Encontro nacional de quadros reafirma empenhamento do PCP
Ir
às empresas
e estar com os trabalhadores
na luta por vida melhor
Enquanto o Governo se propõe legalizar a acentuação da exploração, os comunistas avançam para o esclarecimento e a mobilização dos trabalhadores em defesa dos direitos conquistados ao longo de décadas e agora ameçados pela generalização do trabalho a tempo parcial - a peça-chave - e demais componentes do pacote laboral do PS.
Quadros comunistas de todo o País, na sua maior parte com responsabilidades no movimento sindical, em comissões de trabalhadores ou em células de empresa e organismos com intervenção em matérias laborais ou sociais, reuniram-se durante o passado sábado, em Lisboa, para debater a situação social, o pacote laboral do Governo do PS, a iniciativa do PCP e o desenvolvimento da luta, com o objectivo de «saber onde estamos e aquilo com que realmente nos confrontamos, para saber para onde vamos e quais os caminhos e que prioridades melhor correspondem às orientações traçadas pelo Partido nos seus diversos níveis», como disse Jerónimo de Sousa.
Jornada nacional
Intervindo na
abertura do encontro, este membro da Comissão Política do PCP
deu nota da boa aceitação que marcou as acções desenvolvidas
durante a jornada de esclarecimento da semana passada, tal como
na campanha nacional de Maio-Junho. «Foram importantes estas
iniciativas. Foi importante ir lá. Mas o que pode ser
determinante para transformar esta reconhecida influência social
do Partido em influência política e eleitoral é ir
lá, mas também, e mais do que isso, é estar
lá», salientou Jerónimo de Sousa. Numa primeira
avaliação, «estas acções revelaram não só empenhamento,
como criatividade das organizações do Partido, como
demonstraram o valor do conteúdo da actividade dos organismos de
trabalhadores comunistas, o melhor aproveitamento da informação
e da imprensa partidária, uma ligação mais estreita aos
trabalhadores, o esclarecimento das posições e análises do
Partido e animadoras possibilidades de recrutamento, renovação
e rejuvenescimento da própria organização».
Quase todas as intervenções convergiram na apreciação
positiva dos resultados mais evidentes da jornada nacional,
surgindo vários relatos de acções realizadas à porta de
empresas, onde os trabalhadores expressaram a sua satisfação
por os comunistas ali levarem a sua mensagem em momentos que não
são de eleições. Também se verificaram reacções
intempestivas de algumas administrações, como, por exemplo, na
AutoEuropa (onde a administração solicitou mesmo a
intervenção da GNR para impedir a distribuição de folhetos) e
em hipermercados do distrito de Setúbal.
Diversos camaradas referiram, também a propósito da forma como
decorreu a jornada, as dificuldades de organização que a sua
realização revelou em alguns casos. Foram igualmente relatadas
na reunião experiências de algumas importantes organizações
regionais, onde foram definidas prioridades e medidas para o
reforço da influência e da intervenção do Partido junto dos
trabalhadores. «Onde foram tomadas medidas, houve ganhos»,
destacou Jerónimo de Sousa, na breve intervenção de balanço
dos trabalhos do encontro.
Com ligeiras alterações, mereceu «aceitação geral» o
documento de referência para a discussão de dia 3, na Junta de
Freguesia de Alcântara, e que constitui agora «uma boa base
para algumas direcções de trabalho prioritárias».
Foi marcada com fortes aplausos e gritos de «PCP! PCP!»,
«Assim se vê a força do PC» e «A luta continua» a
intervenção de encerramento de Carlos Carvalhas, de que
publicamos significativos excertos.
_____
Contra
a lei da selva
trabalho com direitos
Extractos da intervenção de Carlos Carvalhas
«(...)
Há uma grande diferença entre o discurso governamental e a
prática política.
Quantas vezes não ouvimos o
secretário-geral do PS dizer que o avanço da nossa economia
não podia assentar nos baixos salários? No entanto, quando se
trata do concreto, o que temos é a pressão para a baixa dos
salários reais sob o eufemismo da moderação salarial.
