Sobre as Regiões de Turismo

Declaração de Carlos Luís Figueira
no Congresso das Regiões de Turismo


Momentaneamente derrotado o processo da criação das Regiões Administrativas, em consequência de um processo referendário, o qual o PCP sempre considerou desnecessário, entendemos que a descentralização de poderes centrais para órgãos locais e regionais eleitos visando uma maior democraticação e eficácia da administração pública se continua a justificar, num sentido inverso àquele que este Governo continua a praticar. As Regiões de Turismo constituem um bom exemplo da necessidade dessa descentralização.

As Regiões de Turismo vivem há anos numa situação híbrida, entaladas entre um Poder Local da qual emanam e um Estatuto conferido por uma Lei-Quadro, de matriz claramente centralizadora, que as coloca numa situação de memorização, sob a tutela vigilante e omnipresente do Poder Central, com reduzidas competências e dependentes de um sistema de financiamento que, não sendo de todo claro, apesar de tudo continuou a não ser cumprido por este Governo à semelhança do procedimento adoptado pelo anterior.
Sistema híbrido que bem tem servido este Governo para gerir influências, concedendo privilégios e facilidades de natureza financeira em função das pressões exercidas a partir do interior do partido do Governo e não em resposta às necessidades da valorização da actividade turística nem ao reforço das estruturas descentralizadas existentes para esse fim, designadamente as Regiões de Turismo.
Já na vigência do actual secretário de Estado de Turismo, o terceiro desta legislatura, foram reequacionadas as áreas promocionais procedendo-se a uma regionalização turística em relação à qual faltou a coragem política para a sua efectiva institucionalização, já que às novas áreas promocionais não se seguiu a necessária reorganização especial destas estruturas, mantendo-se, pelo contrário, a sua enorme dispersão pelo País, num processo contraditório com as múltiplas e até recentes declarações do secretário de Estado sobre esta importante matéria, quando afirma existir, em relação ao quadro actual das estruturas regionais e locais de turismo, "uma dispersão de energias, meios e eficácia".
Perante tal contradição, cabe perguntar se a atitude passiva do Governo neste processo não estará relacionada com o facto do PS dominar politicamente a maioria das estruturas existentes. Ou seja, se a correlação de forças fosse de ordem diferente, o Governo e o PS manteriam a mesma posição. Só assim também se pode perceber que às sucessivas críticas que o actual secretário de Estado tem, por diversas vezes, já expresso sobre a ineficácia do xadrez actual, não se tenham tomado medidas para o corrigir.
O que em suma se pode afirmar sobre esta matéria acerca do comportamento do actual Governo é que ao longo desta legislatura se limitou a reproduzir o que de mau teve o comportamento do Governo anterior. Ou seja, continuou a não cumprir a Lei de Financiamento das Regiões de Turismo, manteve a sua dispersão e ineficácia a coberto de uma Lei-Quadro de inspiração cavaquista que as transforma em estruturas tuteladas e com reduzidos poderes. Os protocolos celebrados com a Região de Turismo do Algarve não alteraram minimamente a substância do problema.
As "novas formas de descentralização" sublinhadas pelo secretário de Estado V. Neto para responder ao facto do processo da criação das Regiões Administrativas ter sido derrotado de forma a encontrarem-se outras soluções para a "racionalização das estruturas de turismo" contrastam vivamente com as competências desconcentradas que o Governo acaba de publicar na Lei Orgânica das Direcções Regionais de Economia, competências que em matéria de Turismo tenderão a absorver não só os reduzidos poderes das actuais estruturas como consagram, a estas Direcções Regionais, outros que lhes poderiam e deveriam ser atribuídos, tornando claro que mais uma vez este Governo "piscando à esquerda virou à direita". Em vez de descentralizar, concentra na desconcentração.
Assim, o anúncio ontem aqui feito pelo ministro da Economia dando conta dos esforços do Governo para a elaboração de uma nova Lei-Quadro e de um novo sistema de financiamento para as Regiões de Turismo, no termo de uma legislatura de quatro anos e em vésperas de eleições surge, há que assumi-lo, ferido de credibilidade e mais como um elemento tranquilizante, anestesiante, como resposta a insatisfações que tendiam a crescer.
No mesmo sentido e quanto às novas atribuições conferidas às Direcções Regionais de Economia, o que pela nossa parte podemos afirmar é que, apesar também das palavras tranquilizadoras do Senhor Ministro ontem aqui produzidas sobre esta matéria, nós, pela nossa parte, continuamos a manter fundadas dúvidas sobre os objectivos e âmbito de tais atribuições e, por isso mesmo, em tempo oportuno, chamaremos o referido diploma à sua discussão e ratificação em sede própria, isto é, na Assembleia da República.
O PCP desde há muito se tem pronunciado criticamente contra o modelo em que assentam as actuais estruturas regionais e locais de turismo, exprimindo a necessidade, em nome da eficácia das Regiões de Turismo, de se proceder a uma efectiva arrumação que conduzisse à redução do número de estruturas existentes, num processo que em nossa opinião deveria estar profundamente associado à elaboração de uma nova Lei-Quadro. Lei-Quadro que confira mais poderes às Regiões de Turismo, clarifique a natureza e composição dos seus órgãos de decisão e dote estas estruturas de um processo de financiamento baseado em critérios claros, objectivos, que lhes garanta autonomia suficiente para o seu funcionamento no quadro de novas competências a serem conferidas, o que implica igualmente a ponderação de alterações ao quadro de pessoal.
O que defendemos é o desenvolvimento de um processo que tem como objectivo dotar as Regiões de Turismo de poderes hoje exercidos por estruturas do Poder Central assim como absorver outros que foram descentralizados para as autarquias mas que estas, na sua maioria, não estão em condições de os exercer com eficácia.
Neste sentido, apesar de momentaneamente perdida a batalha da regionalização do País, entendemos que o processo de descentralização e reorganização das estruturas do Estado não deve parar mas, pelo contrário, se deve encetar procedimentos, abrir caminhos que dêem corpo a esse objectivo, por muitos reconhecido como indispensável.
É tendo presente o que foi dito que declaramos, após ampla consulta e discussão com todos os nossos eleitos, que é tempo de dar corpo à Região de Turismo do Alentejo e que, nesse sentido, iremos desenvolver todos os esforços para concretizar esse justo objectivo.
Gostaríamos naturalmente de ver empenhadas na criação da Região de Turismo do Alentejo todas as Regiões e Comissões Municipais de Turismo existentes na Região, mas desde já assumimos que é nossa intenção intervir no sentido de levar por diante este processo, mesmo que seja só com aqueles que manifestem disponibilidade para o empreender.
É este o desafio que aqui deixamos. Que cada um assuma, a partir de agora, as suas responsabilidades.
Em coerência com o que sempre afirmamos, assumimos também aqui a responsabilidade de, se possível, ainda na presente legislatura, apresentar, através do nosso Grupo Parlamentar, uma nova Lei-Quadro que necessariamente incorporará uma nova fórmula de financiamento às Regiões de Turismo, processo em relação ao qual tudo faremos para o inserir no quadro de uma ampla consulta a todo o sector interessado.


«Avante!» Nº 1323 - 8.Abril.1999