MASSACRES
e mentiras


"Durante a guerra fria, um único aviso do Kremlin teria sido suficiente para manter as mãos da NATO fora dos Balcãs" (Financial Times, 26.3.99). Com estas palavras, o insuspeito órgão da City londrina confirma implicitamente que a queda da União Soviética abriu as portas para o regresso da guerra, após meio século, ao continente europeu. Pode parecer paradoxal que o fim do "Confronto Leste-Oeste" traga a guerra. Mas o aparente paradoxo só existe para quem tinha ilusões quanto à real natureza do imperialismo. É a quarta vez em oito meses que os EUA (sozinhos ou mal acompanhados) bombardeiam países independentes e soberanos. No Verão passado coube ao Sudão e Afeganistão. Em Dezembro (e prosseguindo nestes mesmos dias), ao Iraque. Agora, a vítima é a Jugoslávia. Em todos os casos, tratou-se de agressões, que violam frontalmente o direito internacional. Agressões decididas pelos EUA. Que se arrogam o direito de bombardearem o que querem, quando querem, como querem.

Num liceu dos EUA, adolescentes da auto-denominada Mafia das Gabardinas massacraram os seus colegas, num banho de sangue que se saldou em 15 mortos e numerosos feridos. É a oitava vez em dois anos que escolas norte-americanas são palco de massacres com armas de fogo, perpetradas por adolescentes. Os EUA são um país onde se podem compram armas de fogo como se compram máquinas de café. Onde se vendem 12 milhões de armas por ano. Onde a violência é parte integrante da sociedade, da História, da programação televisiva. Mas o Presidente Clinton não achou nada melhor para dizer, em tão funesta ocasião, do que "temos de ensinar as nossas crianças a exprimir a sua raiva por palavras, e não pelas armas" (!!). Lição difícil, perante o exemplo dado pelos seus governantes.

Enquanto os filhos massacravam em Denver para comemorar o aniversário de Hitler, os pais massacravam nos Balcãs para comemorar o aniversário da NATO. No dia inaugural das comemorações dos 50 anos da Mafia das Gabardinas do grande capital global – também conhecida por NATO – o massacre foi nos estúdios da TV sérvia. "Inteiramente justificado" foi como o cada vez mais incrível Primeiro Ministro britânico Blair comentou a destruição dessas instalações televisivas, nas quais morreram pelo menos 10 pessoas: "fazia parte da máquina de propaganda". E se fizesse? A propaganda é um crime gravíssimo, punível com a pena de morte? Morte da senhora da maquilhagem, do operador de som ou do porteiro de turno nas instalações televisivas?

O crime gravíssimo da TV jugoslava é outro. Quem mostrou ao mundo que a NATO mentiu quando afirmou ter Rugova sido morto, mostrando esse dirigente dos albaneses do Kosovo vivo e a pedir o fim dos bombardeamentos NATO? Que uma ponte de Novi Sad com transeuntes foi atingida pelos mísseis da NATO? Que a NATO alvejou por duas vezes um comboio em serviço normal de passageiros, matando uma dúzia de seus ocupantes? Que a NATO bombardeou repetidamente uma coluna de refugiados albaneses, matando várias dezenas de entre eles (certamente para melhor os proteger...)? Que a NATO massacrou uma dezena de refugiados sérvios no Kosovo, fugidos da limpeza étnica de que haviam sido vítimas na Croácia? Que a NATO bombardeou repetidamente o grande complexo industrial da Zastava, onde centenas de operários haviam estado voluntariamente para servir de escudos humanos? Quem mostrou ao mundo a catástrofe ecológica provocada pelos amigos do MNE alemão, Joska Fischer ("Verde" por fora, mas com camisa negra por dentro), ao destruírem fábricas de produtos químicos e petrolíferos? Foram as imagens da TV jugoslava que não deixaram estes crimes ficar encobertos. Querem silenciar a TV jugoslava porque ela fura a máquina de propaganda de NATO. Mostrando repetidamente que a NATO mente. Mente descaradamente. A NATO quer destruir toda a economia e sociedade jugoslava, fazendo a Jugoslávia "regressar a Idade da Pedra", como dizia um famoso militar norte-americano no tempo da guerra do Vietname. Mas quer fazê-lo às escondidas. Longe dos holofotes. É por isto que a senhora da maquilhagem da televisão sérvia foi condenada à morte pelos "cristianíssimos" Srs. Blair, Clinton e ... Guterres. — Jorge Cadima


«Avante!» Nº 1326 - 29.Abril.1999