Modificar comportamentos

A forte afluência de visitantes voltou este ano a ser uma constante no Pavilhão da Mulher. Motivos de interesse, a justificá-la, não faltaram. Fosse pela exposição política, fosse por uma revigoradora pausa na esplanada de apoio à "tendinha" onde segredos caseiros serviram de base a comprovadas delícias, quem por lá passou, não deu o seu tempo por perdido.

Privilegiadamente situado num ponto altaneiro orientado para a vasta Praça da Paz, na Avenida que desagua no palco 25 de Abril, o Pavilhão da Mulher teve ainda uma razão adicional que fez prender a atenção do visitante. Falamos da Boutique de Ocasião, uma novidade que se constituiu à sua escala numa pequena réplica da "Feira da Ladra", onde uma vasta gama de artigos, do livro ao disco ou à peça de vestuário - todos eles oferecidos por militantes comunistas ou simplesmente amigos do Partido - podiam ser obtidos por bom preço.

Mas este ponto de encontro obrigatório de todos quantos estão mais ligados ao movimento feminino teve como momento alto da sua programação o lançamento de um pequeno livro dedicado à problemática da igualdade, das mentalidades e dos comportamentos a ela associados.

Com o sugestivo título "Pensando Duas Vezes... Modificam-se Comportamentos", esta edição de 10 mil exemplares da responsabilidade da Organização das Mulheres Comunistas, que vai agora ser distribuido nas escolas e nos movimentos associativo e sindical, foi ainda pretexto e tema para o debate que a meio da tarde de Sábado juntou uma interessada plateia que encheu por completo a área da esplanada.

Dirigido por Conceição Morais, num ambiente vivo e participado, o debate veio a revelar-se um oportuno momento de reflexão sobre os valores que estão na base das atitudes e comportamentos discriminatórios que ferem e condicionam nos mais variados planos a igualdade entre homens e mulheres.
Marta Ornelas, que ilustrou o livro, sublinhou a sua satisfação por ter dado um "contributo para a luta emancipadora das mulheres", enquanto Regina Marques pôs o acento tónico na "importância da batalha das ideias, pelas nossas convicções", lembrando que para "modificar comportamentos" não basta o "pensamento intimista". "Há que falar, discutir, problematizar com os outros, perceber para onde queremos ir", enfatizou, antes de expressar a convicção de que não é possível "mudar comportamentos se não houver um olhar crítico sobre a sociedade".
Paulo Sucena, por sua vez, chamou a atenção para o facto de cada homem e cada mulher não poderem ser visto isoladamente, uma vez que, lembrou "são eles e as suas circunstâncias" e, como bem sabemos, a "História evolui", as "mentalidades não são iguais", como "não são iguais as circunstâncias". Por si realçado foi também a importância da luta concreta e "seus reflexos na sociedade", bem como do papel do sistema educativo no sentido de um maior igualitarismo, papel esse que, todavia, não pode deixar de ser igualmente assumido pelas famílias.
Da mudança de comportamentos e mentalidades em relação às condições da mulher na sociedade falou ainda, desenvolvidamente, o camarada Aurélio Santos. Analisando a questão desde as "primeiras formações sociais fundadas sobre a propriedade privada" e depois de demonstrar como o "processo histórico de desenvolvimento da sociedade humana mostra uma ligação muito estreita do estatuto da mulher com as estruturas económicas e sociais dominantes e as suas tranformações", fez notar, em conclusão, que "sendo as condições de subordinação social da mulher hoje condicionadas de forma determinante pelas estruturas e concepções ligadas à exploração capitalista, uma mudança de mentalidades em relação à mulher está directamente ligada à luta geral contra a exploração capitalista, pela emancipação dos trabalhadores".

J.C.


«Avante!» Nº 1293 - 10.Set.98