Alemanha
Nobel da literatura
para Günter Grass


«No papel somos uma democracia parlamentar, mas quem manda é o capital, é o dinheiro». As palavras são de Günter Grass, o escritor alemão que desde a sua primeira candidatura teve de esperar mais de vinte anos pelo Nobel da literatura que acaba de lhe ser atribuído pela Academia Sueca.

Grass, que abandonou a social-democracia quando o SPD e a democracia-cristã, sob pressão dos neonazis, praticamente aboliram da Constituição da República Federal o direito de asilo político, é hoje um dos intelectuais alemães mais odiados pelo capitalismo e pela máquina oficial encarregada de promover a propaganda cultural do sistema. O seu romance «Ein weites Feld» (Um vasto campo), publicado em 1995 e que contém uma crítica implacável ao processo da chamada «unificação alemã», originou a mais agressiva polémica político-literária da história da Alemanha Federal. A denúncia da inconstitucionalidade do processo de anexação da ex-RDA e do seu carácter neocolonial, na medida em que «noventa por cento da Alemanha do Leste está hoje nas mãos da Alemanha Ocidental e dos seus bancos», transformaram Günter Grass num inimigo a abater pelo governo de Helmut Kohl.
O desapontamento de Grass pela submissão da social-democracia e do "socialismo" de direita está bem expresso na constatação de que «a sociedade nunca possuiu tanta informação sobre os problemas e as suas causas como hoje, mas não acontece nada».
Günter Grass não é o único ex-social-democrata desiludido que abandonou o SPD. Durante a guerra da NATO contra a Jugoslávia, numerosos membros de longa data daquele partido viraram as costas à social-democracia. Na quarta-feira da semana passada foi a vez do deputado social-democrata Uwe Hiksch se juntar ao grupo parlamentar do PSD no Bundestag. Na declaração feita em Berlim, Hiksch salienta que a social-democracia «não é o partido da justiça social» nem dos mais explorados, e que uma carta enviada por cerca de setenta deputados a Schröder não obteve qualquer resposta. Entretanto, o chanceler teve tempo para enviar os seus votos de sucesso à chamada «terceira via», no momento em que Blair continua a pregar o dogma de que «a luta de classes acabou» e prossegue a política de privatizações dos «Tories», e em que na Áustria a extrema-direita avança assustadoramente sobre os escombros deixados pela política direitista da social-democracia.


«Avante!» Nº 1349 - 7.Outubro.1999