Quantas vezes não ouvimos os membros do Governo falar em
justiça social e em solidariedade? No entanto, quando olhamos
para a distribuição do Rendimento Nacional, o que vemos é a
penalização dos salários ano após ano. O crescimento
acelerado das grandes fortunas e acentuação das desigualdades
são infelizmente uma realidade, 10% da população portuguesa
concentra cerca de metade da riqueza nacional.
Quantas vezes não ouvimos também falar em justiça fiscal? No
entanto, em todos os orçamentos deste Governo continuaram
a aumentar os benefícios fiscais, no essencial dirigidos às
actividades financeiras e especulativas e os assalariados
continuaram a pagar o grosso dos impostos. Depois, como se sabe,
a reforma fiscal é mais uma promessa que ficará dentro da
gaveta...
Nos últimos tempos até temos visto o primeiro-ministro
criticar, para estrangeiro ver, a globalização e o
liberalismo... É caso para perguntar: mas então o PS não
esteve de acordo com a Organização Mundial do Comércio, ou com
a total liberdade da circulação de capitais, ou com o Pacto de
Estabilidade?
O virtual e o real
Poderíamos
multiplicar os exemplos. Há de facto uma grande diferença entre
a retórica, entre o marketing político e as medidas
concretas que pesam na vida das famílias e dos cidadãos.
Se a Expo 98 ainda não tivesse encerrado, diríamos que
entre a política virtual e os conteúdos reais não só não há
qualquer coincidência, como o fosso tem vindo a aumentar. Como
estamos em época de vindimas - e más -, creio que a imagem que
mais se ajusta à política do Governo é a de muita parra e
muito pouca uva...
O Governo esteve de acordo e até louvou o «Pacto de
Estabilidade», nunca o contestou, nunca juntou a sua voz à de
outros governos quando estes defenderam pelo menos a sua
flexibilização.
Agora invoca os compromissos com a União Europeia e os
critérios de Maastricht, para justificar uma política
neoliberal que se tem traduzido no aumento do trabalho precário
e clandestino e na insegurança dos vínculos laborais.
Estamos perante um quadro em que é a própria dignidade dos
trabalhadores que está posta em causa. O que se pretende no
fundo é liquidar, o mais possível, direitos duramente
conquistados para que a exploração e a acumulação se realize
sem constrangimentos. É a aplicação do chamado «modelo
americano» isto é, a lei da selva.
Vejamos o que aconteceu nos Estados Unidos com a aplicação da famosa
lei sobre o trabalho parcial que o Governo PS quer agora
introduzir em Portugal.
Só entre 1969 e 1994, o número de trabalhadores a tempo
parcial passou nos EUA de 6% para 12,9% da população activa.
Este crescimento, que se tem mantido, criou neste país uma nova
categoria de pobres, que eles designaram por «pobres que
trabalham».
Calcula-se que um terço da população activa dos EUA vive numa
situação de pobreza.
É isto que se quer para o nosso país? Quer juntar-se aos
milhares de reformados que vivem com reformas de miséria e aos
trabalhadores que foram obrigados a reformarem-se
antecipadamente, uma nova camada de trabalhadores, uma
«geração 2000» sem direitos, sem segurança e ganhando apenas
para a sua sobrevivência?
(...)
A crise
Seria bom que o
Governo e os socialistas reflectissem nas consequências das
políticas neoliberais e na actual crise.
A teologia da soberania do mercado, do mercado global como o
decisor a quem se devem submeter os povos, a absolutização da
inflação e das medidas monetaristas, bem como as «tretas» de
menos Estado, geraram diversas linhas de fundo que têm
caracterizado a evolução da economia mundial:
a) a explosão do capital especulativo (80% das transações financeiras não estão ligadas a transações comerciais nem a investimentos);
b) a multiplicação do emprego precário e o desemprego como um fenómeno estrutural e massivo;
c) a aceleração da concentração e centralização de capitais, com as privatizações, fusões e absorções, substituindo empregos relativamente bem pagos por empregos instáveis e mal remunerados;
d) e, como trinco destas linhas de fundo, a acentuação das desigualdades e a concentração da riqueza em níveis sem precedentes.
