Encontro nacional de quadros reafirma empenhamento do PCP
Ir às empresas
e estar com os trabalhadores
na luta por vida melhor


Enquanto o Governo se propõe legalizar a acentuação da exploração, os comunistas avançam para o esclarecimento e a mobilização dos trabalhadores em defesa dos direitos conquistados ao longo de décadas e agora ameçados pela generalização do trabalho a tempo parcial - a peça-chave - e demais componentes do pacote laboral do PS.

Quadros comunistas de todo o País, na sua maior parte com responsabilidades no movimento sindical, em comissões de trabalhadores ou em células de empresa e organismos com intervenção em matérias laborais ou sociais, reuniram-se durante o passado sábado, em Lisboa, para debater a situação social, o pacote laboral do Governo do PS, a iniciativa do PCP e o desenvolvimento da luta, com o objectivo de «saber onde estamos e aquilo com que realmente nos confrontamos, para saber para onde vamos e quais os caminhos e que prioridades melhor correspondem às orientações traçadas pelo Partido nos seus diversos níveis», como disse Jerónimo de Sousa.


Jornada nacional

Intervindo na abertura do encontro, este membro da Comissão Política do PCP deu nota da boa aceitação que marcou as acções desenvolvidas durante a jornada de esclarecimento da semana passada, tal como na campanha nacional de Maio-Junho. «Foram importantes estas iniciativas. Foi importante ir lá. Mas o que pode ser determinante para transformar esta reconhecida influência social do Partido em influência política e eleitoral é ir lá, mas também, e mais do que isso, é estar lá», salientou Jerónimo de Sousa. Numa primeira avaliação, «estas acções revelaram não só empenhamento, como criatividade das organizações do Partido, como demonstraram o valor do conteúdo da actividade dos organismos de trabalhadores comunistas, o melhor aproveitamento da informação e da imprensa partidária, uma ligação mais estreita aos trabalhadores, o esclarecimento das posições e análises do Partido e animadoras possibilidades de recrutamento, renovação e rejuvenescimento da própria organização».
Quase todas as intervenções convergiram na apreciação positiva dos resultados mais evidentes da jornada nacional, surgindo vários relatos de acções realizadas à porta de empresas, onde os trabalhadores expressaram a sua satisfação por os comunistas ali levarem a sua mensagem em momentos que não são de eleições. Também se verificaram reacções intempestivas de algumas administrações, como, por exemplo, na AutoEuropa (onde a administração solicitou mesmo a intervenção da GNR para impedir a distribuição de folhetos) e em hipermercados do distrito de Setúbal.
Diversos camaradas referiram, também a propósito da forma como decorreu a jornada, as dificuldades de organização que a sua realização revelou em alguns casos. Foram igualmente relatadas na reunião experiências de algumas importantes organizações regionais, onde foram definidas prioridades e medidas para o reforço da influência e da intervenção do Partido junto dos trabalhadores. «Onde foram tomadas medidas, houve ganhos», destacou Jerónimo de Sousa, na breve intervenção de balanço dos trabalhos do encontro.
Com ligeiras alterações, mereceu «aceitação geral» o documento de referência para a discussão de dia 3, na Junta de Freguesia de Alcântara, e que constitui agora «uma boa base para algumas direcções de trabalho prioritárias».
Foi marcada com fortes aplausos e gritos de «PCP! PCP!», «Assim se vê a força do PC» e «A luta continua» a intervenção de encerramento de Carlos Carvalhas, de que publicamos significativos excertos.

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Contra a lei da selva
trabalho com direitos

— Extractos da intervenção de Carlos Carvalhas —

«(...)
Há uma grande diferença entre o discurso governamental e a prática política.

