ANGOLA
Até quando?


Angola continua a viver o flagelo da guerra. Pudemos constatar directamente o que significa a permanente sabotagem por parte da UNITA dos Acordos de Lusaka assinados em 1994.
A guerra desencadeada pela UNITA para anular os resultados das eleições livres e democráticas causou largas dezenas de milhares de mortos. E fez deslocar centenas de milhares de angolanos dos campos para as cidades.
Em Luanda, onde deveriam viver cerca de um milhão de angolanos, vivem três, sendo que a maioria é de proveniência rural, pouco habituado ao urbanismo das grandes cidades. Em consequência destas deslocações de populações a vida nas cidades degrada-se assustadoramente. Não há habitação. As pessoas vivem ao calhas, onde houver buracos, onde for possível construir um qualquer abrigo. Os serviços primários de abastecimento de água, gás, electricidade , esgotos e outros rebentam pelas costuras.

Não há emprego e cerca de 40% da população de Luanda está desempregada. Há, entretanto, pressões fortes do FMI e BM para o governo despedir alguns milhares de funcionários públicos. Rebentam greves no sector da Educação devido em grande medida às precárias condições do exercício da profissão. A criminalidade sobe e na capital e noutros centros urbanos vive-se sob a ameaça desse terrível flagelo.
A inflação é medida mensalmente e provoca grandes perdas no minguado poder de compra das populações.
O campo minado ou sujeito a acções armadas dos homens da UNITA não produz e obriga o governo a importar produtos que poderia produzir e muitos dos quais exportar.
Este é o pano de fundo de Angola. É nesta situação que se encontrarão as explicações para as acções político-militares da UNITA.

Savimbi, e o seu núcleo de incondicionais, só conhecem a linguagem do poder. Todos os passos, todas as medidas estão enquadradas na estratégia da tomada de poder em Angola. Savimbi sacou rios de dinheiro com o comércio de diamantes e do marfim. E esteve sempre bem abastecido desde os tempos de Reagan, Thatcher e por alguns déspotas, como era, entre outros, o caso do falecido Mobutu. Savimbi sabe que existem largas dezenas de milhares de homens que são hoje os restos dos exércitos derrotados do Zaire, do Ruanda, do Burundi, dos racistas da África do Sul e da Namíbia e ainda do Zimbabwe. Savimbi tem dinheiro e ambições. E o seu projecto não é ser vice-presidente de Angola, nem de colaborar no governo de unidade nacional, nem no Parlamento, nem ao nível da Administração Local. Savimbi quer ganhar tempo, espaço e condições socio-políticas para ser a alternativa no terreno político-militar. Por isso diz que desmobiliza, mas mobiliza; diz que desarma, mas guarda armas ; diz que UNITA se integra politicamente , mas cria a sua própria estrutura totalmente sob o seu controlo e fora das instituições; diz que reconhece o poder central, mas não entrega o Bailundo, o Andulo, a Nhareia e outros ; diz que respeita o cessar-fogo , mas ataca localidades provocando novas vagas de refugiados...
Savimbi está a ver até onde vai a pressão internacional e medir as reacções internas e externas aos seus ataques militares. Até ao momento as medidas não são suficientemente fortes para o pôr na ordem e por isso ele sente-se capaz de prosseguir os seus planos. Savimbi sabe que neste quadro a instabilidade e o consequente agravamento das condições sociais das populações lhe são benéficas.
Ás pressões político-militares da UNITA sobre o governo juntam-se outras, as das instituições internacionais do FMI, o novo Ministério das Colónias, como já lhe chamam alguns.

Angola é um grande país cuja influência na região ultrapassa as suas próprias fronteiras. Precisa de paz para poder respirar. Savimbi precisa de desestabilizar e sabotar. Angola percorreu os caminhos acordados na comunidade internacional. Não é legítimo que os sabotadores continuem a impedir que Angola viva em paz. Esta situação é insustentável. — Domingos Lopes


«Avante!» Nº 1286 - 23.Julho.1998