Gestão
dos oceanos
diz respeito a toda a Humanidade
relatório de Lino de Carvalho aprovado no Conselho da Europa
A gestão dos recursos vivos marinhos, e dos oceanos em geral, é uma questão que diz respeito a toda a Humanidade e a todas as gerações, pelo que a nossa geração não tem o direito de, em nome da rentabilidade economicista das suas frotas e das sua actividade, esgotar esses recursos sem consideração pela sustentabilidade da sua exploração e pelo futuro das comunidades ribeirinhas. Esta a questão central do relatório do deputado comunista Lino de Carvalho sobre «A exploração sustentada dos recursos biológicos marinhos», recentemente aprovado na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa.
O relatório faz notar que «é
hoje reconhecido que uma exploração irresponsável dos recursos
biológicos marinhos, associada a profundas alterações dos
eco-sistemas, estão na base do desequilíbrio que hoje se
verifica em inúmeros stocks de várias espécies piscatórias»,
citando a propósito os exemplos do bacalhau e da sardinha.
«Quanto ao primeiro - refere o documento -, a tonelagem pescada
no Atlântico caiu praticamente para metade depois dos inícios
dos anos 70. Quanto à sardinha, estão hoje em cima da mesa da
União Europeia propostas com vista à redução, para 1991, de
mais de 80 por cento do esforço de pesca nesta espécie».
Sublinhando que, neste terreno, «existe um défice de
conhecimento sobre o estado real dos recursos e das causas da sua
diminuição», o relatório propõe o aprofundamento «dos
trabalhos de investigação científica sobre o estado dos
recursos vivos marinhos», bem como o reforço dos «mecanismos
de gestão e controlo do esforço de pesca». Por outro lado, e
tendo em conta a multiplicidade de motivos que levam à redução
dos stocks (excesso de exploração, alteração dos factores
naturais ambientais, poluição dos oceanos, etc.), o relatório
propõe, entre outras coisas, «uma perspectiva integrada e
global, multidisciplinar e multisectorial, nos trabalhos de
investigação científica sobre os oceanos, o que pressupõe uma
maior cooperação entre os Estados, designadamente os Estados
membros do Conselho da Europa». Ainda neste âmbito, o documento
considera ser de todo o interesse a criação de uma Agência
Marítima Europeia que «contribua para uma melhor coordenação
e exploração dos conhecimentos e das experiências europeias a
respeito dos oceanos».
Direitos inalienáveis
A importância
económica e social dos oceanos e da gestão racional dos seus
recursos não é negligenciável. Como recorda Lino de Carvalho
no relatório que vimos citando, «as actividades marítimas da
pesca representam 3 a 5 por cento do PIB dos países marítimos
europeus», estimando-se «em mais de 400.000 o número actual de
pescadores na Europa». Sabendo-se que cada emprego no mar está
na origem de quatro empregos em terra, refere o documento, pode-se
concluir que as actividades ligadas às pescas são responsáveis
por cerca de dois milhões de empregos. Se a este aspecto se
juntar o facto de a pesca «mergulhar em profundas e tradicionais
raízes culturais da Europa», fácil se torna concluir da
necessidade de «defender, preservar e garantir um futuro com
qualidade de vida às comunidades ribeirinhas».
É neste contexto, prossegue o relatório, que a pesca costeira -
exercida em geral na zona dos mares territoriais - assume uma
importância estratégica para a manutenção e desenvolvimento
das múltiplas comunidades piscatórias ribeirinhas, em países
como Portugal, Espanha, Grécia, França, Dinamarca, Noruega,
Suécia, Chipre, entre outros, onde esse segmento de pesca
representa cerca de 80 por cento das frotas e do emprego no
sector. Desta realidade decorre a necessidade «de medidas
específicas de controlo do esforço de pesca nesta zona, e de
restringir o seu acesso exclusivamente às frotas dos respectivos
Estados - que nela exercem direitos de soberania inalienáveis e
não partilháveis - sem prejuízo, obviamente, dos acordos
existentes entre Estados». Pela mesma ordem de razões se
justifica «um direito de preferência na zona contígua, com a
consideração do seu alargamento em certas situações
específicas (como nas zonas de arquipélagos) e a manutenção
das 200 milhas sob jurisdição soberana de cada Estado, tendo
embora em conta também aqui os acordos de cooperação e
integração regional existentes como é o caso da União
Europeia e da sua Política Comum de Pescas».
Controlar o acesso aos recursos
De acordo com o
relatório de Lino de Carvalho, quer na pesca costeira quer na
pesca de alto mar, «o controlo do acesso aos recursos é a pedra
de toque de toda a política de pescas com base em medidas de
gestão descentralizadas que tenham em conta as especificidades
de cada zona e a diversidade das condições bio-geográficas ou
de produção das pescarias, bem como a relação existente entre
a dimensão de cada frota des pesca e a dos respectivos stocks».
Na opinião do relator, que faz uma abordagem crítica a dois dos
sistemas de gestão dos recursos pesqueiros existentes, torna-se
necessário fazer um balanço de aplicação dos diferentes
sistemas de gestão dos recursos halieuticos e aplicar com rigor
o Código de Conduta da FAO para uma Pesca Responsável, bem como
generalizar a aplicação do princípio baseado na chamada
'abordagem de precaução', o que no essencial significa que na
ausência de dados científicos suficientemente testados, devem
ser tomadas medidas de prevenção antes dos problemas
acontecerem.
O relator alerta ainda para as duas condições que devem ser
respeitadas, sejam quais foram os sistema de gestão das pescas a
aplicar: que nenhuma política de redução do esforço de
pesca se baseia exclusivamente numa política de abate de
embarcações; e que qualquer redução do esforço de
pesca, por razões estranhas à responsabilidade de pescadores e
armadores, seja compensada com apoios sociais.
Finalmente, tendo em conta que a exploração sustentada dos
recursos biológicos marinhos é um dever de solidariedade entre
gerações, o relatório aprovado pela Assembleia Parlamentar do
Conselho da Europa propõe que a comunidade internacional, com
relevo para o próprio Conselho da Europa, desenvolva, a partir
das escolas, uma campanha de sensibilização pública sobre os
mares e os seus recursos.