O absurdo e a
irracionalidade da especulação vai ao ponto de, por mais
de uma vez, o anúncio da diminuição do desemprego nos EUA
se ter traduzido em significativas quedas bolsistas!
Há muito que a ligação entre a especulação bolsista e a
diminuição do número de empregos se tem verificado. Quando por
exemplo, o Chemical Bank e o Chase Manhattan Bank anunciaram a
sua fusão em 1995, lançando no desemprego 16% dos seus
empregados, o valor bolsista destas duas sociedades cresceu 11%!
Em Janeiro de 1996, o anúncio de 40 mil despedimentos feitos
pela AT&T provocou um aumento em flecha do valor das acções
do gigante americano das telecomunicações, mostrando claramente
o divórcio entre a economia financeira e o progresso social.
Mas esta economia de casino, contra os trabalhadores e os
povos, e as contradições inerentes ao capitalismo acabam por
desembocar em crises, como a que estamos a assistir com graves
consequências no domínio da actividade económica geral e com
sofrimentos sem conta.
Estamos perante uma crise mundial, que assenta no tipo de
crescimento que se tem verificado, com a dominação dos mercados
financeiros e da especulação fazendo cada vez mais pressão
sobre os direitos e os salários dos trabalhadores.
Calcula-se que a actual crise já provocou 10 milhões de
desempregados ou seja, um número correspondente à população
de Portugal!
E não é com discursos apaziguadores do(s) Ministro(s) das
Finanças, nem com o passe de mágica da descida das taxas de
juro que a situação se inverte.
A diminuição das taxas de juro sem o aumento do poder de compra
das massas populares, sem a taxação (taxa Tobin) dos capitais
especulativos e sem a valorização e dignificação de quem
trabalha não passará de um paliativo para que o capital
financeiro tome mais um pouco de oxigénio para continuar com a
sua acção predadora, comprando a pataco empresas rentáveis nos
países financeiramente estrangulados. É aliás significativo
que o governo japonês queira agora nacionalizar bancos em
dificuldades.
É por isso que consideramos que é cada vez mais necessário
um novo rumo para a «construção europeia», privilegiando
a convergência das economias reais, o princípio da coesão
económica e social dando primazia ao combate ao desemprego e ao
nivelamento por cima das conquistas sociais e à redução do
horário de trabalho sem perda de salários e de direitos.
Pensamos que face a esta crise se está em boa altura para se
exigir e mostrar como é necessário renegociar o «Pacto de
Estabilidade» e dar uma outra orientação ao Banco Central
Europeu.
E defendemos também que no nosso país é necessário e
urgente equilibrar a distribuição do rendimento nacional,
alargar o mercado interno e defender e valorizar o aparelho
produtivo nacional e a produção portuguesa.
E por isso temos exigido e continuaremos a lutar pelo aumento das
reformas e das pensões, pelo aumento dos vencimentos dos
trabalhadores da Administração Pública, pela diminuição das
tarifas da electricidade, pela criação de medidas que venham,
já no próximo ano, a atenuar a factura escolar.
(...)
Foi um governo
socialista que deixou como triste marca os famigerados contratos
a prazo. Agora este governo quer aumentar de três para quatro
anos a vigência destes contratos. É uma vergonha!
Nós perguntamos aos socialistas: é com medidas como estas que
se ajuda a perspectivar o futuro da juventude? Nós pensamos que
não.
Na floresta dos cerca de trinta diplomas, alguns dos quais com
medidas que estamos de acordo, escondem-se seis peças essenciais
que procuram minar pilares fundamentais do direito ao trabalho. E
a primeira, a do trabalho parcial, já está na Assembleia da
República para ser submetida à discussão pública.
Com tal medida, o Governo vai pela primeira vez subsidiar o
trabalho precário e faculta às empresas, simultaneamente, o
acesso a subsídios estatais e a diminuição dos descontos para
a Segurança Social.
Permite colocar nalgumas empresas todos os trabalhadores a tempo
parcial, com redução do salário, a supressão do subsídio de
alimentação e a redução dos subsídios de férias e de Natal!
