Nos 25 anos da Revolução
Prosseguir os caminhos de Abril


«Valeu a pena a luta pela liberdade e pelas liberdades. Mesmo quando muitas das esperanças de Abril estão por cumprir». As palavras são do deputado comunista Lino de Carvalho e sintetizam aquele que foi, porventura, o sentido mais marcante da sua intervenção na sessão solene com que a Assembleia da República comemorou o 25.º aniversário da Revolução do 25 de Abril.

O acto foi presidida por Jorge Sampaio, que interveio no final, deixando expressas algumas das «preocupações» que, do ponto de vista do Chefe do Estado, sobressaem do actual momento político, quer nacional quer internacionalmente. À sessão, onde intervieram representantes de todas as bancadas parlamentares, bem como Almeida Santos, presidente da Assembleia da República, assistiram altas figuras da hierarquia do Estado.
Destaque ainda, entre os muitos convidados que assistiram à sessão das galerias, para a presença de vários militares de Abril. O Presidente de Moçambique, Joaquim Chissano, em visita ao nosso País, acompanhou igualmente os trabalhos.
Todos aqueles que pelas mais variadas maneiras «construíram as estradas que fizeram a liberdade» mereceram uma referência especial na intervenção de Lino de Carvalho. Foi «com a sua luta, o seu sacrifício e o sacrifício dos seus familiares, por vezes a morte, na prisão, na clandestinidade ou no exílio», recordou, citando o poeta, que se construiram «as portas que Abril abriu».
Mas trazer à nossa memória e prestar homenagem a todos esses «militantes da liberdade» ganha um significado e importância ainda maior quando se assiste, como sucede nos dias que correm, a tentativas de branquear o passado e os seus responsáveis.
Ora foi «contra esse branqueamento» que Lino de Carvalho se insurgiu, em nome da «formação cívica das gerações posteriores, e para que não volte», fazendo notar que nunca é demais «reafirmar sempre e sempre que o fascismo existiu em Portugal» e que o nosso País «foi palco de perseguições, de prisões por delito de opinião, de torturas, de censura, de guerra colonial, de proibições muitas».
Uma convicção profunda deixada por Lino de Carvalho no seu discurso foi ainda a de que «valeu a pena a luta pela liberdade», mesmo quando, passados 25 anos, lembrou, «o emprego com direitos não é um direito efectivo de todos», «a pobreza e a marginalidade alastram», «mais de 70 por cento dos reformados vivem com pensões inferiores a 32.800$00», «as mulheres e os jovens continuam a ser discriminados», ou se acentua a injusta distribuição da riqueza».
Uma atenção particular na intervenção do deputado do PCP mereceu, por fim, o actual quadro internacional, caracterizado, segundo as sua palavras, «por factos dolorosos da maior gravidade», de que são testemunhos, exemplificou, a «brutal e irresponsável guerra de agressão aos EUA, da União Europeia e da NATO contra a Jugoslávia»; a «continuação da guerra em Angola, movida por Savimbi, em violação das resoluções da ONU»; «a violência, os massacres, a brutalidade da Indonésia contra o povo de Timor-Leste».
Manifestando a firma oposição da sua bancada contra a guerra de agressão à Jugoslávia, Lino de Carvalho apelou à cessação do envolvimento português no conflito, reclamando, simultaneamente, uma intervenção do Governo no quadro da ONU, com vista a encontrar uma solução política para o problema do Kosovo.

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Fazer justiça aos militares de Abril

As injustiças na carreira profissional de que foram vítimas muitos militares que intervieram no 25 de Abril vai, finalmente, ser reparada. Com a aprovação do projecto de lei conjunto subscrito pelo PCP e pelo PS que aprova medidas no sentido da revisão da situação dos militares que participaram no processo de transição da ditadura para a democracia, e que por esse motivo viram a sua carreira prejudicada ou dela foram afastados, a Assembleia da República, ainda que tardiamente, veio dar expressão a um acto da mais elementar justiça.
Do alcance e significado do diploma, que acolheu o voto favorável de todas as bancadas, à excepção do CDS/PP que se absteve, falou o deputado comunista João Amaral para salientar que o objectivo visado com esta iniciativa – a «questão central», como lhe chamou - «não é o de conceder privilégios, sejam eles quais forem, mas, sim, o de fazer justiça, repondo a situação àqueles que não ficaram em casa a ver os acontecimentos passarem, àqueles que correram os riscos da sua própria carreira – e muitos foram eles – para que em Portugal se instalasse a liberdade e a democracia».
Para João Amaral, aliás, tudo aquilo que o País deve aos militares de Abril «é muito mais e não se paga com qualquer projecto de lei». «É muito mais do que a reparação da carreira», fez notar, para concluir que o que está em causa – e isso não tem preço - «é a eterna dívida de gratidão por eles terem tido a coragem, naquela madruagada de 25 de Abril, de sair à rua, de derrubar a ditadura e de abrir os caminhos da liberdade e da
democracia».


«Avante!» Nº 1326 - 29.Abril.1999