Defesa Nacional
e Forças Armadas
Inquietação
nas FA's
tem responsáveis
Por Rui Fernandes
Em raros
momentos se verificou uma tão expressiva inquietação no seio
das Forças Armadas como nos últimos meses.
A amplitude, quantitativa e qualitativa, desta inquietação só
é possível porque justos direitos e legítimas expectativas
não têm sido atendidos e porque existe o fundamentado
sentimento de que a Instituição militar está em plano
secundário nas preocupações governamentais.
Aquilo a que o
conjunto de iniciativas promovidas pelos militares obriga é a
uma serena e profunda reflexão sobre as causas e não a
apressadas mas incorrectas medidas ou a adopção de analgésicos
que aliviem a dor mas não tratem a doença.
E a doença não está na consagração do associativismo
profissional mas na sua recusa, como mais uma vez aconteceu por
responsabilidade do PSD e pelas enormes hesitações e timidez do
Governo PS. A doença não está na auscultação dos militares e
na chamada das associações à participação na elaboração do
Estatuto dos Militares das Forças Armadas, mas na sua
marginalização. A doença não está na revalorização das
carreiras dos militares, e consequentemente numa maior
responsabilização da base ao topo, mas na ausência de medidas
nesse sentido. Para mais, num quadro em que, crescentemente,
sobem os níveis académicos dos militares, sejam eles sargentos
ou praças.
A doença não está no cumprimento das promessas feitas aos
militares contratados, algumas das quais constam de
decretos-leis, mas não só no seu não cumprimento como na
adopção de medidas que geraram novas desigualdades e
frustrações.
Tudo isto, e muito mais que aqui não cabe, no quadro de um
crescente contacto dos militares portugueses com militares de
outros países e, consequentemente, de um crescente conhecimento
da realidade por eles vivida, seja no domínio estatutário,
remuneratório, dos direitos associativos, sociais e de carreira.
Mas se tudo isto é, em nossa opinião, verdade, esta não se
esgota aqui. Permanece, por razões economicistas, um baixo
empenhamento na concretização dos programas de reequipamento.
Os governos dos últimos anos querem aumentar as verbas do
orçamento das FA's destinadas ao investimento mas não adoptam
as medidas necessárias à concretização do objectivo. Anunciam
à sociedade esse objectivo, normalmente perto de actos
eleitorais, mas quanto a medidas... Consulte-se, de novo, as
razões que levaram à demissão do então Almirante CEMA Ribeiro
Pacheco.
Sobranceria e arrogância
O Governo PSD
diminuiu, com o apoio do PS, o SMO para quatro meses, decretando
assim, em termos práticos, a sua liquidação. O Governo PS
apresenta uma nova Lei do Serviço Militar que, além de
tecnicamente intragável, não absorveu as sugestões e propostas
dos Chefes militares, nomeadamente do Exército. Aliás, o PS
não tocou num único diploma estruturante vindo do tempo do PSD,
o que é significativo.
Ora uma Instituição, como aquela de que falamos, não pode
viver nesta indefinição de objectivos e meios, ano após ano.
As Forças Armadas não vivem de discursos e malabarismos
mediáticos. Muito menos vivem da aplicação à Instituição
dos critérios neoliberais, no plano do reequipamento, do pessoal
e da logística.
Quando a tudo isto a Instituição se vê confrontada com a
significativa nomeação de Veiga Simão e agora um ministro em
part-time, que fala, no Luxemburgo e no Brasil, das
inquietações publicamente expressas pelos militares; quando o
Governo fala sobre estas mesmas inquietações para dizer que vai
estudar aquilo que o seu ministério e o seu (ex)ministro já
tinham estudado e aprovado em Conselho Superior Militar,
comprometendo desse modo a palavra das Chefias perante os seus
subordinados; quando o Governo comenta, como comentou, as
declarações do Chefe do Estado-Maior General das Forças
Armadas, então já não é só "falta de jeito" em
lidar com a Instituição, é sobranceria e arrogância, mesmo
que mascaradas de santificados e benzidos sorrisos.
O General CEMGFA Espírito Santo defende, na entrevista que deu
ao jornal Semanário, concepções das quais discordamos, como
sejam as ligadas às questões do associativismo. Mas não
podemos deixar de relevar a frontalidade com que defende aquilo
em que acredita, marcando, neste plano, positivamente, a
diferença.
A inquietação existente nas Forças Armadas tem responsáveis:
o PSD e o PS, a sua mesma política, as suas opções, as suas
omissões - que também são uma forma de fazer política.
O PCP continuará a dizer o que pensa, a pensar o que diz e a
agir através das propostas e soluções que apresenta para a
dignificação dos militares e para o prestígio das Forças
Armadas, numa postura coerente com aquela que seja a sua
avaliação própria dos interesses nacionais, sem andar ao sabor
de modas ou em posições ziguezagueantes, procurando agradar a
gregos e a troianos.
Para o PCP, é fundamental que sejam estabelecidos objectivos
credíveis visando o reequipamento e a modernização mais geral
das Forças Armadas, no quadro da definição de um Conceito
Estratégico de Defesa Nacional que assente nas reais
possibilidades e nos reais interesses de Portugal como pátria
soberana.