Barreira de silêncio não passou
A
Assembleia da República rejeitou, faz hoje oito dias, a proposta
de lei do Governo que visava a consagração de uma quota de 25
por cento de participação feminina nas listas de candidatos a
deputados aos Parlamentos Nacional e Europeu.
O diploma do Governo recolheu apenas os votos favoráveis do PS e
da deputada social-democrata Manuela Aguiar e os votos contra do
PSD, CDS-PP, PCP e PEV.
O debate foi marcado
pelo vivo confronto de argumentos entre os subscritores do
diploma e as bancadas dos partidos da oposição, designadamente
a do PCP e do Partido Ecologista «Os Verdes».
Acusando o Governo de não querer saber da igualdade de
oportunidades para as mulheres», para Odete Santos, que produziu
um discurso fortemente crítico, a iniciativa do Executivo visou
apenas «resolver um problema do PS».
Tudo se resume, em sua opinião, a uma mera operação de
cosmética, uma vez que, denunciou, «as quotas, a paridade, não
têm nada a ver com igualdade».
Este foi, aliás, um dos fios condutores de toda a argumentação
aduzida pela parlamentar comunista.
É que, esclareceu, os factores que determinam as desigualdades e
as discriminações não assentam nas diferenças biológicas,
mas sim em razões de classe, de que, por conseguinte, «também
são vítimas os homens».
Daí que não faça qualquer sentido que «sob uma aparente capa
de modernidade», o Governo invoque a «reconstrução das
diferenças biológicas» para alegadamente combater as
discriminações.
O que deve estar no centro do debate, pois, na perspectiva de
Odete Santos, não é «a modernidade - que não o é - da
discriminação do género»m, mas sim as «gritantes exclusões
de mulheres que fazem do trabalho uma arma para a conquista da
cidadania», visando não apenas romper o «gueto da barreira
biológica» como afirmar a recusa desse «conceito meramente
biológico de discriminação do sexo feminino».
«Enquanto muito se fala da discriminação de género -
sublinhou a parlamentar do PCP indo ao fundo da questão -,
quer-se construir uma barreira de silêncio sobre os reais
problemas das mulheres, cuja resolução dará um importante
contributo para a igualdade de oportunidades de todos os
cidadãos, homens e mulheres, de cada cidadão, de cada homem e
de cada mulher».
Em nome do Governo, António Costa, à falta de melhores
argumentos, optou por uma postura arrogante para tentar responder
às posições da bancada comunista. Afirmou concretamente que a
«não defesa do princípio de diferenciação positiva a favor
das mulheres" para a sua participação na vida política,
reflectia, da parte do PCP, uma capitulação, imagine-se, «ao
mais radical liberalismo".
A resposta não se fez esperar e veio do líder da bancada
comunista, Octávio Teixeira. Depois de condenar a arrogância da
intervenção, o dirigente comunista desmontou a táctica
utilizada por aquele membro do Governo, considerando que a mesma
visa exclusivamente esconder a existência na proposta de lei de
uma «receita duvidosa e uma solução perigosa», para resolver
o problema das desigualdades reais entre homens e mulheres.
Uma receita duvidosa porque, segundo Octávio Teixeira, «o
Governo apenas deseja caiar a parede para não resolver a
questão de fundo das desigualdades. Uma solução perigosa
porque contribuiria para dar a ideia de que o problema das
desigualdades entre homens e mulheres estaria esgotado com a
hipotética aprovação do diploma».