«Campanha
pela negativa,
em português "vale tudo"»
A «destruição de pessoas e de vidas familiares» é a mais grave expressão que pode assumir uma «campanha pela negativa, em inglês "negative campaign"». Isto se traduzi bem a essência da magistral «lição familiar, em italiano "lezione famigliare"», proferida pelo engenheiro Guterres na Torre de Belém. E, já agora, confesso que estremeci quando a sibilina lição me entrou em casa, servida a frio e em directo. É que a oração de Guterres trouxe-me à memória não apenas a célebre trilogia de Coppola mas também, sei lá porquê (as associações de ideias são tão imperscrutáveis como os desígnios do Senhor), as impressionantes «histórias cristãs» contadas por Malaparte no «Kapput». E receei o pior. Mas, felizmente, esclarecidas as coisas especialmente desde que o «tranquilizante Eduardo Prado Coelho, em português "soporífero da esquerda"», pôs as mãos e as barbas no lume pelo engenheiro estou em crer que a «campanha negativa em português "tout court"», se resumirá a uma multidão de mentiras, manipulações, abusos de poder, enfim insignificâncias que não tingirão de sangue humano as boas mãos de ninguém e apenas permitirão ao partido do Governo arrebanhar mais e mais votos.
Ora, como se sabe, tais golpaças não são,
já, passíveis de condenação, antes constituem parte
integrante da modelar democracia em que vivemos. Por exemplo: o
MAI Jorge Coelho dizia há dias ao «JN» que «o PS é o
primeiro partido em Portugal que aplicou o projecto lei (das
cotas) que a oposição chumbou». Coelho sabe que está a mentir
mas, no ponto em que as coisas estão, trata-se de uma mentira...
positiva, criticável, apenas, pelo mau português utilizado.
Ainda em «campanha negativa em português "tout
court"», o MAI dispara a dada altura: «O PS é o único
partido em que o secretário geral apenas escolhe 30% dos lugares
elegíveis»: nos outros partidos, prossegue mentindo, «o
secretário geral escolhe os candidatos todos». É óbvio que
Coelho se refere aos partidos, PS incluído, que funcionam na
base de um asfixiante centralismo antidemocrático e onde, pelos
vistos, o poder pessoal dos chefes se situa entre os 30 e os 100%
- mas sabe que no PCP, onde o colectivo (isto é, a democracia)
é quem mais ordena, o secretário geral não dispõe, nem quer
dispor, de tais prerrogativas. E sabe também que o poder
absoluto nos partidos é mais do que meio caminho andado para
igual prática nos governos.
Quanto à «utilização do aparelho de
Estado para a campanha eleitoral», o MAI diz que não, que se
trata de uma «operação dos partidos da oposição» que têm
tendência para acharem que o governo deve paralisar a sua
acção uns tempos antes das eleições». «Só que o país não
pode ficar parado», pelo que, informa Coelho, os candidatos do
PS, enquanto candidatos apenas, farão campanha eleitoral e
enquanto membros do Governo assegurarão que «o país não fique
parado». A distinção entre as duas modalidades estará patente
no facto de não haver «deslocações de helicópteros e outras
viaturas do Estado para membros do Governo participarem em
comícios». Assim sendo, pagas pelo Estado verificar-se-ão,
apenas e só, as acções não eleitorais, como sejam
inaugurações, promessas de inaugurações, publicações e
campanhas milionárias, etc, etc.
Coelho e colegas irão «a todos os sítios» para onde os
convidarem: enquanto candidatos, em viatura própria; enquanto
governantes, em viatura do Estado. E há-de ter sido desta
misturada entre candidatos e governantes que nasceu a modalidade
da «campanha pela negativa em português "vale
tudo"». Menos tirar olhos, óbviamente.