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Ao terminar a festa do «Avante!», no momento culminante que é o comício e que mais uma vez teve a escutá-lo muitos milhares de pessoas - militantes do Partido, amigos, visitantes interessados, muitos jovens -, dessa forma viva e participada como acontece nas iniciativas dos comunistas, começou, de facto, mais uma jornada anual de trabalho político que, afinal, não acaba nunca.

É certo que, no nosso País, é necessário esperar pela festa que todos os anos reune na Atalaia tantos milhares de pessoas para assinalar o momento da rentrée política, o momento de passar a falar-se de coisas sérias após as semanas de férias, ao concluir-se um período que um nosso colaborador chamava na semana passada de «silly season», em que não haveria notícias.
Na realidade, os espectáculos que os outros partidos forneceram aos portugueses, caricaturando iniciativas nacionais, os desafios entre pontinhas, celoricos e outros lugarejos da política menor, nem trouxeram novidades, nem permitiram vislumbrar uma abordagem séria da situação do país, nem definiram perspectivas para o futuro que aí está.
No entanto, ao comentar o discurso de Carlos Carvalhas, houve quem dissesse que este não continha novidade nenhuma.

A ânsia de novidades e de retumbâncias faz com que muitos comentadores e escribas não só as deixam passar por debaixo dos óculos sem dar por elas, como algumas vezes os conduz a inventá-las quando se trata de apreciar as actividades, iniciativas e propostas dos comunistas. Mais uma vez aconteceu com a apreciação que o "Público" mandou fazer a uma sua jornalista que relatou o «vazio» da Festa e inventou um «avanço» do Palco 25 de Abril. Trata-se, porém, de uma rotina que não pretendemos aqui valorizar e que apenas retira credibilidade e leitores a esse jornal. E não será a pequena nota admitindo a custo que «o "Público" errou» que apaga o erro ou que acrescenta leitores à prosa diária de um periódico em crise.
O que gostariam certos comentadores de encontrar no discurso de Carvalhas - e no dos comunistas em geral - era uma nova postura do Partido. Uma aceitação dos dogmas do pensamento único. Uma vassalagem aos contravalores do neoliberalismo. Uma desistência da luta. Um dobrar a cerviz. E, no plano da politiquice nacional, a admissão de que os portugueses se encontrariam na obrigação de escolher entre duas políticas «fundamentais» protagonizadas pelo PS, de um lado, e pelo PSD, do outro. É a recusa dessa postura e a reafirmação de que existem alternativas e de que essas alternativas passam pelo PCP, que os desgosta.

É certo que não é nova esta postura. Que os portugueses - comentadores ou não - certamente esperam que no comício a culminar uma festa como a do «Avante!», uma festa de cultura e de luta, de solidariedade e de internacionalismo, de vontade de construir um país melhor num mundo melhor, que ali se reafirmem valores, se denunciem os crimes e os absurdos do capitalismo e que mais uma vez se sublinhe que «nós não nos resignamos nem aceitamos esta "ordem" pretensamente imutável». Que se sublinhem as lutas travadas pelos trabalhadores, pelos jovens, pelas mulheres e que claramente se demonstre que vale a pena lutar.
É certo que não se trata de uma novidade a crítica aprofundada e séria à continuada política de direita seguida pelo Governo do Partido Socialista.
É certo que não é novo o facto de um discurso do Secretário geral do PCP ir ao fundo dos problemas nacionais, demonstrando que eles se agravam por efeito de uma política apoiada pelo capital e pelos partidos da direita nas suas vertentes fundamentais. Nem será novo que se denunciem as falsas divergências entre o PS instalado no Governo e PSD e PP arvorados em oposição, nem que se desmonte as manobras de diversão que pretendem criar a ideia de falsas alternativas.
Não é novo que o PCP, pela voz dos seus dirigentes e nomeadamente do seu Secretário geral, avance com propostas e medidas como as que Carlos Carvalhas anunciou como necessárias para mudar o rumo a esta política nefasta aos interesses nacionais e aos direitos dos trabalhadores e do povo.

Seria de esperar também que o discurso de encerramento do comício abordasse a tarefa política mais imediata que se perfila: o combate para que vença o sim no referendo - imposto pela direita e vergonhosamente aceite pelo PS - para que a Regionalização venha a ser possível e se dê mais um passo importante na estruturação democrática do País.
Não é de estranhar que os comunistas - nomeadamente o seu Secretário geral - afirmem, porque é essa a sua convicção e apontem a sua necessidade imperiosa, a existência de alternativas à política do Governo. «Esta política não é uma fatalidade», sublinhou Carlos Carvalhas. «Depende de cada um e de todos os que querem uma verdadeira mudança, dos que querem uma política de esquerda, em reforçarem com o seu apoio e o seu voto a CDU e o PCP».
Apelando a que se não aceite a resignação ou o conformismo - a que os comunistas são estranhos - e repudiando o «rotativismo para continuar a política neoliberal com mais ou menos retórica social», Carvalhas afirmou a existência de alternativas.

Há alternativas. E vamos continuar a lutar por elas. É ou não novidade que chegue?


«Avante!» Nº 1293 - 10.Set.98