Áreas urbanas de génese ilegal
Melhorar a Lei para prosseguir a reconversão


Aprovados na generalidade faz hoje uma semana, baixaram à Comissão para debate na especialidade os quatro projectos de lei que preconizam alterações à actual legislação sobre as áreas urbanas de génese ilegal (AUGI’s), visando a sua melhoria. Todos os diplomas passaram sem votos contra.

Os textos legislativos do PCP e do PS recolheram, para além dos votos das duas bancadas, o apoio do PEV, optando PSD e PP pela abstenção. O do PP recebeu apenas os votos favoráveis dos seus deputados, perante a abstenção de todos os restantes. Igual sentido de voto marcou o projecto do PSD, apresentado à ultima da hora, acolhendo apenas os votos favoráveis da sua bancada, enquanto todas as outras optaram pela abstenção.
Trata-se, agora, em sede de discussão na especialidade, de encontrar as soluções justas e adequadas que, como frisou no debate o deputado comunista Joaquim Matias, «correspondam ao interesse, à necessidade e à urgência» com que as populações, as autarquias locais e em particular os moradores destas áreas aguardam a revisão da lei vigente (Lei 91/95). Registe-se que esta realidade abrange só na Área Metropolitana de Lisboa cerca de 20 a 25 por cento da sua população, isto é, um universo entre 400 mil a meio milhão de cidadãos.
Dar corpo a uma lei consensual como foi conseguido há quatro anos atrás exige, pois, o empenho de todas as bancadas, tanto mais que existem algumas diferenças significativas entre os vários diplomas que a busca de um texto comum tem necessariamente de aproximar e superar.
O próprio debate da passada semana acabou por evidenciar algumas dessas diferenças. São sobretudo visíveis no que se refere ao projecto de lei do PCP, pelo qual perpassam – distinguindo-o dos restantes - três questões de princípio.
A estas singularidades se referiu detalhadamente Joaquim Matias, referenciando, desde logo, a «recusa de soluções de aparência populista» que implicariam anular directa ou indirectamente os planos municipais de ordenamento do território, desrespeitando simultaneamente toda a legislação que hoje visa proteger o ambiente e os recursos naturais (como a REN) ou os solos agrícolas (RAN), para não falar da própria segurança das populações, nos casos em que as edificações se situam em leitos de cheia ou em solos geologicamente instáveis.
«Estas soluções não conduziriam à defesa dos interesses das populações e em particular dos residentes nestas áreas», advertiu o parlamentar do PCP, antes de concluir que, «ao contrário, seriam os defensores de interesses especulativos dos solos a beneficiar de um tal facilitismo de legalização de qualquer maneira e sem princípios».

Recusar a demagogia

Decididamente rejeitada pela bancada comunista foi ainda aquilo que Joaquim Matias qualificou de «atitude de aparência simpática, mas no fundo eleitoralista» que consiste em atirar para os municípios responsabilidades que não lhes cabem, nem levam em conta as suas atribuições, capacidades e recursos financeiros e humanos.
Recusando tal caminho, Joaquim Matias foi peremptório ao afirmar que as «indispensáveis participações e contribuições do poder central e das autarquias não devem sobrepor-se nem condicionar a necessária intervenção empenhada dos proprietários e comproprietários, que estes quatro anos da Lei 91/95 já provaram ser determinantes».
Outro capítulo em que são notórias as diferenças nos quatro projectos de lei diz respeito às formalidades burocráticas. Tanto o rubricado pelo CDS/PP, como o do PSD, «não permitem soluções expeditas e desburocratizadas», enquanto o do PS revela uma posição tímida e recuada.
Entendendo que tais formalidades, estas sim, são fortemente impeditivas do andamento dos processos, a bancada comunista, pela sua parte, defende o seu aligeiramento, propondo, por exemplo, a «aprovação de planos de pormenor com audiência prévia à decisão municipal ou dispensa de vistorias sem utilidade prática».
A clarificação dos processos de registo de alvará e de divisão de coisa comum, ou seja, a clarificação da intervenção das instituições que prosseguem o processo de gestão urbanística na autenticação do acordo de uso e no registo do alvará de loteamento, constitui outra das preocupações da bancada comunista vertida no articulado do seu projecto de lei. Trata-se de obviar a que largas dezenas de processos já aprovados, como tem sucedido até aqui, continuem a aguardar em longa espera nas conservatórias e nos notários devido a interpretações destas entidades que na prática conduzem à actual paralisia.
Consensual entre todas as bancadas parece ser o alargamento do prazo de vigência da lei, amplamente justificado, na opinião de Joaquim Matias, «face ao elevado número de situações existentes, às centenas de milhar de pessoas envolvidas e à complexidade das formalidades requeridas».


«Avante!» Nº 1327 - 6.Maio.1999