A morte de Luís Sá
«Guardaremos sempre do Luís
a memória e o exemplo»
Raramente uma má notícia corre tão célere. Pouco tempo depois de os camaradas mais próximos de Luís Sá o encontrarem sem vida no seu gabinete de trabalho na sede central do Partido, no final da tarde de sexta-feira, logo, por todo o País, a consternação atingia muitos camaradas e amigos. As reuniões das organizações do PCP foram interrompidas, desmarcaram-se outras muitas e, nessa mesma noite, uma multidão reunia-se às portas da capela de S. Vicente de Fora, em Lisboa, a prestar uma última homenagem a Luís Sá e os pêsames à família.
Durante toda a noite, milhares de homens, mulheres e jovens desfilaram, em manifestação de pesar. Cá fora muitos aguardaram longo tempo a sua vez de entrar na capela onde, por desejo da família, não foi possível tirar fotografias. Ainda por desejo da família, o funeral realizar-se-ia no cemitério de S. Paio Dantas, Esposende, para onde partiu na manhã seguinte.
Ainda durante a noite, para além de camaradas, onde se notava a presença de muitos dirigentes do Partido, de deputados, de eleitos da CDU, de responsáveis regionais e concelhios, de jovens da JCP, de numerosos militantes vindos de todo o País, registava-se a presença de dirigentes de outros partidos, de delegações de Os Verdes e da Intervenção Democrática. O Presidente da Assembleia da República, Almeida Santos, membros do Governo, membros do PS, do PSD, do PP e do BE também se deslocaram a S. Vicente de Fora.
Na manhã de sábado muita gente continuou a afluir à capela, contando-se a presença de numerosas personalidades, com destaque para o Presidente da República, Jorge Sampaio. Entre os dirigentes do PCP que ali se deslocaram, encontrava-se o camarada Álvaro Cunhal.
O funeral, marcado para as 16 horas de sábado, tinha a esperá-lo uma multidão compacta que se foi reunindo no largo que separa, em S. Paio Dantas, o cemitério da igreja. Vindo de Lisboa, o féretro, que fora acompanhado de numerosos camaradas e amigos, foi transportado em primeiro lugar à casa familiar, onde dirigentes do Partido e muitas outras personalidades se deslocaram. A pé, o cortejo fúnebre subiu para a igreja, coberto o caixão com a bandeira do PCP, que foi retirada antes da entrada no templo onde foi celebrada uma cerimónia católica que seria depois concluída no cemitério. De novo com a bandeira do Partido e antes de baixar à terra, a multidão não coube no cemitério, a prestar uma última homenagem, acompanhando as palavras comovidas do secretário geral do PCP. Carlos Carvalhas, rodeado de membros dos organismos executivos do Comité Central, fez uma breve alocução que publicamos na íntegra.
Luís Manuel da Silva Viana de Sá, 47 anos,
licenciado em direito. Mestre em Ciência Política e doutorado em
Ciências Sociais. Foi monitor na Faculdade de Direito de Lisboa em
1974/75 e docente em diversas universidades desde 1994. |
Homenagem e despedida
À homenagem de despedida a Luís Sá, associaram-se milhares de pessoas que, independentemente das suas convicções políticas ou religiosas, quiseram com a sua presença manifestar a amizade, o respeito e apreço que lhes merecia a figura deste destacado dirigente do PCP. Dentre elas, destacamos a presença de algumas conhecidas personalidades:
Jorge Sampaio, Presidente da República
Almeida Santos, Presidente da Assembleia da República
Luís Patrão, Chefe do Gabinete do Primeiro Ministro
Alberto Martins, António Costa, António José Seguro, Ferro Rodrigues,
Guilherme de Oliveira Martins, Joaquim Pina Moura, Jorge Coelho, Vítor Neto e
Vítor Ramalho, membros do Governo
Manuel Carvalho da Silva, Coordenador da CGTP
António Gonçalves, Blasco Hugo Fernandes e Herberto Goulart, da ID
Isabel Castro, Heloísa Apolónia e Fernando Pézinho do Partido Ecologista «Os
Verdes»
Acácio Barreiros e Joel Hasse Ferreira, do Partido Socialista
Lemos Damião, Manuela Ferreira Leite, Marques Mendes, Miguel Macedo e Torres
Pereira, do PSD
Narana Coissoró, Ribeiro e Castro e Sílvio Cervan, do PP
Miguel Portas, Francisco Louçã, Carlos Marques e Major Tomé, do Bloco de
Esquerda.