É um mimo, como são um mimo a proposta de alteração à lei
das férias submetendo este direito à assiduidade; ou a proposta
que altera o conceito de retribuição em que o salário seria
desvalorizado; ou as propostas relativas ao regime de trabalho
por turnos e ao lay-off.
Até se procura condicionar o direito às férias com a
assiduidade, em que conta negativamente as ausências por doença
prolongada, por falecimento de um irmão, ou por necessidade de
cumprimento de obrigações legais...
São propostas, todas elas, que concedem chorudos benefícios e
vantagens para o grande capital, menos receitas para a Segurança
Social e maior fragilização e insegurança para os
trabalhadores, nomeadamente para os jovens trabalhadores e
trabalhadoras.
E tudo isto vindo de um Governo socialista.
A modernidade do PS
Por isso, quando o
primeiro-ministro, em discurso solene no dia do encerramento da
Expo 98, lançou um desafio aos portugueses para que o
nosso país venha a ser um país tão moderno como os mais
modernos, é caso para lhe perguntar qual é a modernidade de
entrarmos no próximo século com as mesmas chagas sociais com
que os nossos antepassados entraram no século actual.
Qual é a modernidade de oferecer à juventude um futuro de
incertezas, de empregos precários e mal pagos, ou a perspectiva
do desemprego e da emigração?
Qual é a modernidade de termos de novo meia dúzia de famílias
com o seu banco e a sua companhia de seguros, o seu hipermercado
e o seu grande meio de comunicação social, lado a lado com
milhares e milhares de famílias excluídas de um nível de vida
digno e sujeitas a uma vida cada vez mais dura.
Qual é a modernidade de se criar uma nova geração sem direitos
e de fragilizar e discriminar ainda mais as mulheres no trabalho,
ou qual é a modernidade de termos o poder político cada vez
mais submetido, dependente e dominado pelo poder económico?
Qual é a modernidade de termos cada vez mais cidadãos
divorciados do país oficial, da intervenção cívica, da
participação política, por verem que as suas questões não
são debatidas nem resolvidas, por verem que as promessas não
são cumpridas?
Não há, de facto, nenhuma modernidade quando vemos que, dos
cerca de 1 500 milhares de milhões de dólares que representam
no Planeta as transações financeiras, apenas 1% não é de
natureza especulativa e é consagrado à criação de novas
riquezas.
Não há nenhuma modernidade quando se vê a explosão das
riquezas especulativas lado a lado com a espiral das
desigualdades, da pobreza e do desemprego; quando a competição
é encarada como uma lógica de guerra; quando os Estados se
desresponsabilizam das suas funções sociais; quando os custos
da solidariedade são considerados pelos grandes senhores da
finança insuportáveis e se procura minar e liquidar os
principais esquemas de protecção social...
Não há de facto qualquer modernidade quando se vê no
«Relatório de Desenvolvimento Humano» de 1998, encomendado
pelas Nações Unidas, que na totalidade - e passo a citar - «as
nações mais ricas do mundo albergam mais de 100 milhões de
pessoas com rendimentos abaixo do nível de pobreza, que mais de
37 milhões estão desempregados, que 100 milhões não têm
abrigo e que 200 milhões têm uma expectativa de vida inferior a
60 anos».
Não há demagogia nem retórica social que esconda ou
disfarce esta realidade, que tem responsáveis muito concretos e
que é a consequência da lei da selva do capitalismo e da sua
expressão neoliberal.
Pela nossa parte, tudo faremos para combater no concreto os
dogmas do neoliberalismo, as políticas de direita, as políticas
de concentração da riqueza.
Ficaram tristemente célebres os pacotes laborais da AD e
dos governos do PSD.
Os pacotes laborais do PSD foram derrotados. O deste
Governo virá a conta-gotas, para ver se passa e para testar a
capacidade de protesto e a extensão da indignação.
O PCP e, estamos certos, o movimento sindical e os trabalhadores
em geral não deixarão de dar uma resposta firme, clara e
determinada a esta ofensiva. Há condições para derrotar o pacote
laboral do PS.
