Kosovo
Nato prepara intervenção
— PCP contra envolvimento militar de Portugal —


Slobodan Milosevic e Richard Holbrooke chegaram a acordo sobre a verificação do cumprimento pelos sérvios da resolução da ONU sobre o Kosovo, na terça-feira, dando o primeiro passo para resolver a questão que opõe a Sérvia e a Nato.

Segundo esse acordo, o governo de Milosevic aceita a presença de dois mil homens da OSCE (Organização para a Segurança e Cooperação na Europa) no terreno, apoiados por aviões que não serão de combate.
«A OSCE terá no terreno duas mil pessoas com uma missão de verificação, não fiscais, não observadores, e a missão estará lá com a total permissão do governo jugoslavo», anunciou Holbrooke.
Nessa madrugada, a Nato tinha dado ordem de activação para a operação de ataques aéreos contra a Sérvia, concedendo quatro dias suplementares ao presidente sérvio Slobodan Milosevic para concluir as negociações com o representante dos EUA.
No entanto, mesmo com o acordo, a Nato continua insatisfeita. «Não saímos ainda da situação de emergência», declarou Holbrooke, sublinhando que «a crise continua».
Por seu lado, Belgrado afirma ter aceite as exigências do Conselho de Segurança da ONU: pôr fim à violência, retirar as forças do exército e da polícia da província do Kosovo e permitir a entrada de ajuda humanitária internacional.
O ponto mais polémico é a abertura das fronteiras à vigilância internacional. No passado mês de Abril, em referendo nacional, 94 por cento dos sérvios manifestaram a sua oposição à presença estrangeira no país. Seguindo este resultado, Milosevic tem-se recusado a aceitar uma mediação exterior em conversações com os independentistas albaneses do Kosovo.
Apesar de não possuir nenhum mandato do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a Nato ameaça bombardear a Sérvia caso o seu governo não permitir a implementação de um mecanismo aéreo de verificação do cumprimento das condições impostas pela ONU.
A partir do momento em que se iniciem os ataques pelos aviões da Aliança Atlântica, a responsabilidade dos políticos e diplomatas passará inteiramente para os militares. Nas palavras do secretário de Defesa dos EUA, os ataques terão início «numa base limitada, aumentando gradualmente». Todos os países que compõem a Nato deram o seu aval aos ataques à Servia, incluindo Portugal.


Rússia propõe voos de reconhecimento

A Rússia já afirmou a sua oposição à decisão da Nato, tendo anunciado na segunda-feira que Milosevic está disposto a receber 1500 observadores internacionais no Kosovo. O ministro da Defesa russo, Igor Sergueyev, adiantou que o seu país encara a possibilidade de participar nessa força e propôs a realização de voos de reconhecimento pela Força Aérea da Rússia.
Na opinião do ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Igor Ivanov, um ataque da Nato à Sérvia seria «uma decisão muito perigosa» com «consequências muito graves». Sergueyev acrescentou que o seu Governo «está a preparar diversas opções» para a possibilidade dos ataques se concretizarem.
O líder do Partido Comunista da Federação Russa, Guennadi Ziugánov, adiantou que a Duma (câmara baixa do Parlamento, onde os comunistas são maioritários) adoptaria uma «gama inteira de medidas» - nomedadamente a anulação de todos os compromissos assumidos com a Nato e a limitação de venda de armas à Sérvia -, no caso de se verificar uma intervenção militar.

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Nota da Comissão Política do CC do PCP
A escalada militar da NATO
contra a Jugoslávia

Na passada segunda-feira, a Comissão Política do PCP divulgou a nota que a seguir transcrevemos sobre o agravamento da situação na Jugoslávia. No mesmo dia, o secretário geral do PCP, Carlos Carvalhas solicitou ao Presidente da República, uma audiência com carácter de urgência para abordar o Kosovo e o eventual envolvimento militar de Portugal numa intervenção da NATO.

1. A escalada militar da NATO contra a Jugoslávia, orquestrada e liderada pelos EUA a pretexto da situação no Kosovo, assumiu nos últimos dias inquietantes proporções.
Os EUA, que há muito tomaram a decisão de impor a sua hegemonia nos Balcãs, pressionam os seus aliados, na NATO e fora dela, para, mesmo à revelia da ONU e do Conselho de Segurança, apoiarem e participarem em operações de guerra contra a Jugoslávia. Para o dia de hoje, estão a ser anunciadas decisões cruciais no plano político e operacional que abrem caminho a acções militares de agressão contra um país soberano.

2. Perante uma tal situação, o PCP sublinha, uma vez mais, a sua firme oposição ao envolvimento militar de Portugal no conflito.
Na sequência da veemente crítica e condenação já anteriormente expressas a declarações extemporâneas do Ministro da Defesa, o Partido Comunista Português considera juridicamente artificiosa e politicamente inaceitável qualquer decisão de disponibilização de meios militares portugueses para as operações da NATO contra a Jugoslávia sem debate e voto prévio, em sede de Assembleia da República.

3. O PCP chama a atenção para que a complexa questão do Kosovo é no fundamental e na sua essência um problema interno da Jugoslávia cuja solução deve necessariamente ser procurada pela negociação e o compromisso político e não pela repressão interna ou pela ameaça ou uso da força militar na sua vertente internacional.

4. O PCP sublinha que o que está em marcha é uma acção unilateral de «polícia» dos EUA, utilizando a NATO para os seus próprios fins imperialistas, com arrogante desrespeito pelas normas mais elementares do direito internacional e desprezo pelo papel de organizações internacionais, como a ONU e a OCSE, na preservação da paz e segurança.

5. As consequências e repercussões, no plano europeu e mundial resultantes da agressão da NATO contra a Jugoslávia, seriam extremamente graves. É necessário tudo fazer para as evitar, manifestando firme oposição a todo e qualquer envolvimento de Portugal nessa perigosa aventura militar.


«Avante!» Nº 1298 - 15.Outubro.1998