Claro que o CEMGFA não disse nada para o qual o PCP já não tivesse chamado a atenção e razão pela qual votámos contra a aquisição dos referidos aviões. O que se lamenta é a inadaptidão do Ministo V. Simão no tratamento das matérias ligadas com a Defesa Nacional e Forças Armadas. O que se lamenta é o Governo não assumir publicamente que vai gastar uns milhões largos de contos na aquisição de aviões que não visam, em primeira linha, a defesa do espaço nacional, mas a satisfação dos compromissos externos, no quadro de um conceito estratégico de defesa colectiva cada vez mais claramente expresso.


Oh Sr. General, francamente...

Duas passagens houve na entrevista do CEMGFA que não podem passar em claro. A primeira diz respeito ao existir muita gente a falar sobre as FFAA, sobre o que elas devem ou não ter. Temos uma opinião muito diferente. Na verdade, seria muito bom para as FFAA e para o País que muito mais cidadãos opinassem sobre problemáticas ligadas com a defesa militar da República. Repare-se que o Governo PS anunciou um amplo debate nacional a propósito da profissionalização das FFAA. Onde está esse debate nacional?
Sabemos que Veiga Simão cada vez que abre a boca cria um problema que obriga à intervenção da "força de reacção rápida do Governo" - Guterres, Jorge Coelho e Pina Moura.
Mas até tendo em conta esse objectivo da profissionalização, Portugal só tem a ganhar com mais debate e mais opinião. Essa coisa de que as questões militares são só para os militares não faz sentido. Até porque as questões militares nem para todos os militares são e aqui entramos na segunda questão, ligada com a afirmação do CEMGFA de que "sindicatos comigo, não!". E para justificar a afirmação, acrescentou que não faz sentido dar uma ordem para as tropas irem numa direcção e vir o sindicato dizer para elas irem noutra. Oh, Sr. General, francamente...

Será que para o CEMGFA os militares congregados em torno das associações militares existentes e que significam milhares de militares, são irresponsáveis? Será que os países da União Europeia e da NATO que possuem - ou seja praticamente todos - associações sócio-profissionais e até sindicatos (sem direito à greve, como é óbvio) são, tanto no plano político como no plano militar, governados por irresponsáveis?

O fantasma lançado pelo Sr. General CEMGFA já só habita nalgumas casas, poucas, situadas para os lados do Restelo. E tanto assim é que as associações existentes têm relacionamento com todos os órgãos de poder, excepto, pasme-se! com as chefias militares.

Pode o Sr. General, e não só, pretender continuar a viver nesta hipocrisia (que tem custado punições a muitos militares) à sombra de um artigo - o 31 - da Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas absolutamente caduco. Porque a questão é esta: o que está caduco já não vivifica e como diz a canção "não há machado que corte a raiz ao pensamento". — Rui Fernandes


«Avante!» Nº 1286 - 23.Julho.1998