Em Setúbal
CDU assume «projecto de esquerda»


O PCP apresentou na sexta-feira passada, num hotel da Costa da Caparica, algumas das principais linhas programáticas para o distrito de Setúbal.

Um intenso debate interno, dirigido por José Manuel Mais, precedeu a apresentação das propostas, resumidas na intervenção de Octávio Teixeira, cabeça de lista da CDU por este círculo eleitoral. Na ocasião, para além de Octávio Teixeira, intervieram Jorge Pires, membro da Comissão Política, e Carlos Carvalhas, que encerrou a sessão.
Octávio Teixeira começou por referir as preocupações do PCP face aos entraves e dificuldades que, após quatro anos de governação PS, persistem e obstam «a um desenvolvimento harmónico e sustentado do distrito de Setúbal», considerando ser nessa estratégia que reside a questão central. Isto significa, basicamente, «uma maior aposta no aproveitamento dos recursos e capacidades endógenas», maiores apoios «à diversificação da estrutura produtiva e à criação de empregos estáveis e justamente remunerados», a criação de condições «para uma maior autonomia do distrito». final, um «projecto de esquerda», como defendem os candidatos da CDU.
Por fim, depois de tecer críticas à localização do novo aeroporto na Ota, Octávio Teixeira considerou que o futuro governo terá «de encontrar rapidamente um outro mega-projecto para o distrito de Setúbal», pois os trabalhadores e os desempregados «não podem continuar a ser castigados» nem Setúbal «abandonado aos golpes de secretaria».

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PS e PSD prometem o que não fizeram
(extractos da intervenção de carlos Carvalhas)


A situação no distrito de Setúbal é «consequência das opções de política nacional» e de «uma política de concentração de riqueza», disse Carlos Carvalhas, referindo os elevados índices de desemprego e a grave situação que se vive na Península de Setúbal. A intervenção, proferida na sexta-feira, na Costa da Caparica, encerrou a sessão de apresentação das linhas programáticas do PCP para Setúbal.

«(...) O Governo está transformado num verdadeiro comité eleitoral do PS.
Querem alguns exemplos?
O Ministro do Equipamento com o dinheiro de todos nós antecipa obras, para inaugurar antes de Outubro, pagando milhões de contos extra; o Ministro da Agricultura que vai ser candidato por Évora, apresenta nesta cidade, como ministro, o Plano de Regadio para o Alentejo.
O Ministro da Administração Interna depois de ter sido apresentado como cabeça de lista por Setúbal, vai inaugurar hoje a Feira de Santiago. Ao que se sabe não há nenhum problema de segurança que o justifique.
Os governadores civis, com o dinheiro dos contribuintes, editam brochuras caríssimas a publicitar a obra do Governo. E como esta não é suficiente juntam-lhe as obras das autarquias da CDU! É um fartote.
Por sua vez, o Ministro da Economia diz-nos que até Outubro não haverá aumento dos combustíveis porque fez um acordo com as petrolíferas e não esclarece se fez esse acordo com o dinheiro do Orçamento do Estado. Alguns dirão que é uma pena que as eleições não sejam uns meses mais tarde pois assim teríamos mais umas obras antecipadas e teríamos a garantia de mais uns meses sem aumento de gasolina.
Tudo o que criticaram ao PSD fazem-no agora com a mesma hipocrisia.
O Sr. Presidente da República tem uma palavra a dizer sobre isto, pois tem o dever de contribuir para a verdade do acto eleitoral.
Até no eleitoralismo o PS não fica atrás do PSD. Mas não só.
O PS e o PSD andam também numa grande azáfama de desresponsabilização. É a política de Pilatos.
O Alqueva está atrasado, a culpa é do PSD, diz o PS; não a culpa é do PS, diz o PSD.
Há embargo à exportação da carne de vaca, nenhum dos partidos se considera responsável.
Há empresas públicas que passam para o domínio estrangeiro, ninguém é culpado das privatizações, nem de ter beneficiado Champalimaud...
PS e PSD prometem agora o que não fizeram e defendem agora o que ontem condenaram...
E depois dizem que os cidadãos se divorciam da vida política. (...)