Quantas vezes não ouvimos o secretário-geral do PS dizer que o avanço da nossa economia não podia assentar nos baixos salários? No entanto, quando se trata do concreto, o que temos é a pressão para a baixa dos salários reais sob o eufemismo da moderação salarial.
Quantas vezes não ouvimos os membros do Governo falar em justiça social e em solidariedade? No entanto, quando olhamos para a distribuição do Rendimento Nacional, o que vemos é a penalização dos salários ano após ano. O crescimento acelerado das grandes fortunas e acentuação das desigualdades são infelizmente uma realidade, 10% da população portuguesa concentra cerca de metade da riqueza nacional.
Quantas vezes não ouvimos também falar em justiça fiscal? No entanto, em todos os orçamentos deste Governo continuaram a aumentar os benefícios fiscais, no essencial dirigidos às actividades financeiras e especulativas e os assalariados continuaram a pagar o grosso dos impostos. Depois, como se sabe, a reforma fiscal é mais uma promessa que ficará dentro da gaveta...
Nos últimos tempos até temos visto o primeiro-ministro criticar, para estrangeiro ver, a globalização e o liberalismo... É caso para perguntar: mas então o PS não esteve de acordo com a Organização Mundial do Comércio, ou com a total liberdade da circulação de capitais, ou com o Pacto de Estabilidade?


O virtual e o real

Poderíamos multiplicar os exemplos. Há de facto uma grande diferença entre a retórica, entre o marketing político e as medidas concretas que pesam na vida das famílias e dos cidadãos.
Se a Expo ’98 ainda não tivesse encerrado, diríamos que entre a política virtual e os conteúdos reais não só não há qualquer coincidência, como o fosso tem vindo a aumentar. Como estamos em época de vindimas - e más -, creio que a imagem que mais se ajusta à política do Governo é a de muita parra e muito pouca uva...
O Governo esteve de acordo e até louvou o «Pacto de Estabilidade», nunca o contestou, nunca juntou a sua voz à de outros governos quando estes defenderam pelo menos a sua flexibilização.
Agora invoca os compromissos com a União Europeia e os critérios de Maastricht, para justificar uma política neoliberal que se tem traduzido no aumento do trabalho precário e clandestino e na insegurança dos vínculos laborais.
Estamos perante um quadro em que é a própria dignidade dos trabalhadores que está posta em causa. O que se pretende no fundo é liquidar, o mais possível, direitos duramente conquistados para que a exploração e a acumulação se realize sem constrangimentos. É a aplicação do chamado «modelo americano» isto é, a lei da selva.
Vejamos o que aconteceu nos Estados Unidos com a aplicação da famosa lei sobre o trabalho parcial que o Governo PS quer agora introduzir em Portugal.
Só entre 1969 e 1994, o número de trabalhadores a tempo parcial passou nos EUA de 6% para 12,9% da população activa. Este crescimento, que se tem mantido, criou neste país uma nova categoria de pobres, que eles designaram por «pobres que trabalham».
Calcula-se que um terço da população activa dos EUA vive numa situação de pobreza.
É isto que se quer para o nosso país?
Quer juntar-se aos milhares de reformados que vivem com reformas de miséria e aos trabalhadores que foram obrigados a reformarem-se antecipadamente, uma nova camada de trabalhadores, uma «geração 2000» sem direitos, sem segurança e ganhando apenas para a sua sobrevivência?
(...)


A crise

Seria bom que o Governo e os socialistas reflectissem nas consequências das políticas neoliberais e na actual crise.
A teologia da soberania do mercado, do mercado global como o decisor a quem se devem submeter os povos, a absolutização da inflação e das medidas monetaristas, bem como as «tretas» de menos Estado, geraram diversas linhas de fundo que têm caracterizado a evolução da economia mundial:

a) a explosão do capital especulativo (80% das transações financeiras não estão ligadas a transações comerciais nem a investimentos);
b) a multiplicação do emprego precário e o desemprego como um fenómeno estrutural e massivo;
c) a aceleração da concentração e centralização de capitais, com as privatizações, fusões e absorções, substituindo empregos relativamente bem pagos por empregos instáveis e mal remunerados;
d) e, como trinco destas linhas de fundo, a acentuação das desigualdades e a concentração da riqueza em níveis sem precedentes.