E reafirmo que os portugueses e as portuguesas não estão
condenados a terem que estar sujeitos ou a terem apenas de optar
entre a política de direita conduzida pela direita ou a
política de direita concretizada pelo Governo do PS.
Nós continuamos a intervir e a empenhar os nossos esforços para
o desenvolvimento de uma sociedade mais solidária, mais justa,
mais humana e uma sociedade sem exploradores e explorados.
(...)»
_____
Da intervenção de Jerónimo de Sousa:
Impunidade
não pode ser lei
«O sentimento de impunidade por parte do patronato acicata-o a introduzir e a concretizar novas, refinadas e por vezes violentas formas de exploração, viradas única e exclusivamente para somar mais lucro ao lucro, ainda que geralmente baptizado de aumento da competitividade das empresas». (...)
«É neste quadro
que surge um conjunto enorme de propostas de alteração à
legislação laboral, visando mais desregulamentação, numa
autêntica operação de minagem a alguns pilares do Direito do
Trabalho. Não foi nenhum acto precipitado ou mal avaliado no seu
impacto social e laboral. A fonte de inspiração foram os
manuais do capital e as receitas neoliberais. E é o pagamento
com juros às confederações patronais, pela redução do
horário para as 40 horas, que já então consideraram pouco
compensadora a inclusão, na lei, da flexibilidade e da
polivalência.
«São propostas que já seriam lei, não tivesse havido a luta
dos trabalhadores, da CGTP, do movimento sindical e do Partido em
torno da defesa do conceito de horário de trabalho, luta
notável que conduziu a que o Governo, desde 1996, não
avançasse com as restantes medidas configuradas no denominado
Acordo de Concertação Estratégica.» (...)
«O facto é que o
Governo recuou no tempo e no modo de concretização da ofensiva
legislativa. Tal recuo tem significado, não só porque cada dia
de vida é vida. O tempo político e eleitoral pode pesar.
«Mas persiste uma questão central: o Governo não vai abdicar
dos conteúdos gravosos expressos em 6 ou 7 peças do emaranhado
de 34 propostas e, principalmente, da proposta do trabalho a
tempo parcial. (...) É o conceito de emprego que está em causa,
substituindo-o pela empregabilidade; é forçar por lei a chamada
partilha do emprego entre os que o têm e os que estão
desempregados, com partilha dos salários, dos subsídios, a par
da eliminação e restrição de direitos. (...) O que se quer é
transformar a excepção em regra geral.
«Que consequências isso teria num país com salários tão
baixos? Que consequências para o estatuto de igualdade da mulher
e para as futuras gerações de jovens trabalhadores? Que
consequências na luta pela redução do horário de trabalho, no
financiamento e nos encargos da Segurança Social, ou , se
quisermos, na possibilidade de participação, de
sindicalização desse trabalhador, na capacidade de exercer
direitos colectivos, como a greve, ser membro de uma CT ou
delegado sindical, já que, desesperadamente, teria que encontrar
outra metade ou outro terço de emprego?»(...)
Rejuvenescimento
«Hoje existem
mutações e alterações na estrutura empresarial e na
organização do trabalho, nos valores e até no conteúdo das
reivindicações por parte dos trabalhadores e, em particular, da
nova geração operária, num quadro que tende a agravar-se face
à palavra de ordem e aos objectivos do capitalismo para
prosseguir a desregulamentação e aprofundar a precarização,
empurrando para fora das empresas e para a reforma a geração
mais sindicalizada e com mais consciência de classe. Não há
que subestimar esses milhares de camaradas que nas empresas, na
frente sindical e nas comissões de trabalhadores foram obreiros
das conquistas e direitos e continuam hoje a ser protagonistas na
sua defesa e no seu exercício. São indispensáveis mas
insuficientes.
«Vamos ter de direccionar o nosso trabalho prioritário para
essas novas gerações de trabalhadores, com certeza com formas
de intervençãoo e organização inovadoras e audaciosas, mas
tendo como ponto de referência e ponto de partida os seus
problemas concretos, porque, havendo, como há, muita mudança,
os objectivos e a natureza da exploração continuam
inalteráveis e mais tarde ou mais cedo são entendidos pelos
trabalhadores.»
