Contra a política de direita


Lendo ou ouvindo os discursos eleitorais da maior parte dos líderes partidários, o cidadão desatento ou distraído será levado a concluir que, nesta campanha, estão em confronto várias políticas e múltiplos projectos. Na verdade e em rigor, estão em jogo apenas duas políticas: a política de direita, esta política velha que PS, PSD e PP – todos juntos ou mais ou menos aparentemente separados, nos governos ou na «oposição» - têm vindo a aplicar; e uma política de esquerda, uma política nova, alternativa à primeira e protagonizada pelo PCP e pelas restantes forças que integram a CDU.
O PS e o PSD, com mais ou menos PP, têm sido os grandes artífices de uma política exportada do modelo único da nova ordem que hoje domina o Mundo, marcadamente de classe, ao serviço dos interesses dos grandes grupos económicos e financeiros e, por isso, geradora de crescentes injustiças sociais e desigualdades. A «oposição» que, ora um ora outro, exibe quando, ora outro ora um, está no poder, não passa de um simulacro, da tentativa de vender a falsa ideia de que cada um defende uma política diferente e que esta alternância entre uma e outra política é expressão máxima da vida democrática.
A oposição de facto a essa política única, tem estado a cargo do PCP e dos seus aliados, em regime de exclusividade e através de uma luta persistente em todas as frentes. E se é verdade que essa luta não conseguiu ainda derrotar a política de direita, é justo sublinhar, igualmente, que sem essa luta as consequências dessa política seriam bem mais graves para a maioria dos portugueses.

PS/PSD: a política de direita os une, a ambição de ser governo e ter poder para a aplicar, os opõe. O PSD não é oposição à política do Governo do PS: Barroso contesta Guterres e não a política por este executada – da mesma forma que Guterres contestou Cavaco sem pôr minimamente em causa a essência da política praticada pelo PSD. Há quatro anos, Guterres convenceu importantes segmentos do eleitorado de que era portador de uma nova política e de uma nova prática de exercício de poder. Contudo, não foi necessário muito tempo para que qualquer cidadão atento se apercebesse que, quanto ao conteúdo, no essencial nada distinguia o Governo do PS dos governos do PSD e que, quanto à forma, as semelhanças eram bem maiores do que as diferenças.
A venda da imagem do PS como um partido de esquerda que, por razões conjunturais, pratica uma política de sentido oposto, constitui uma monumental mistificação. De facto, a política de direita praticada pelo Governo do PS não é um acaso: é um percurso. Um percurso que o PS quis e quer que seja este e não outro e cujas linhas essenciais estão de há muito definidas – e que eram tão visíveis no conteúdo da sua «oposição» aos governos do PSD como o são na prática concreta do actual executivo de Guterres. É para prosseguir e levar às últimas consequências esse percurso que o PS clama pela maioria absoluta e se prepara para accionar todos os mecanismos ao seu dispor para a obter.

Enfraquecer o PCP e a CDU constitui objectivo comum de todos os defensores da política de direita. Daí que impulsionar e estimular tudo o que, de alguma forma, possa contribuir para a perda de influência do PCP constitua seu objectivo prioritário. Pela simples razão de que isso significaria enfraquecer o único grande partido que se opõe, de facto, a essa política e ao seu passeio triunfal pelo País. Só a essa luz podem ser entendidas as simpatias prodigalizadas ao recém criado «Bloco de Esquerda» pela generalidade dos comentadores de serviço à defesa da política de direita praticada pelo PS – bem como o tempo e o espaço que a comunicação social dominante generosamente lhe concede. (um exemplo elucidativo: na Sexta feira, a «Antena Um» abriu o seu noticiário com uma longa reportagem dedicada à apresentação do cabeça de lista do BE no Porto, cujo teve o tempo que quis para «demonstrar», recorrendo ao método da fèzada, as possibilidades que tem de vir a ser eleito – para o que bastaria «tão somente» juntar aos 6 406 votos obtidos pelos três partidos em 1995 mais «apenas» 19 450 votos...).
Quem assim age sabe que o BE não retirará um único voto ao PS e sabe, igualmente, que este tripartido – que se apresenta como representante de uma esquerda «inovadora» ( que até agora nada de inovador apresentou) e «descansada» (talvez por andar há muito arredada de todas as lutas da Esquerda) - se movimenta tendo como objectivo acrescentar à soma dos votos dos três partidos que o compõem o maior número possível de votos da Esquerda, ou seja do eleitorado da CDU.

A política de direita será derrotada, mais tarde ou mais cedo, por efeito de uma persistente, intensa e forte pressão social e de massas, complementada por uma perda de expressão eleitoral do PS em favor do PCP – único partido que, objectivamente, se posiciona e age contra essa política. A alternativa passa por um reforço significativo da influência social, eleitoral e política do PCP. Dir-se-á que tal perspectiva não está no horizonte imediato. O povo o dirá: no dia 10 de Outubro, com o voto; nos tempos que se lhe seguirem, com a luta social. E di-lo-á tanto mais claramente quanto mais o acto eleitoral constituir um processo de verdade, de efectiva prestação de contas, de rigorosa avaliação do conteúdo da actividade e dos objectivos de cada partido concorrente. É por isso, precisamente, que aos partidos da política de direita não interessa uma campanha esclarecedora, de debate aberto dos verdadeiros problemas, de clarificação do que nestas eleições está de facto em jogo.

De qualquer forma, o reforço do grupo parlamentar comunista, tenha ele a expressão que tiver, será sempre o reforço da luta contra a política de direita. A legislatura que agora finda deixou claro o papel dos deputados comunistas, a superior qualidade e quantidade do seu trabalho em comparação com os deputados de todos os outros partidos. Por um conjunto de razões – nomeadamente porque pertencem a um partido que possui um profundo conhecimento da realidade nacional e tem com o povo português um compromisso de futuro de que jamais se desligará; pelas suas capacidades próprias e porque assumem na sua postura de todos os dias uma clara opção de classe que os situa sempre ao lado dos trabalhadores e do povo – os deputados comunistas intervieram decisivamente em tudo o que de positivo foi decidido na Assembleia da República e ergueram a sua voz e o seu voto contra tudo o que de negativo ali foi aprovado.
Transmitir esta verdade ao maior número possível de portugueses será o melhor caminho, nas circunstâncias actuais, para que no dia 10 de Outubro a CDU obtenha um resultado que dê mais força às necessárias lutas do futuro.


«Avante!» Nº 1341 - 12.Agosto.1999