O absurdo e a irracionalidade da especulação vai ao ponto de, por mais de uma vez, o anúncio da diminuição do desemprego nos EUA se ter traduzido em significativas quedas bolsistas!
Há muito que a ligação entre a especulação bolsista e a diminuição do número de empregos se tem verificado. Quando por exemplo, o Chemical Bank e o Chase Manhattan Bank anunciaram a sua fusão em 1995, lançando no desemprego 16% dos seus empregados, o valor bolsista destas duas sociedades cresceu 11%!
Em Janeiro de 1996, o anúncio de 40 mil despedimentos feitos pela AT&T provocou um aumento em flecha do valor das acções do gigante americano das telecomunicações, mostrando claramente o divórcio entre a economia financeira e o progresso social.
Mas esta economia de casino, contra os trabalhadores e os povos, e as contradições inerentes ao capitalismo acabam por desembocar em crises, como a que estamos a assistir com graves consequências no domínio da actividade económica geral e com sofrimentos sem conta.
Estamos perante uma crise mundial, que assenta no tipo de crescimento que se tem verificado, com a dominação dos mercados financeiros e da especulação fazendo cada vez mais pressão sobre os direitos e os salários dos trabalhadores.
Calcula-se que a actual crise já provocou 10 milhões de desempregados ou seja, um número correspondente à população de Portugal!
E não é com discursos apaziguadores do(s) Ministro(s) das Finanças, nem com o passe de mágica da descida das taxas de juro que a situação se inverte.
A diminuição das taxas de juro sem o aumento do poder de compra das massas populares, sem a taxação (taxa Tobin) dos capitais especulativos e sem a valorização e dignificação de quem trabalha não passará de um paliativo para que o capital financeiro tome mais um pouco de oxigénio para continuar com a sua acção predadora, comprando a pataco empresas rentáveis nos países financeiramente estrangulados. É aliás significativo que o governo japonês queira agora nacionalizar bancos em dificuldades.
É por isso que consideramos que é cada vez mais necessário um novo rumo para a «construção europeia», privilegiando a convergência das economias reais, o princípio da coesão económica e social dando primazia ao combate ao desemprego e ao nivelamento por cima das conquistas sociais e à redução do horário de trabalho sem perda de salários e de direitos. Pensamos que face a esta crise se está em boa altura para se exigir e mostrar como é necessário renegociar o «Pacto de Estabilidade» e dar uma outra orientação ao Banco Central Europeu.
E defendemos também que no nosso país é necessário e urgente equilibrar a distribuição do rendimento nacional, alargar o mercado interno e defender e valorizar o aparelho produtivo nacional e a produção portuguesa.
E por isso temos exigido e continuaremos a lutar pelo aumento das reformas e das pensões, pelo aumento dos vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública, pela diminuição das tarifas da electricidade, pela criação de medidas que venham, já no próximo ano, a atenuar a factura escolar.
(...)

Foi um governo socialista que deixou como triste marca os famigerados contratos a prazo. Agora este governo quer aumentar de três para quatro anos a vigência destes contratos. É uma vergonha!
Nós perguntamos aos socialistas: é com medidas como estas que se ajuda a perspectivar o futuro da juventude? Nós pensamos que não.
Na floresta dos cerca de trinta diplomas, alguns dos quais com medidas que estamos de acordo, escondem-se seis peças essenciais que procuram minar pilares fundamentais do direito ao trabalho. E a primeira, a do trabalho parcial, já está na Assembleia da República para ser submetida à discussão pública.
Com tal medida, o Governo vai pela primeira vez subsidiar o trabalho precário e faculta às empresas, simultaneamente, o acesso a subsídios estatais e a diminuição dos descontos para a Segurança Social.
Permite colocar nalgumas empresas todos os trabalhadores a tempo parcial, com redução do salário, a supressão do subsídio de alimentação e a redução dos subsídios de férias e de Natal! É um mimo, como são um mimo a proposta de alteração à lei das férias submetendo este direito à assiduidade; ou a proposta que altera o conceito de retribuição em que o salário seria desvalorizado; ou as propostas relativas ao regime de trabalho por turnos e ao lay-off.
Até se procura condicionar o direito às férias com a assiduidade, em que conta negativamente as ausências por doença prolongada, por falecimento de um irmão, ou por necessidade de cumprimento de obrigações legais...
São propostas, todas elas, que concedem chorudos benefícios e vantagens para o grande capital, menos receitas para a Segurança Social e maior fragilização e insegurança para os trabalhadores, nomeadamente para os jovens trabalhadores e trabalhadoras.
E tudo isto vindo de um Governo socialista.


