Convenção de Otava
EUA «apoiam» mas não assinam


Os EUA «apoiam fortemente os esforços internacionais» para a proibição das minas anti-pessoal, mas não estão dispostos a assinar a Convenção de Otava sobre essa matéria antes do ano 2006, por alegadas razões de segurança.

A afirmação é do representante de Bill Clinton para a Desminagem Humanitária Global, Donald Steinberg, que participou no passado fim-de-semana em Moçambique na primeira reunião dos ‘Estados Parte da Convenção de Otava sobre a Proibição do Uso, Armazenamento, Produção, e Transferência de Minas Anti-pessoal.Segundo Donald Steinberg, os EUA não podem «assinar a Convenção nesta altura» devido às «preocupações» norte-americanas com «as questões de segurança em todo o mundo, incluindo a Coreia».
Recorda-se que este tipo de armamento, utilizado praticamente em todos os conflitos regionais, vitima sobretudo a população civil. Em Moçambique, por exemplo, onde a guerra de libertação nacional terminou em 1975 e os posteriores confrontos entre o governo da Frelimo e a Renamo cessaram em 1992, estima-se que permaneçam no terreno cerca de dois milhões de minas que continuam a matar e mutilar a população.
Apesar da crescente consciência internacional da necessidade de conjugar esforços para fazer face a este flagelo - designadamente através da interdição deste tipo de armamento, como consagra a Convenção de Otava, já ratificada por 72 países - os EUA condicionam a sua adesão ao projecto à capacidade técnica de encontrar uma alternativa para as minas. «O presidente dos EUA afirmou que iremos assinar a Convenção no ano 2006 se pudermos encontrar alternativas para as minas terrestres que utilizamos e estamos vigorosamente à procura dessas alternativas», disse Steinberg em Maputo. Dito por outras palavras, os norte-americanos propõem-se manter a produção e utilização das minas anti-pessoal até estarem em condições de utilizarem novas armas, igualmente «eficazes». Até lá, e embora o representante norte-americano garanta que a produção «baixou drasticamente» a ponto de ter deixado de ser «uma indústria comercialmente viável», os EUA persistem nos engenhos de morte que continuam a matar mesmo, ou sobretudo, nos tempos de paz.

Alegadamente, os norte-americanos já tomaram uma série de «medidas importantes» compatíveis com os objectivos da Convenção de Otava, mas até encontrarem as tais «alternativas» de que fala Clinton são os restantes países que são incentivados a aderirem às convenções internacionais sobre armas convencionais. Até ao ano 2003, os EUA não se propõem alterar a sua política nesta matéria, embora garantam que a sua produção de minas se destina a substituir as que, armazenadas, perderam entretanto a validade; depois dessa data, e até 2006, dizem que «apenas» as utilizarão na Coreia. Que novo engenho de morte a longo prazo se prevê que sairá então da indústria de guerra norte-americana?«Acreditamos que estes passos, juntamente com a desminagem humanitária no mundo, constituem uma abordagem razoável e prática do que é a crise humanitária por causa das minas», disse Steinberg em Maputo, aparentemente convicto de que os 27 milhões de dólares concedidos a Moçambique desde 1993 para projectos de desminagem, assistências técnica, formação e reabilitação de vítimas de minas anti-pessoal bastam para abrandar as críticas à hipocrisia norte-americana. Resta saber para quem é que «a abordagem» é «razoável e prática». Não certamente para as futuras vítimas.


«Avante!» Nº 1327 - 6.Maio.1999