Mesmo em vésperas de eleições
Governo continua do lado dos patrões


A Inspecção do Trabalho recebe ordens para só intervir nas empresas com conhecimento prévio das administrações, João Cravinho passeia-se com o mais mal-amado dos armadores, enquanto situações de injustiça e problemas graves dos trabalhadores arrastam-se e agravam-se.

A Inspecção Geral do Trabalho tem tido comportamentos recentes de «total colagem e submissão às entidades patronais», e esta atitude deve-se a uma recomendação do Governo para que nenhuma inspecção seja feita sem prévio conhecimento da entidade patronal – denunciou na semana passada a União dos Sindicatos de Braga.
No comunicado da USB/CGTP-IN eram citados os exemplos da TV Cabo Douro e de três empresas do Complexo Grundig/Blaupunkt (FEHST Componentes, Bracomp e MKR) onde os pedidos de intervenção da União e do STIEN deram origem, passados quinze dias, a telefonemas da IGT para as administrações, para marcar o dia e a hora da visita às empresas. Concretizada a visita, os inspectores entregaram aos administradores cópias dos ofícios sindicais e deram por concluída a inspecção.
O outro caso citado pela USB é particularmente chocante: numa empresa têxtil, uma trabalhadora foi obrigada a sentar-se numa cadeira, virada para a parede; «a violação foi participada à IGT, esta andou sete dias à procura do administrador que, ao sétimo dia, marcou a audiência e, obviamente, nesse dia e hora a entidade patronal pôs a trabalhadora na máquina» - conta a União, comentando que «o tão falado e apregoado diálogo é só para um dos lados, o dos patrões».
O Sindicato dos Trabalhadores da Pesca do Norte, por seu turno, manifestou-se espantado por João Cravinho, ministro e candidato do PS em Aveiro, se fazer acompanhar, na sua comitiva de campanha, por Silva Vieira, «armador que possui maior número de barcos com "bandeira de conveniência", onde as relações de trabalho são mais precárias, totalmente fora da alçada do direito internacional». Entretanto, Cravinho ainda não respondeu aos seis desafios colocados pelo sindicato aos candidatos a deputados. «A resposta a esses desafios não é fácil, pois, ao fazê-lo, os candidatos têm que definir de que lado estão, se da parte dos trabalhadores, a parte mais fraca, se do lado dos armadores», admite o sindicato, adiantando que apenas a CDU respondeu.
Com salários em atraso e os cerca de 400 postos de trabalho ameaçados, os trabalhadores da Norporte Confecções decidiram deslocar-se ontem de Alhos Vedros até ao Ministério da Economia. «Há cerca de 4 meses que se arrastam negociações entre a empresa e outros parceiros, nomeadamente com o Governo, mas as soluções tardam e não são as que mais se adequam aos interesses e direitos dos trabalhadores, uma vez que estão previstos cerca de 200 despedimentos» - explica o Sindicato dos Têxteis, Lanifícios e Vestuário do Sul.
Também ontem, voltaram a manifestar-se em Lisboa, frente ao Ministério da Defesa, activistas sindicais do STEFFAs, reclamando do Governo «uma postura de diálogo» para a resolução «dos muitos problemas que afectam os trabalhadores civis das Forças Armadas». O mesmo sindicato informou que os representantes dos trabalhadores do Arsenal do Alfeite vão manifestar-se hoje à tarde na Praça do Comércio, junto ao Ministério das Finanças. Ao secretário de Estado do Orçamento vai ser feita a entrega simbólica de uma caneta, para que aquele decida finalmente assinar o despacho que revaloriza as carreiras profissionais do pessoal civil.
Os supermercados Nutripol, que faliram há mais de 15 anos, ainda não pagaram os salários em atraso e, apesar de haver dinheiro suficiente (proveniente de venda de património) à ordem do tribunal, não está garantido que os trabalhadores venham a receber qualquer verba, denunciou o CESP, que promoveu no sábado uma reunião com ex-funcionários daquela cadeia. Em Junho, e depois de vários recursos apresentados pelo sindicato, o tribunal decidiu atribuir ao Estado, enquanto primeiro credor, os cerca de 95 mil contos apurados. Agora, o sindicato reclama do Governo uma decisão política, que coloque os trabalhadores à frente na lista de credores, tal como as leis em vigor já permitem.
Em Coimbra, os trabalhadores da Mondorel, desfilaram sexta-feira até ao Governo Civil, onde mais uma vez reclamaram apoio do Estado à viabilização da empresa. O desfile foi decidido no final de um plenário nas instalações da têxtil, na margem esquerda do Mondego. A preocupação aumentou entre os trabalhadores, depois de, no dia 30 de Setembro, um credor minoritário ter formalizado um pedido de falência. Quando regressaram de férias, no dia 13, os trabalhadores encontraram a fábrica parada, mas, desde então, têm comparecido todos os dias nos postos de trabalho.
Seis meses após terem pedido intervenção política para acelerar o processo de falência, os trabalhadores da Fábrica de Loiças de Sacavém acusam a Caixa Geral de Depósitos de boicotar o recebimento de parte da dívida. Querendo assumir-se também como credor privilegiado, o banco público impede que os trabalhadores sejam os primeiros a receber. O problema foi exposto em Março ao PR, primeiro-ministro e ministro da Justiça, reclamando a sua intervenção política. A fábrica fechou em 1989 e foi declarada falida em 1994, deixando mais de 600 trabalhadores no desemprego e com salários em atraso.


«Avante!» Nº 1349 - 7.Outubro.1999