A modernidade do PS

Por isso, quando o primeiro-ministro, em discurso solene no dia do encerramento da Expo ’98, lançou um desafio aos portugueses para que o nosso país venha a ser um país tão moderno como os mais modernos, é caso para lhe perguntar qual é a modernidade de entrarmos no próximo século com as mesmas chagas sociais com que os nossos antepassados entraram no século actual.
Qual é a modernidade de oferecer à juventude um futuro de incertezas, de empregos precários e mal pagos, ou a perspectiva do desemprego e da emigração?
Qual é a modernidade de termos de novo meia dúzia de famílias com o seu banco e a sua companhia de seguros, o seu hipermercado e o seu grande meio de comunicação social, lado a lado com milhares e milhares de famílias excluídas de um nível de vida digno e sujeitas a uma vida cada vez mais dura.
Qual é a modernidade de se criar uma nova geração sem direitos e de fragilizar e discriminar ainda mais as mulheres no trabalho, ou qual é a modernidade de termos o poder político cada vez mais submetido, dependente e dominado pelo poder económico?
Qual é a modernidade de termos cada vez mais cidadãos divorciados do país oficial, da intervenção cívica, da participação política, por verem que as suas questões não são debatidas nem resolvidas, por verem que as promessas não são cumpridas?
Não há, de facto, nenhuma modernidade quando vemos que, dos cerca de 1 500 milhares de milhões de dólares que representam no Planeta as transações financeiras, apenas 1% não é de natureza especulativa e é consagrado à criação de novas riquezas.
Não há nenhuma modernidade quando se vê a explosão das riquezas especulativas lado a lado com a espiral das desigualdades, da pobreza e do desemprego; quando a competição é encarada como uma lógica de guerra; quando os Estados se desresponsabilizam das suas funções sociais; quando os custos da solidariedade são considerados pelos grandes senhores da finança insuportáveis e se procura minar e liquidar os principais esquemas de protecção social...
Não há de facto qualquer modernidade quando se vê no «Relatório de Desenvolvimento Humano» de 1998, encomendado pelas Nações Unidas, que na totalidade - e passo a citar - «as nações mais ricas do mundo albergam mais de 100 milhões de pessoas com rendimentos abaixo do nível de pobreza, que mais de 37 milhões estão desempregados, que 100 milhões não têm abrigo e que 200 milhões têm uma expectativa de vida inferior a 60 anos».
Não há demagogia nem retórica social que esconda ou disfarce esta realidade, que tem responsáveis muito concretos e que é a consequência da lei da selva do capitalismo e da sua expressão neoliberal.
Pela nossa parte, tudo faremos para combater no concreto os dogmas do neoliberalismo, as políticas de direita, as políticas de concentração da riqueza.
Ficaram tristemente célebres os pacotes laborais da AD e dos governos do PSD.
Os pacotes laborais do PSD foram derrotados. O deste Governo virá a conta-gotas, para ver se passa e para testar a capacidade de protesto e a extensão da indignação.
O PCP e, estamos certos, o movimento sindical e os trabalhadores em geral não deixarão de dar uma resposta firme, clara e determinada a esta ofensiva. Há condições para derrotar o pacote laboral do PS.
E reafirmo que os portugueses e as portuguesas não estão condenados a terem que estar sujeitos ou a terem apenas de optar entre a política de direita conduzida pela direita ou a política de direita concretizada pelo Governo do PS.
Nós continuamos a intervir e a empenhar os nossos esforços para o desenvolvimento de uma sociedade mais solidária, mais justa, mais humana e uma sociedade sem exploradores e explorados.
(...)»

