CNA exige
medidas urgentes


«O momento é de extrema gravidade e a situação não se compadece com hesitações, nem com argumentos de dificuldades financeiras e/ou orçamentais". Foi isto, em síntese, que a CNA veio dizer, em conferência de imprensa, reclamando a declaração do Estado de Calamidade para as culturas e regiões afectadas. Porque, o que está em causa, é «o futuro da agricultura e dos agricultores portugueses».

A agricultura portuguesa vive momentos particularmente difíceis. A situação actual é de um enorme endividamento, com grande parte a constituir dívidas a curto prazo; uma quebra brutal das produções em função das aleatoriedades climatéricas; a invasão do país e das grandes superfícies pelos produtos estrangeiros, nomeadamente carne, frutas, leite e vinho.
Pelas estimativas da Confederação Nacional da Agricultura – CNA e associadas, divulgadas em documento entregue à imprensa, o total de perdas é de 98 milhões de contos.
Concretamente, não vai ser possível a sementeira de cereais de Outono/Inverno em mais de 70% da área normal, o que acarreta perdas de produção na ordem de 12 milhões de contos, apenas em grão; a diminuição da produção de vinha, que afecta particularmente Entre Douro e Minho, Trás-os-Montes, Ribatejo e Oeste e Beira Litoral é estimada em 36 milhões de contos; o conjunto das perdas de produção de frutas, atingindo maioritariamente o Ribatejo e Oeste, Trás-os-Montes, Beira Interior, Beira Litoral e Entre Douro e Minho, orça pelos 23 milhões de contos; para o olival as perspectivas são más, estimando-se uma quebra de produção, com maior incidência em Trás-os-Montes e no Alentejo, na ordem dos 6 milhões de contos.
Este o quadro que amplamente justifica as sucessivas propostas de reunião dirigidas ao Ministro da Agricultura, em Janeiro e em Junho, todas elas recusadas, e a reclamação de que seja declarado o Estado de Calamidade.


Medidas urgentes

Este balanço do estado actual da agricultura, que está a levar ao desespero produtores e cooperativas, impõe naturalmente respostas adequadas.
Neste quadro, a CNA propõe algumas medidas urgentes a tomar pelo governo.
Antes do mais a declaração do Estado de Calamidade e o accionamento do Fundo de Calamidades, «com o reforço financeiro necessário para que não aconteça o mesmo do ano passado em que, por falta de reforço desse mesmo fundo, dos 13 milhões de contos de subsídios/indemnizações apurados pelo próprio governo, os agricultores apenas receberam 4,5 milhões».
Mas também: o pagamento a 100% dos prejuízos causados pelas intempéries, enquadrando-os no âmbito do fundo de calamidades do SIPAC; um pedido à União Europeia de medidas especiais de apoio financeiro; o prorrogamento dos prazos de pagamento de dívidas anteriores; a transferência para dívida a 3 anos do Crédito de campanha deste último ano; a atribuição, a título de excepção, de uma percentagem da indemnização aos agricultores ainda não aderentes ao SIPAC.
«Se não forem tomadas, e depressa, estas medidas, fica realmente em perigo o futuro da agricultura e dos agricultores portugueses», conclui a CNA.

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O dinheiro que não há
Ou talvez haja...

Cerca de dois milhões de contos em 1998. A tanto se resume o crédito disponibilizado pelo Estado para a agricultura em crise. E destinado apenas aos agricultores dos concelhos com quebras superiores a 50% e que fizeram seguro de colheita.
As estimativas do custo orçamental desta linha de crédito foram feitas, não com base nos problemas reais – o ministro da Agricultura diz desconhecer quantos agricultores viram a sua produção profundamente afectada pelas intempéries – mas com base no que o Orçamento de Estado poderia disponibilizar.
Entretanto, os cálculos dos técnicos do próprio ministério indicam que a maioria dos concelhos foi atingida e que, no que respeita aos cereais e em particular ao trigo – com particular incidência no Ribatejo e Oeste - a produção de 1998 representou menos 95 por cento do que a produção média anual do quadriénio 1994-97.

Quanto ao dinheiro que se diz não haver, a CNA, no documento divulgado na conferência de imprensa que referimos, levantou algumas questões pertinentes:

— O Orçamento comunitário (FEOGA-Garantia), nas Ajudas à Superfície e o Orçamento português (Ajuda Especial aos Produtores de cereais) vão economizar 11 milhões de contos, por sementeiras de Outono/Inverno que não puderam ser feitas e por cereal não produzido, logo não comercializado.

— Se «agora há mais 55 milhões de contos para meia-dúzia de grandes proprietários absentistas, também tem que haver dinheiro para acudir às dezenas de milhares de agricultores afectados pelas intempéries».


«Avante!» Nº 1287 - 30.Julho.1998