Outras personalidades:
Adriano Moreira; Manuel Villaverde Cabral; Mário Ruivo; Vasco Lourenço;
Fátima Abrantes Mendes e João Azevedo, da CNE; Sérgio Abrantes Mendes, Juiz
Desembargador do Tribunal da Relação de Évora; Mário Almeida, Presidente da
Associação Nacional de Municípios; Joaquim Raposo, Presidente da Câmara
Municipal da Amadora; Edite Estrela, Presidente da Câmara Municipal de Sintra;
Narciso Miranda, Presidente da Câmara Municipal de Matosinhos; Oliveira e
Silva, Governador Civil de Viana do Castelo; Fernando Fragoso Marques,
Presidente do Conselho Distrital de Lisboa da Ordem dos Advogados; Antonino
Solmer, Sub-Director do Teatro Nacional D. Maria II; António Pires de Lima,
Bastonário da Ordem dos Advogados; Maria José Ferro Tavares, Reitora da
Universidade Aberta; Guilherme Frederico Dias Pereira da Fonseca, Juiz
Conselheiro do Tribunal Constitucional.
Expressões de pesar
Assim que foi conhecido o falecimento de Luís Sá,
começaram a chegar ao PCP numerosas mensagens de condolências, provenientes de
diversas entidades, militantes e conhecidas personalidades da vida política e
cultural portuguesa, enquanto algumas autarquias e sindicatos suspenderam, como
forma de luto, todas as suas actividades e muitos órgãos do poder local
aprovaram votos de pesar.
Organizações do Partido - Direcção da Organização Regional de Coimbra;
Direcção da Organização Regional dos Açores; Secretariado da Organização
Regional de Tomar; Comissão Concelhia da Lousã; Comissão Concelhia de Avis;
Comissão Concelhia de Chaves; Organização Concelhia de Condeixa; Comissão
Concelhia de Ilhavo; Organização Concelhia de Setúbal; Comissão Concelhia de
Soure; Comissão Concelhia de Valpaços; Comissão Coordenadora de Alpiarça;
Comissão de Freguesia de Canidelo; Comissão de Freguesia de S. Martinho do
Bispo; Organização do PCP – Suíça; O Secretariado Nacional da Juventude
Comunista Portuguesa; Grupo Confederal da Esquerda Unitária Europeia/Esquerda
Verde Nórdica (PE).
Órgãos de soberania - Vice-Presidente da Assembleia da República , Manuel
Alegre; Ministra da Saúde, Maria de Belém Roseira; Ministra do Ambiente, Elisa
Ferreira; Ministro da Educação, Eduardo Marçal Grilo; Ministro dos Negócios
Estrangeiros e Ministro da Defesa Nacional, Jaime Gama; Secretário de Estado do
Comércio, Osvaldo Castro.
Autarquias - ANAFRE, Secretário Geral, Higino Santos; Assembleia de
Freguesia de Boidobra, Presidente, José Fernandes dos Santos; Assembleia de
Freguesia de Monte Abraão; Assembleia Municipal de Benavente, Presidente, Luís
António Oliveira Martins; Associação dos Municípios do Distrito de Évora,
Presidente, Eng. Alfredo
MensagemO Secretariado do Comité Central do PCP enviou à família do dirigente comunista a seguinte mensagem:
«À Ana, filhos e restante família de Luís Sá, nesta hora de dor pela perda do vosso ente querido, destacado dirigente do nosso Partido a quem a causa dos trabalhadores, da dignidade humana, da liberdade e da democracia tanto devem, enviamo-vos os nossos sentidos pêsames.»
