Venezuela
Revolução
pacífica
Com 120 dos 131 lugares da Assembleia Constituinte, o Pólo Patriótico de Hugo Chávez não pára de apresentar medidas. O objectivo é, nas palavras do presidente, um Estado «mais de justiça que de direito». «Estamos contra o dogma de mercado, que pretende ser Deus. Estamos contra a mão peluda do mercado, que levou à existência de selvagens no mundo», sublinha Chávez.
«O que está a
ocorrer é uma revolução e será em vão que tentarão
impedi-la. A Venezuela está a renascer das cinzas e ninguém
pode detê-la. Faz tempo que está a chover povo na Venezuela, e
pobre daquele que não ouve o povo que chove, que troveja, que
relampeja!», exclamou o presidente venezuelano Hugo Chávez,
perante a Assembleia Constituinte, na semana passada.
A reforma do Estado prossegue a toda a velocidade. O Pólo
Patriótico, com 120 dos 131 lugares da Assembleia Constituinte,
não deixa de apresentar novas propostas.
O projecto de Chávez para a nova Constituição inclui medidas
como a anulação dos tratados, pactos ou concessões que possam
lesionar ou diminuir a soberania e a integridade territorial do
país, bem como a proibição de latifúndios e a organização
de um sistema de planificação económica que integre o Estado e
representantes da sociedade.
A ser aprovada, a Constituição passa a reconhecer o direito do
povo à desobediência civil «com o objectivo de restabelecer a
ordem constitucional democrática». O mandato presidencial passa
de cinco para seis anos e introduz-se a reeleição imediata,
actualmente proibida.
Pretende-se um Estado intermédio entre o mercado e o Estado,
entre o público e o privado, entre o nacional e o internacional,
que recusa o dogmatismo e que deve fortalecer a autonomia da
Venezuela.
«Estamos contra o dogma de mercado, que pretende ser Deus.
Estamos contra a mão peluda do mercado, que levou à existência
de selvagens no mundo», declarou Chávez. «Não aceitaremos
ingerências de poderes políticos ou económicos estrangeiros.
Sou livre para decidir os meus próprios modelos», acrescentou.
O presidente propõe ainda «romper com o modelo clássico
liberal dos três poderes», acrescentando-lhe o poder eleitoral
e o poder moral. Este último seria composto pelo Ministério
Público, pelo Tribunal de Contas e pelo «defensor do povo».
Emergência nacional
Hugo Chávez pediu
à Assembleia Constituinte para declarar uma «emergência
nacional» e colocou o seu lugar à disposição dos deputados.
«Se consideram que a minha presença como chefe de Estado
perturba os soberanos trabalhos da Assembleia, façam comigo o
que quiserem», afirmou.
«Se fosse membro da Assembleia, votaria a favor da declaração
de uma emergência executiva, legislativa e judicial, quer dizer,
de uma emergência integral para assumir a tarefa da
reconstrução da República em emergência», salientou Chávez.
A reconstrução pretendida passa pela implementação de um
Estado «mais de justiça que de direito». Nesse sentido, será
fundado o «Banco do Povo», que começará a funcionar nas
próximas semanas com recursos do Estado que «não estão a ser
bem empregues». O seu objectivo principal será a concessão de
créditos às pequenas e médias empresas. «Há que ajudar os
venezuelanos que querem trabalhar, esses venezuelanos que têm o
recurso humano mas a quem falta o capital económico», sublinhou
o presidente.
Outra medida consiste numa alta comissão de justiça que
decidirá os assuntos mais urgentes da administração judicial e
destituirá os juizes considerados corruptos.
Na quinta-feira, a Confederação de Trabalhadores da Venezuela
(CTV), que junta cerca de 3 mil sindicatos, foi assaltada por
populares. A CTV, um pilar do regime dos últimos 40 anos, é
acusada de corrupção e de dissipar a riqueza nacional, à
semelhança de outras instituições. Os manifestantes exigiram a
demissão do presidente da confederação, Federico Ramírez, que
recusou a exigência e anunciou mudanças na organização.
Entretanto, os grandes empresários e homens de negócios
venezuelanos mostram-se cada vez mais receosos. O índice da
Bolsa de Caracas já desceu 7,7 por cento. O presidente da
confederação que agrega os industriais, Juan Calvo, alertou que
«enquanto não se aclarem as regras do jogo haverá incertezas.
O investimento, tanto nacional como estrangeiro, esperará por
que a Constituição se defina».