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Da intervenção de Jerónimo de Sousa:
Impunidade não pode ser lei

«O sentimento de impunidade por parte do patronato acicata-o a introduzir e a concretizar novas, refinadas e por vezes violentas formas de exploração, viradas única e exclusivamente para somar mais lucro ao lucro, ainda que geralmente baptizado de aumento da competitividade das empresas». (...)

«É neste quadro que surge um conjunto enorme de propostas de alteração à legislação laboral, visando mais desregulamentação, numa autêntica operação de minagem a alguns pilares do Direito do Trabalho. Não foi nenhum acto precipitado ou mal avaliado no seu impacto social e laboral. A fonte de inspiração foram os manuais do capital e as receitas neoliberais. E é o pagamento com juros às confederações patronais, pela redução do horário para as 40 horas, que já então consideraram pouco compensadora a inclusão, na lei, da flexibilidade e da polivalência.
«São propostas que já seriam lei, não tivesse havido a luta dos trabalhadores, da CGTP, do movimento sindical e do Partido em torno da defesa do conceito de horário de trabalho, luta notável que conduziu a que o Governo, desde 1996, não avançasse com as restantes medidas configuradas no denominado Acordo de Concertação Estratégica.» (...)

«O facto é que o Governo recuou no tempo e no modo de concretização da ofensiva legislativa. Tal recuo tem significado, não só porque cada dia de vida é vida. O tempo político e eleitoral pode pesar.
«Mas persiste uma questão central: o Governo não vai abdicar dos conteúdos gravosos expressos em 6 ou 7 peças do emaranhado de 34 propostas e, principalmente, da proposta do trabalho a tempo parcial. (...) É o conceito de emprego que está em causa, substituindo-o pela empregabilidade; é forçar por lei a chamada partilha do emprego entre os que o têm e os que estão desempregados, com partilha dos salários, dos subsídios, a par da eliminação e restrição de direitos. (...) O que se quer é transformar a excepção em regra geral.
«Que consequências isso teria num país com salários tão baixos? Que consequências para o estatuto de igualdade da mulher e para as futuras gerações de jovens trabalhadores? Que consequências na luta pela redução do horário de trabalho, no financiamento e nos encargos da Segurança Social, ou , se quisermos, na possibilidade de participação, de sindicalização desse trabalhador, na capacidade de exercer direitos colectivos, como a greve, ser membro de uma CT ou delegado sindical, já que, desesperadamente, teria que encontrar outra metade ou outro terço de emprego?»(...)

Rejuvenescimento

«Hoje existem mutações e alterações na estrutura empresarial e na organização do trabalho, nos valores e até no conteúdo das reivindicações por parte dos trabalhadores e, em particular, da nova geração operária, num quadro que tende a agravar-se face à palavra de ordem e aos objectivos do capitalismo para prosseguir a desregulamentação e aprofundar a precarização, empurrando para fora das empresas e para a reforma a geração mais sindicalizada e com mais consciência de classe. Não há que subestimar esses milhares de camaradas que nas empresas, na frente sindical e nas comissões de trabalhadores foram obreiros das conquistas e direitos e continuam hoje a ser protagonistas na sua defesa e no seu exercício. São indispensáveis mas insuficientes.
«Vamos ter de direccionar o nosso trabalho prioritário para essas novas gerações de trabalhadores, com certeza com formas de intervençãoo e organização inovadoras e audaciosas, mas tendo como ponto de referência e ponto de partida os seus problemas concretos, porque, havendo, como há, muita mudança, os objectivos e a natureza da exploração continuam inalteráveis e mais tarde ou mais cedo são entendidos pelos trabalhadores.»