_____
Da intervenção de Francisco Lopes:
O PS
fecha um ciclo
«O Governo PS (...)
não continuou apenas a política de direita, o PS com a sua
acção está a completar um ciclo que iniciou há mais de vinte
anos.
«Pela mão do PS, verificou-se o rápido reforço dos grupos
económicos e financeiros, que adquiriram um enorme poder
económico e um crescente controlo sobre a vida nacional» (...).
«As privatizações constituem uma das páginas mais negras da
evolução política das últimas duas décadas em Portugal, cuja
história um dia há-de ser feita. E é significativo do
conteúdo da política do actual Governo que este faça das
privatizações um elemento para se diferenciar do Governo
anterior por aquilo que há de mais negativo. O PS gaba-se de ter
privatizado mais e mais depressa que o PSD.»
(...) «Curiosamente a enorme demagogia em torno do capitalismo
popular que atraiu trabalhadores e pequenos accionistas para a
compra de acções, e que numa certa fase lhe deu alguns ganhos
reais para camuflar os ganhos dos tubarões da finança, mais uma
vez está a mostrar a sua falsidade.
(...) «A lógica do lucro leva a que os serviços públicos,
sejam geridos, cortando investimento em todas as áreas que não
são as mais lucrativas, pondo em causa a qualidade dos
serviços, e conduzindo ao aumento dos preços, ou á
manutenção de preços injustificadamente altos. É isso que
sucede com os preços da electricidade, em relação aos quais o
nosso Partido, tomou oportunamente a iniciativa de propor a sua
redução em 15%, tendo presente os elevadíssimos lucros da EDP.
«A mesma lógica de subordinação de tudo ao critério do
lucro, é responsável por sérios ataques aos interesses dos
trabalhadores. O processo de privatizações significou a
liquidação de dezenas de milhar de postos de trabalho, a
eliminação de direitos, o corte de regalias, a intensificação
dos ritmos de trabalho e as pressões para a limitação do
espaço de liberdade e acção e organização dos trabalhadores
e das suas organizações representativas.»
Luta de massas
«O nosso Partido
tem pela frente um quadro político em que se destaca o referendo
sobre a Regionalização, os problemas resultantes da política
do Governo e da situação social e em que se colocam já no
horizonte as eleições para o Parlamento Europeu e as eleições
legislativas.
«Neste quadro, múltiplas linhas de trabalho se colocam, mas de
entre elas destaca-se sem duvida o desenvolvimento da luta de
massas. O desenvolvimento da luta contra o pacote laboral,
em defesa da Segurança Social, contra as privatizações, pelo
aumento dos salários, contra as discriminações, pela defesa e
concretização de direitos, pela redução do horário de
trabalho, contra a injustiça fiscal.
«O desenvolvimento da luta de massas, articulado com a acção
política do Partido, é sempre necessário, mas é essencial nos
próximos tempos.»(...)
«A organização
partidária assume uma grande importância. (...) O reforço da
organização e, em particular, da organização e intervenção
do Partido junto da classe operária e dos trabalhadores é um
aspecto estratégico fundamental para o seu reforço, para a
concretização dos seus objectivos, do seu projecto de
transformação social.
«Definimos orientações ao longo dos anos, realizámos a
Conferência Nacional, o XV Congresso reafirmou essas direcções
de trabalho, que o CC estimulou, e muitas medidas foram de facto
tomadas, com destaque para as adoptadas por algumas DOR. (...)
«Impõe-se uma decidida acção para concretizar as medidas
decididas e para adoptar muitas mais, de modo a conseguir que o
Partido tenha uma maior ligação aos trabalhadores, tenha mais e
mais fortes colectivos nas empresas e sectores, raízes da sua
força e factor de irradiação da sua influência.
«Este é o caminho, porque os trabalhadores precisam do PCP e o
PCP precisa dos trabalhadores, na luta de todos os dias em torno
das reivindicações mais imediatas, na luta por uma alternativa
de esquerda e por uma democracia avançada, na luta contra o
capitalismo por uma nova sociedade.»
