Chile
Grã-Bretanha
decide extradição de Pinochet
O Tribunal Penal de Bow Street decidiu, na sexta-feira, extraditar o antigo ditador chileno Augusto Pinochet para a Espanha, onde é acusado de 34 casos de tortura e um de conspiração, praticados durante os últimos 14 meses de exercício da Junta Militar. Cabe agora ao ministro do Interior britânico, Jack Straw, dar «luz verde» definitivamente à extradição.
O processo a correr
contra Pinochet refere-se apenas ao período período final da
Junta Militar chilena e não aos 17 anos da ditadura, porque a
Grã-Bretanha apenas adoptou a Convenção Internacional contra a
Tortura em Dezembro de 1988, pelo que os crimes cometidos até
essa data não são tidos em consideração.
O juiz responsável pela sentença referiu-se no entanto aos
casos registados de 1198 pessoas desaparecidas durante a
ditadura, abrindo a porta ao julgamento de Pinochet também por
situações anteriores a 1988. «Se os desaparecimentos chegam a
ser tortura, se o efeito sobre as famílias dos desaparecidos
pode chegar a ser tortura mental, e se isto foi ou não o
propósito do regime do senador Pinochet é, do meu ponto de
vista, um assunto para o tribunal que o irá julgar», afirmou
Ronald Bartle.
Conhecido pelo seu carácter muito conservador e por ser membro
de um clube cuja vice-presidência está entregue a Margaret
Thatcher (amiga íntima de Pinochet e sua defensora), Bartle
quase pediu desculpa pela sentença. Antes de anunciar a decisão
final, várias vezes referiu que procedia conforme a
legislação, como se lembrasse que nada poderia fazer para
salvar Pinochet. «Sinto necessidade de sublinhar que a minha
decisão neste caso baseia-se na lei e só na lei. Se o meu
entendimento da lei está errado, um tribunal superior o
corrigirá.»
A decisão de extraditar Pinochet foi saudada com explosões de
alegria por milhares de chilenos que sofreram a repressão do
ditador e por familiares e amigos da vítimas que continuam a
exigir que seja feita justiça.
A saúde do general
Pinochet, num texto
lido pelo seu advogado após a divulgação da sentença,
continua entretanto a afirmar-se inocente e a rejeitar a
legalidade do processo. «Como ex-presidente do Chile e senador
declaro que não sou culpado dos delitos de que sou acusado. A
Espanha não produziu nem um só elemento de prova que mostre que
sou culpado. E não apenas isso. Creio que a Espanha não
procedeu a uma adequada investigação sobre estes delitos, e a
Espanha nem sequer tem jurisdição sobre estes delitos.»
O antigo ditador vai mais longe: «A Espanha actua em violação
da soberania do Chile. Os acontecimentos do Chile nada têm a ver
com a Espanha. Está claro desde há muito tempo que a minha
extradição é motivada politicamente e tem razões
políticas.»
Pinochet apresentou-se ao longo do processo como um inofensivo
senador, um homem de idade com amigos influentes, que apenas
pretende algum descanso. Agora insiste nessa imagem.
A defesa e as autoridades do Chile pedem a repatriação por
«razões humanitárias» e apelam à justiça referindo-se à
saúde de Pinochet, argumento tantas vezes ignorado e brutalmente
espezinhado pelo «pobre senhor» que até sexta-feira aguardava
a sentença comodamente instalado numa mansão de luxo no
Sudoeste de Londres.
Os advogados do Pinochet anunciaram imediatamente que vão
recorrer da decisão, a última hipótese que têm antes da
extradição para Espanha se concretizar. A falta de saúde do
senador - o argumento apresentado pela defesa para o
repatriamento para o Chile -, caso seja aceite como razão
válida pelo ministro do Interior, vai ser confirmada por
médicos do Ministério ou da Scotland Yard.
«Vamos continuar a usar todos os caminhos, políticos, judiciais
e de saúde. É conveniente que o senador Pinochet regresse ao
Chile e que aqui enfrente os processos que pesam contra si na
justiça», afirmou o presidente do Chile, Eduardo Frei.
Outros reagiram de forma mais violenta. O exército manifestou
«tristeza» e considerou que a decisão britânica é uma
«clara manobra de vingança política internacional». O
sobrinho do ex-ditador, Gonzalo Towsend Pinochet, foi mais longe.
«Não nos vamos esquecer disto. Que nem lhes ocorra, a esses
espanhóis, visitar amanhã o Chile, porque a sua estadia não
lhes seria grata. Estamos a anotar num caderno todas as pessoas
que contribuíram para este acto de vingança.»