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Da intervenção de Francisco Lopes:
O PS fecha um ciclo

«O Governo PS (...) não continuou apenas a política de direita, o PS com a sua acção está a completar um ciclo que iniciou há mais de vinte anos.
«Pela mão do PS, verificou-se o rápido reforço dos grupos económicos e financeiros, que adquiriram um enorme poder económico e um crescente controlo sobre a vida nacional» (...).
«As privatizações constituem uma das páginas mais negras da evolução política das últimas duas décadas em Portugal, cuja história um dia há-de ser feita. E é significativo do conteúdo da política do actual Governo que este faça das privatizações um elemento para se diferenciar do Governo anterior por aquilo que há de mais negativo. O PS gaba-se de ter privatizado mais e mais depressa que o PSD.»
(...) «Curiosamente a enorme demagogia em torno do capitalismo popular que atraiu trabalhadores e pequenos accionistas para a compra de acções, e que numa certa fase lhe deu alguns ganhos reais para camuflar os ganhos dos tubarões da finança, mais uma vez está a mostrar a sua falsidade.
(...) «A lógica do lucro leva a que os serviços públicos, sejam geridos, cortando investimento em todas as áreas que não são as mais lucrativas, pondo em causa a qualidade dos serviços, e conduzindo ao aumento dos preços, ou á manutenção de preços injustificadamente altos. É isso que sucede com os preços da electricidade, em relação aos quais o nosso Partido, tomou oportunamente a iniciativa de propor a sua redução em 15%, tendo presente os elevadíssimos lucros da EDP.
«A mesma lógica de subordinação de tudo ao critério do lucro, é responsável por sérios ataques aos interesses dos trabalhadores. O processo de privatizações significou a liquidação de dezenas de milhar de postos de trabalho, a eliminação de direitos, o corte de regalias, a intensificação dos ritmos de trabalho e as pressões para a limitação do espaço de liberdade e acção e organização dos trabalhadores e das suas organizações representativas.»

Luta de massas

«O nosso Partido tem pela frente um quadro político em que se destaca o referendo sobre a Regionalização, os problemas resultantes da política do Governo e da situação social e em que se colocam já no horizonte as eleições para o Parlamento Europeu e as eleições legislativas.
«Neste quadro, múltiplas linhas de trabalho se colocam, mas de entre elas destaca-se sem duvida o desenvolvimento da luta de massas. O desenvolvimento da luta contra o pacote laboral, em defesa da Segurança Social, contra as privatizações, pelo aumento dos salários, contra as discriminações, pela defesa e concretização de direitos, pela redução do horário de trabalho, contra a injustiça fiscal.
«O desenvolvimento da luta de massas, articulado com a acção política do Partido, é sempre necessário, mas é essencial nos próximos tempos.»(...)

«A organização partidária assume uma grande importância. (...) O reforço da organização e, em particular, da organização e intervenção do Partido junto da classe operária e dos trabalhadores é um aspecto estratégico fundamental para o seu reforço, para a concretização dos seus objectivos, do seu projecto de transformação social.
«Definimos orientações ao longo dos anos, realizámos a Conferência Nacional, o XV Congresso reafirmou essas direcções de trabalho, que o CC estimulou, e muitas medidas foram de facto tomadas, com destaque para as adoptadas por algumas DOR. (...)
«Impõe-se uma decidida acção para concretizar as medidas decididas e para adoptar muitas mais, de modo a conseguir que o Partido tenha uma maior ligação aos trabalhadores, tenha mais e mais fortes colectivos nas empresas e sectores, raízes da sua força e factor de irradiação da sua influência.
«Este é o caminho, porque os trabalhadores precisam do PCP e o PCP precisa dos trabalhadores, na luta de todos os dias em torno das reivindicações mais imediatas, na luta por uma alternativa de esquerda e por uma democracia avançada, na luta contra o capitalismo por uma nova sociedade.»