Reflectir em conjunto

Este Encontro foi um encontro de trabalho, de preparação da Campanha Eleitoral para o Distrito de Setúbal, não foi um encontro de propaganda, com beija-mãos à mistura, nem uma etapa de uma qualquer volta política a Portugal em autocarro...
Neste Encontro procurámos colocar questões, reflectir em conjunto, ouvir sugestões, preparar medidas.
São conhecidos os elevados índices de desemprego na Península de Setúbal e que a limpeza dos ficheiros e cursos de formação profissional apenas mascaram uma grave situação. E são conhecidos os problemas de várias empresas, dos agricultores e dos pescadores que pescam nas águas de Marrocos.
A situação no Distrito é também consequência das opções de política nacional.
Uma política de concentração de riqueza.
O Governo limitou-se a gerir o que vinha do cavaquismo e, com o dinheiro da venda do riquíssimo património público e dos fundos comunitários, satisfez as suas clientelas e acabou algumas obras públicas de vulto, como é o caso da via férrea na Ponte 25 de Abril, uma melhoria nas acessibilidades, mas com preços de transporte e de parqueamento altamente penalizadores.
Procurando o poder absoluto, o Primeiro-Ministro diz por aí nuns cartazes que "Portugal está em boas mãos". Para os boys do PS, para os senhores do dinheiro e da banca certamente estará. Mas para os milhares de desempregados, reformados e jovens com um emprego mal pago e precário, aqui no Distrito, certamente que não está.
O Portugal que "está em boas mãos" é o país da União Europeia que tem o maior fosso entre os 20% mais ricos e os 20% mais pobres, isto é, o país que tem o maior índice de concentração de riqueza e tudo isto com um governo dito socialista.
É o país com maior percentagem de trabalho precário e é o país da União Europeia com o mais baixo salário mínimo e as mais baixas reformas.
O "País está em boas mãos", certamente para aqueles que só este ano vão beneficiar de 300 milhões de contos de benefícios fiscais.
Mas este é também o país onde se fala à boca cheia na lavagem de dinheiro, de casos escaldantes como os da JAE e da Universidade Moderna, em escândalos como a compra dos comboios pendulares, e onde ninguém é penalizado ou responsabilizado...
Ninguém paga o que se delapidou.
E tudo isto se verifica num país que está em boas mãos e que como também diz o Primeiro-Ministro "não é uma república das bananas"! O que faria se fosse!
É por isso que nos dirigimos à opinião pública e lhe dizemos: Não deixem que eles ponham as mãos em tudo!
Já basta de arrogância, mesmo que disfarçada, já basta de utilização do aparelho do Estado para as clientelas do Partido do Governo. (...)


Assegurar crescimento

Muitas questões, pistas, preocupações e propostas foram aqui colocadas e são de grande importância e riqueza para a elaboração do Programa do Distrito.
Pensar o Distrito hoje e no futuro próximo: quais os principais estrangulamentos? Como ultrapassá-los? Que caminhos seguir no país e no Distrito no quadro da União Europeia, da liberalização de capitais, das tendências da Organização Mundial do Comércio e de uma economia mundial cada vez mais "globalizada"?
Não há respostas simplistas, esquemáticas, mas é uma evidência como a experiência demonstra, que as respostas neoliberais ou de "terceira-via" social democrata não são resposta nenhuma, nem para o Distrito, nem para o país.
São a propaganda, com uma outra roupagem do "modelo" neoliberal com a conhecida polarização da riqueza, degradação social e em que a criminalidade assume proporções endémicas...
Portugal está confrontado com graves problemas que necessitam de ser equacionados e respondidos.
A primeira questão que se coloca é a do desenvolvimento tendo em conta o mercado único em que nos encontramos, os constrangimentos do "pacto de estabilidade" e da Organização Mundial do Comércio, a liberalização do movimento de capitais e a crescente dependência e subcontratação do aparelho produtivo nacional.
Ou colocando a questão de outra maneira.
Como assegurar um crescimento equilibrado e um desenvolvimento regional e nacional suficientemente forte e sustentado para que diminua a distância que nos separa da média europeia?
E para se atingir esse objectivo como assegurar que, empresas básicas e estratégicas fundamentais para o delineamento de uma estratégia de desenvolvimento nacional não venham a ser controladas por centros de decisão externos?
O caso Champalimaud veio pôr em evidência aquilo que sempre dissemos ou seja, que com o processo de "mão baixa" sobre as Empresas Públicas, mais tarde ou mais cedo estas corriam o perigo de ficarem nas mãos, ou de serem dominadas pelo estrangeiro.
E quanto ao crescimento há que colocar a questão: crescimento para quem? Para meia dúzia de famílias? Para o capital financeiro? (...)


«Avante!» Nº 1339 - 29.Julho.1999