Avanteatro
Silêncio que a peça vai começar!

É talvez o mais difícil de se conseguir na Festa - o silêncio. Outra coisa não seria de esperar de uma festa popular como a que todos os anos os comunistas realizam na Quinta da Atalaia.

Mesmo no grande pavilhão em vinilo, afastado dos palcos principais, o Avanteatro é penetrado pela diversidade de sons e ruídos produzidos nas redondezas, o que inevitavelmente prejudica a representação teatral onde quase sempre tudo assenta na palavra não amplificada.

À partida, dir-se-ia que a falta de silêncio condenaria ao fracasso qualquer espectáculo de teatro. Todavia, a experiência de todos estes anos tem demonstrado exactamente o contrário. As peças são representadas até ao fim e sempre com um sucesso de público assinalável, apesar do barulho, do excesso de luz e dos atrasos a que a programação é muitas vezes sujeita.

Foi o caso de sábado à noite, em que por atrasos acumulados com as sucessivas montagens efectuadas ao longo do dia, a última peça, O Marinheiro, de Fernando Pessoa, levado à cena pela Lente - Teatro de Aumentar, começou uma hora e 15 minutos mais tarde.

Dado o adiantado da hora, o repórter do Avante! temeu o cancelamento do espectáculo por falta de público (fenómeno que de resto não é de todo inédito nas salas de teatro do nosso país, em horários certamente muito mais razoáveis). Porém o inesperado aconteceu. Programada para a meia-noite, as portas do Avanteatro só se abriram de facto à 01.15 horas, mas bastou menos de cinco minutos para que a peça começasse.

Num ápice insuspeitos visitantes que ocupavam esplanadas em redor levantaram-se e encheram mais de meia sala. Ou seja, tal como o repórter do Avante!, cerca de centena e meia de pessoas aguardavam pacientemente o início do espectáculo.

É a este público fiel e sedento que ao longo das 22 Festas do Avante! dezenas de companhias do nosso país apresentaram os seus espectáculos e foi para ele que este ano estiveram na Festa o Teatro de Papel, o CETA - Círculo Esperimental de teatro de Aveiro, o Teatro das Beiras, A Lente - Teatro de Aumentar, o Teatro Extremo, e o Teatro do Morcego.

Pela mesma ordem, levaram à cena as Bodas de Sangue, de Federico García Lorca; O Mestre Fantasia, de Rosa Gadanho; A Boda dos Pequenos Burgueses, de Bertolt Brecht, O Marinheiro, de Fernando Pessoa; O Capuchinho Branco Sujo, de Paulo Duarte e Rui Cerveira; e A Passagem dos Corpos, colagem de textos de Antonin Artaud.


«Avante!» Nº 1293 - 10.Set.98