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O debate
Belmiros, pacotes
e resultados da luta

O encontro nacional do dia 3 prolongou-se durante cerca de cinco horas, permitindo que umas três dezenas de camaradas relatassem experiências, expressassem preocupações, fizessem críticas e elogios, apontassem propostas e soluções, denunciassem fraudes e injustiças, reafirmassem esperanças e opções de luta. Não se tratava de um congresso, nem de um comício, mas isso não impediu que as intervenções (em grande parte, não escritas) mostrassem uma anterior reflexão profunda, nem que os aplausos e as palavras de ordem ecoassem vigorosamente no salão da Junta de Freguesia de Alcântara.

A «estrela» da reunião foi a jornada de esclarecimento levada a cabo pelos comunistas, a nível nacional, durante a última semana. O «bombo da festa» foi o pacote laboral que o Governo do PS já começou a despachar, com realce para a proposta de lei sobre a generalização do trabalho a tempo parcial. O «busílis da questão» foi o reforço da influência e da intervenção do PCP, como factor determinante para garantir a defesa dos direitos dos trabalhadores face à poderosa ofensiva de que estão a ser alvo.
Da jornada, que se saldou em inúmeras acções de distribuição do folheto central e várias iniciativas de venda do «Avante!», falaram camaradas do Comité Central e responsáveis e outros membros de direcções regionais e comissões concelhias, de Setúbal ao Porto, de Lisboa a Évora ou Viseu. Dirigentes e delegados sindicais - dos químicos ao calçado, do comércio aos metalúrgicos ou à administração pública - e activistas de células do Partido em empresas referiram os perigos da eventual aplicação das alterações legislativas que o Governo patrocina, a partir dos acordos engendrados na Concertação Estratégica.

José Ernesto Cartaxo fez o primeiro apelo à mobilização dos trabalhadores para a semana de luta que a CGTP já marcou para a semana de 26 a 31 deste mês. Paulo Raimundo realçou as graves implicações que o novo pacote teria nas já precárias condições de trabalho dos jovens.
José Paleta sublinhou que «sem células de empresa, este Partido não seria o mesmo». Ana Avoila chamou a atenção para o facto de os trabalhadores do Estado também serem atingidos pelo pacote e, sobretudo, pela política de privatização dos serviços públicos, que afecta trabalhadores e utentes. António Tremoço salientou que os problemas do trabalho do Partido nas empresas devem merecer a atenção de todo o colectivo partidário, prevenindo o surgimento de organismos estanques.
A batalha pela concretização das regiões administrativas foi um dos temas centrais da intervenção de António Andrez, responsável da direcção regional de Lisboa na Comissão Política, que criticou ainda algumas ideias que começam a surgir, de outros quadrantes políticos, a propósito das comemorações dos 25 anos da revolução de Abril.
Manuel Carvalho da Silva recordou que «obtivemos resultados das lutas em que nos empenhámos», e referiu que o Governo ainda não deu por concluído o texto do diploma sobre o conceito de retribuição, o que mostra que a luta e os protestos podem travar o aparecimento de novas doses do pacote laboral. Arménio Carlos recordou outros pacotes, justificados com promessas que nunca se concretizaram, e defendeu como preocupação real quanto às próximas gerações «dar ao nossos filhos, no mínimo, o que obtivemos» com Abril e a luta de décadas.
Belmiro de Azevedo esteve no encontro pelas vozes de Fátima Neves e Manuel Guerreiro, como «inovador» nas formas de exploração que implantou nas empresas da Sonae, sem esperar pela cobertura legal que o Governo agora pretende alargar a outros belmiros e, pior ainda, como potencial beneficiário das pretendidas alterações legislativas, uma vez que estas poderiam liquidar benefícios que, contra todas as dificuldades e pressões, já foram conquistados nos hipermercados, com a luta dos trabalhadores. — Domingos Mealha


«Avante!» Nº 1297 - 8.Outubro.1998