Carlos Carvalhas no funeral
«Guardaremos sempre
do Luís a memória e o exemplo»
Pouco antes de o caixão baixar à terra, Carlos Carvalhas, secretário-geral do PCP, fez uma comovida intervenção de despedida a Luís Sá, lembrando a sua contribuição «enquanto comunista e destacado dirigente do Partido» e «enquanto cidadão empenhado, enquanto intelectual prestigiado e respeitado» mas também como «ser humano sensível, inteligente, fraterno e solidário» que marcava com «uma profunda e generosa afectividade as suas relações de amizade, de trabalho e de convívio».
A despedida que aqui estamos a fazer do nosso camarada e do
nosso amigo Luís Sá é marcada pelo choque profundo do seu súbito e
inesperado desaparecimento do nosso convívio, que acentua terrivelmente o
sentimento de perda que a todos nos atinge e que desde as primeiras horas se
traduziu numa comovente e enorme corrente de testemunhos de pesar e de
solidariedade.
O Luís deixa-nos na força da vida, na plena maturidade das suas capacidades,
saberes e experiências, quando connosco acabava de, empenhada e
entusiasticamente, participar numa importante batalha cívica e política – as
eleições – para cujo positivo resultado muito contribuiu. E quando, para
enfrentar as tarefas e desafios do nosso país e do nosso tempo, muito havia a
esperar da sua contribuição enquanto comunista e destacado dirigente do
Partido, enquanto cidadão empenhado, enquanto intelectual prestigiado e
respeitado.
Guardaremos sempre do Luís a memória e o exemplo de 25 anos de intensa,
abnegada e dedicada militância comunista, sustentada numa grande exigência
ética, na seriedade e rigor intelectuais, numa permanente abertura aos
questionamentos da nossa época, numa sólida vinculação às grandes causas da
dignidade humana, do progresso e transformação sociais, da democracia e do
socialismo.
Guardaremos do Luís o património da sua inestimável contribuição de muitos
anos de empenhado combate pela edificação do poder local democrático como
componente indispensável da democracia avançada pela qual lutou e a que
dedicou muito da sua vida e do melhor das suas capacidades.
Guardaremos do Luís a imagem de um destacado e exemplar representante eleito do
povo que, no Parlamento Europeu como na Assembleia da República, soube dar
testemunho de que a política pode ser uma das mais elevadas e nobres
expressões da actividade humana, que pode ser exercida com convicções, com
respeito pela pluralidade e diversidade de opiniões, com exemplar sentido de
serviço público. e com um permanente enraizamento nas aspirações e
interesses populares.
E, de forma especial, guardarei do Luís - tantos anos partilhámos no mesmo
gabinete alegrias, tristezas, problemas da vida -, guardarei, guardaremos a
memória comovida de um ser humano sensível, inteligente, fraterno e
solidário, marcando com uma profunda e generosa afectividade as suas relações
de amizade, de trabalho e de convívio.
Não pretendemos comparar a nossa dor com a dor profunda – que não pode ser
descrita por nenhumas palavras – da Ana Teresa, dos seus filhos, do seu pai,
dos seus irmãos, dos seus familiares mais próximos, a quem endereçamos um
sentido abraço de pesar e de solidariedade, seguramente em nome de todos os
camaradas e amigos do Luís, de todos quantos puderam beneficiar do seu
convívio.
Com a morte prematura de Luís Sá, o PCP perde um dos seus mais qualificados,
promissores e destacados militantes e a democracia portuguesa perde um dos seus
empenhados construtores.
Mas não é um lugar comum, nesta despedida física, afirmarmos que o Luís vai
permanecer connosco, por via do seu testemunho, da sua obra e do seu exemplo,
neste caminho áspero mas esperançoso que vamos continuar a percorrer, neste
grande desafio colectivo de transformar a vida e o mundo e de construir um
futuro melhor para o povo português e para a humanidade que ele muito amou.
___________________
E, de súbito, o silêncio a tocar o infinito. O nevoeiro, a lágrima,
a vertigem. Um coração ferido pela imperfeição da noite e a luz
intensíssima da memória. José Manuel Mendes |
Chove, nesta tarde em que regressaste à terra dos homens, de onde
vieste. E a água estala no chão, bate nos olhos e nos ouvidos, para que
não esqueçamos que partiste, que a tua ausência dói e pesa. Como a
água. João Pedro Mésseder |