_____
O
debate
Belmiros, pacotes
e resultados da luta
O encontro nacional do dia 3 prolongou-se durante cerca de cinco horas, permitindo que umas três dezenas de camaradas relatassem experiências, expressassem preocupações, fizessem críticas e elogios, apontassem propostas e soluções, denunciassem fraudes e injustiças, reafirmassem esperanças e opções de luta. Não se tratava de um congresso, nem de um comício, mas isso não impediu que as intervenções (em grande parte, não escritas) mostrassem uma anterior reflexão profunda, nem que os aplausos e as palavras de ordem ecoassem vigorosamente no salão da Junta de Freguesia de Alcântara.
A «estrela» da
reunião foi a jornada de esclarecimento levada a cabo pelos
comunistas, a nível nacional, durante a última semana. O
«bombo da festa» foi o pacote laboral que o Governo do
PS já começou a despachar, com realce para a proposta de
lei sobre a generalização do trabalho a tempo parcial. O
«busílis da questão» foi o reforço da influência e da
intervenção do PCP, como factor determinante para garantir a
defesa dos direitos dos trabalhadores face à poderosa ofensiva
de que estão a ser alvo.
Da jornada, que se saldou em inúmeras acções de distribuição
do folheto central e várias iniciativas de venda do «Avante!»,
falaram camaradas do Comité Central e responsáveis e outros
membros de direcções regionais e comissões concelhias, de
Setúbal ao Porto, de Lisboa a Évora ou Viseu. Dirigentes e
delegados sindicais - dos químicos ao calçado, do comércio aos
metalúrgicos ou à administração pública - e activistas de
células do Partido em empresas referiram os perigos da eventual
aplicação das alterações legislativas que o Governo
patrocina, a partir dos acordos engendrados na Concertação
Estratégica.
José
Ernesto Cartaxo fez o primeiro apelo à mobilização
dos trabalhadores para a semana de luta que a CGTP já marcou
para a semana de 26 a 31 deste mês. Paulo Raimundo realçou as
graves implicações que o novo pacote teria nas já
precárias condições de trabalho dos jovens.
José Paleta sublinhou que «sem células de empresa, este
Partido não seria o mesmo». Ana Avoila chamou
a atenção para o facto de os trabalhadores do Estado também
serem atingidos pelo pacote e, sobretudo, pela política
de privatização dos serviços públicos, que afecta
trabalhadores e utentes. António Tremoço
salientou que os problemas do trabalho do Partido nas empresas
devem merecer a atenção de todo o colectivo partidário,
prevenindo o surgimento de organismos estanques.
A batalha pela concretização das regiões administrativas foi
um dos temas centrais da intervenção de António Andrez,
responsável da direcção regional de Lisboa na Comissão
Política, que criticou ainda algumas ideias que começam a
surgir, de outros quadrantes políticos, a propósito das
comemorações dos 25 anos da revolução de Abril.
Manuel Carvalho da Silva recordou que
«obtivemos resultados das lutas em que nos empenhámos», e
referiu que o Governo ainda não deu por concluído o texto do
diploma sobre o conceito de retribuição, o que mostra que a
luta e os protestos podem travar o aparecimento de novas doses do
pacote laboral. Arménio Carlos recordou outros pacotes,
justificados com promessas que nunca se concretizaram, e defendeu
como preocupação real quanto às próximas gerações «dar ao
nossos filhos, no mínimo, o que obtivemos» com Abril e a luta
de décadas.
Belmiro de Azevedo esteve no encontro pelas vozes de Fátima
Neves e Manuel Guerreiro, como
«inovador» nas formas de exploração que implantou nas
empresas da Sonae, sem esperar pela cobertura legal que o Governo
agora pretende alargar a outros belmiros e, pior ainda, como
potencial beneficiário das pretendidas alterações
legislativas, uma vez que estas poderiam liquidar benefícios
que, contra todas as dificuldades e pressões, já foram
conquistados nos hipermercados, com a luta dos trabalhadores.
Domingos Mealha